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quinta-feira, 27 de fevereiro de 2014

Ponderações anti-coxinhas

 23/02/2014 - Miguel do Rosário - Tijolaço

Algumas palavras sobre a manifestação ocorrida ontem [22 fev] em São Paulo e suas consequências.

Antes, uma observação importante. Defendo manifestações democráticas. Não venham me chantagear com esse papo de “criminalizar” movimentos sociais.

Mas já aprendi uma coisa, de uns tempos para cá.

Manifestações com presença de mascarados não são democráticas. Mascarados mancham indelevelmente qualquer manifestação, porque a gente sabe, antecipadamente, que apelarão para violências, e podem conter infiltrados cujo objetivo é justamente destruir ou desqualificar a manifestação.

Grandes armadilhas contra a nossa democracia estão sendo armadas. O movimento #naovaitercopa reúne inúmeros grupelhos de extrema-esquerda, mas conta com o apoio esquizofrênico de todos os grupos de extrema-direita, também interessados no caos e na derrubada do regime.

Esses grupos financiam páginas na internet, memes e textos. Não, não é mais paranóia. Proliferam nas redes sociais um número alarmante de grupos e indivíduos que defendem um golpe de Estado, inclusive militar. Setores da direita, desesperados com a distância do poder, e farejando nova derrota este ano, perderam os escrúpulos democráticos que fingiam ter e estão demonstrando um perigoso descontrole emocional.

Falei em armadilhas porque é disso que se trata. Fazer a população se lançar voluntariamente no abismo, achando que está participando de uma revolução.
A maioria dos intelectuais brasileiros de esquerda pode ser facilmente manipulada por estratégias simples.

Bota-se um punhado de jovens na rua pregando revolução, pedindo mais gastos em educação, reclamando da Globo, coisas simples e boas. Mas aí se acrescenta um elemento explosivo: algumas dezenas, ou centenas, de mascarados para assustar a polícia, quebrar bancos e incitar repressão.

Pronto. Temos o cenário perfeito. Alguns líderes de movimentos sociais, cansados de apanhar da polícia, rapidamente aderem aos protestos. Como ser contra?

Em pouco tempo, contudo, ninguém mais sabe porque está na rua, nem manifestantes nem policiais, repetindo-se a lógica irracional de uma guerra civil.

Sei que é difícil acreditar na imprensa hoje, mas todos os sites que eu li falavam de 2 manifestantes e cinco PMs feridos.

Isso é perigoso. As polícias militares têm imensas deficiências. Mas o culpado não é o policial, um trabalhador que ganha pouco e se arrisca muito. A partir do momento em que os manifestantes começarem a descontar sua testosterona em cima desses PMs, correremos enorme risco. O culpado pela violência policial é o sistema.

Nosso judiciário também tem culpa, por ser truculento e reacionário, evitando penas alternativas e prisão domiciliar inclusive para presidiários doentes que não oferecem nenhum perigo à sociedade.

Por que a imprensa não fez violentos protestos quando descobriu que o Judiciário negava prisão domiciliar a um tetraplégico preso na Papuda por fumar maconha? Não protestou porque isso poderia beneficiar José Genoíno?

Por que os manifestantes só hostilizam as instituições democráticas e deixam o Judiciário e o Ministério Público em paz?

Entretanto, o mais surreal é que o movimento #naovaitercopa pede mais gastos em educação e saúde, mas o cancelamento da Copa provocaria um prejuízo enorme ao Estado, e portanto, forçaria cortes em educação e saúde.

Essa é a grande esquizofrenia coxinha, que se mistura ao marxismo enfumaçado de jovens universitários, que tem planos de saúde e estudam em universidades públicas.

Dinheiro para Saúde e Educação não cai do céu. É fruto dos impostos. A arrecadação fiscal per capita no Brasil ainda muito inferior a dos países desenvolvidos. Somos um país rico, mas um povo pobre.

A única maneira de aumentar a arrecadação é aumentar a atividade econômica. E aí entra a importância da Copa. Se ela atrai turistas, se gera novos negócios, gerará também mais atividade econômica, que por sua vez gerará impostos, que poderão ser usados em Saúde e Educação.

A Copa é importante, portanto, para gerar mais gastos em Educação e Saúde.

Sobre os mascarados, já falei aqui. Sou contra a presença dele em manifestações.

O Brasil deveria fazer uma legislação específica para coibir o uso de máscaras em manifestações, para proteção dos próprios manifestantes.

A presença de mascarados facilita a infiltração de provocadores, que agem para destruir a própria manifestação.

Não podemos esquecer tão rápido a morte do repórter Santiago, até porque ainda não discutimos profundamente o que aconteceu. Um dos rapazes disse que o rojão era destinado à polícia. Esse é o grande perigo.

Imagine se o rojão explodisse no rosto de um policial, ferindo-o. Seus colegas se descontrolariam emocionalmente e partiriam para cima dos manifestantes, e eis que ocorre uma morte de um manifestante, quiçá de um totalmente pacífico. Balas são traiçoeiras.

O que aconteceria? Haveria uma comoção nacional? O Brasil se ergueria em fúria? Contra o quê? Contra quem?

Pior, e se o rojão que feriu o policial tivesse sido disparado justamente com essa intenção?

Será possível que o Brasil tenha se tornado um país tão facilmente manipulável? Tão frágil? É tão fácil assim nos derrubar? Pior que sim.

A nossa mídia é um caso perdido. Ela se vende a quem paga mais caro. E sabemos muito bem a quem ela presta continência em primeiro lugar. Esse é um problema importante em toda a América Latina.

Suas mídias não são comprometidas, de fato, com a democracia, apesar de sempre usarem o vocabulário democrático para venderem suas teses. Foi assim em 1964. É assim hoje.

Qual a solução? A solução é lutar por uma reforma política e uma regulamentação democrática da mídia.

A nossa imprensa faz ataques ao Sarney e a Henrique Alves, mas jamais informou ao Brasil de onde eles tiram seu poder eleitoral: suas famílias controlam as mídias regionais, sobretudo a distribuidora da Rede Globo.

A elite é muito esperta. Pode financiar, secretamente, manifestações lideradas por jovens de extrema esquerda que pregam o fim do capitalismo.

O objetivo é fomentar o caos, constranger o governo e criar na população o desejo por uma liderança forte, austera, que restabeleça a ordem.

Não é uma conspiração tão complicada assim, afinal. Nem moderna. Os romanos a praticavam há mais de mil anos. Fomentavam revoltas domésticas nos povos que desejavam dominar. Às vezes financiavam inclusive movimentos contra Roma, sempre com objetivo de dividir e conquistar.

Quem participa de manifestações que contam com a presença de mascarados, portanto, pode estar participando de um ataque à nossa democracia sem o saber. Afinal, como saber que não há, entre os mascarados, gente que defende o golpe militar ou mercenários pagos por organizações de extrema-direita?

O pior é que os setores mais perigosos da direita sabem que apenas a emergência de uma situação de caos poderia lhe dar esperanças de uma mudança no regime.

O caos é criativo. Pode gerar mudanças também para melhor. É esta a melhor armadilha para a esquerda: uma isca. Ela vê a possibilidade de mudança e seus olhos brilham, e vai atrás, não vendo que caminha para o abismo.

Os que financiam essas iniciativas com certeza saberão minimizar os riscos de que esses protestos se voltem contra eles. Não à tôa, a mídia já tem feito, desde as jornadas de junho, um malicioso jogo duplo.

Primeiro, fingiu apoiar as manifestações, mesmo com a violência ultrapassando todos os limites do tolerável, a ponto de repórteres cobrirem os protestos do alto de helicópteros para não serem agredidos, seja por manifestantes, seja por policiais (principalmente, sabe-se lá porque). O que acho ridículo. Manifestações minimamente civilizadas jamais agridem jornalistas. 

Agora, a mídia finge ser contra os black blocs, mas lhes dão um espaço que jamais nenhum outro grupelho jamais teve. Suas mensagens são reproduzidas em seus portais imediatamente após serem publicadas.

Estamos diante de grandes perigos, complexas armadilhas. Por isso temos que ser firmes. A defesa da ordem não é monopólio da direita ou da ditadura. A democracia também precisa de ordem.

Jovens cheios de testosterona e fumaça podem se esquecer disso. O povo, não. Se a democracia não oferecer ordem, segurança e estabilidade ao povo, ele escolherá a ditadura.

A democracia, por isso mesmo, tem de se defender. O Brasil precisa de paz, para terminar de construir as estradas, ferrovias, hidrelétricas, pontes, refinarias, portos e aeroportos de que necessita para crescer economicamente e dar continuidade ao processo de distribuição de renda e melhora dos serviços oferecidos à população.

Não tem nada de progressista achar que o país deva ficar refém de grupos violentos, sem qualquer tipo de repressão. Aliás, a PM de São Paulo que cercou a manifestação inaugurou uma tática louvável. Os Pms não portavam armas. O número de feridos caiu drasticamente. Esse é o caminho. Repressão inteligente, estratégica, apenas na medida em que a necessidade exige.

Até porque não me surpreenderia se alguns estados fizessem uma repressão calculada, justamente para produzir comoção nacional e estimular mais protestos.

Temos alguns pactos tácitos na nossa sociedade. Movimentos de sem teto e sem terra, por exemplo, tem suas liberdades. Podem invadir fazendas improdutivas e edifícios abandonados, porque a democracia precisa de alguns empurrões para avançar.

Mas não há sentido em entender a democracia como um regime em que todos podem tudo. Não tem sentido permitir que jovens mimados quebrem agências bancárias, provoquem caos no trânsito, revirem lixeiras, invadam e depredem repartições públicas. E tudo isso sem objetivo, sem liderança, sem qualquer estratégia.

Não é assim que faremos o país melhorar. O Brasil precisa de inteligência, não de truculência. 

Se houver necessidade de sermos violentos um dia, que seja para defendermos a democracia, não para sabotá-la.

Fonte:
http://tijolaco.com.br/blog/?p=14460

Nota:

A inserção das imagens, quase todas capturadas do Google Images, são de nossa responsabilidade, pois inexistem no texto original.

quarta-feira, 4 de dezembro de 2013

Justiça, intelectuais, PT-PSDB e suspeitas

01/12/2013 - Jean Menezes de Aguiar (*)
- blog Observatório Geral

Vive-se um descrédito da Justiça brasileira. Com o processo do “mensalão” as coisas pioraram.

Talvez os fatores mais visíveis nem sejam o Judiciário, o Direito ou seus operadores. Mas uma visão crítica e ultraqualificada, alvissareiramente vadia – no melhor dos sentidos - e descolada do pensamento conservador.

Tipicamente intelectual e à deriva, existente no lado de fora.

O Direito brasileiro pós-ditadura não é um formador de intelectuais, críticos ou pensadores.

Passou a ser um conformador de burocratas, crédulos e sisudos.

Os conceitos de transgressão, marginalidade, esquerda, pós-modernidade, sociedade assimétrica, pensamento complexo, marxismo, pensamento anárquico que costumam agradar a intelectuais e pensadores em geral, continuam a amedrontar profissionais do Direito.

Não poucos destes se mostram positivistas, legalistas, obedientes e encapsulados em seus ternos pretos, agora no modelito “mamãe quero dar”.

São os cânones da caretice, do capitalismo e do conservadorismo. Quando não da cepa do autoritarismo.

O sociólogo francês Alain Touraine [foto] esgarça o assunto:

“Eu não sou um legislador, sou um transgressor”. Pura poesia.

Um questionamento que deveria compor o menu é: o que você “quer” ser, um legalista, um ordeiro, um conservador; ou, no lado oposto, um criativo, um transgressor, um artista, um sonhador ou um liberto-libertino?

É claro que as posições não são maniqueístas ou organizadas assim. Mas o princípio é mais ou menos este.

Russel Jacoby [foto] na obra “Os últimos intelectuais” afirma que “Pensar e sonhar requerem um tempo desregulado; os intelectuais perpetuamente postados em cafés e bares ameaçam os respeitáveis cidadãos pelo esforço que colocam – ou pela aparência – em escapar da escravidão do dinheiro e do trabalho duro”.

O Direito ensinado no Brasil perdeu o sonho e a vocação. Foi estuprado pelo capitalismo personalista e portátil do concurso público.

Emprenhou-se de um consumismo provinciano, mas essencialmente ególatra.

Sem sonho não nascem intelectuais.

Relativamente ao processo do “mensalão”, há que se reparar, não foram os chamados operadores do Direito que abriram críticas ao modelo. E não se diga que elas não há.

Ives Gandra, Celso Antônio Bandeira de Mello, até o português Canotilho questionaram.

Mas é numericamente muito pouco.

A crítica massiva e pesada veio de fora. E veio com a legitimidade da intelectualidade espontânea. Revoltada.

Quem contesta a autoridade moral de Aldir Blanc [foto abaixo], Luis Nassif e Wanderley Guilherme dos Santos para desacatarem o pensamento conservador?

Há um vetor sociológico que se empenou.

O Poder Judiciário pós-Constituição de 88, decisivamente influenciado pela Constituição Cidadã conseguiu coisas.

Mas se nas décadas passadas seu pecado era não condenar poderosos, agora é escolher dentre eles quem cumpre pena.

A academia não combateu o macarthismo nos Estados Unidos. O pensamento jurídico brasileiro não está combatendo a discriminação na escolha ideológica de condenados do mensalão a serem presos.

Toda sociedade padece com ondas que agradam a uns e desagradam a outros.

Mas estudar História é saber que algumas dessas ondas terão efeitos negativos no futuro. O continuado silêncio do Supremo Tribunal Federal é ruim.

Não se pode fingir que não há críticas qualificadas do lado de fora.

Nem se diga da imprensa, que no “Dicionário de política” de Norberto Bobbio figura expressamente como Quarto Poder.

Finja-se que o que a imprensa diz e cobra não vale nada, ok.

Mas o ouvido de mercador não funciona diante de críticas equilibradas e contextualizadas. Seja do mundo jurídico, seja da intelectualidade.

Dois fatores são preocupantes.

1) as críticas ultraqualificadas de juristas de que o processo do “mensalão” se deu açodado e político.

2) a especulação sobre a candidatura de Joaquim Barbosa na direita, em oposição ao PT.

Se Barbosa sair do tribunal e confirmar a suspeita de observadores de fora, isto equivalerá a um golpe, cuja caneta terá sido a que elaborou uma sentença judicial e os perseguidos terão sido os que compuseram uma direção política com mandato.

Dificilmente a sociedade enxergaria isso.

O namorador Fernando Henrique Cardoso [foto], o único do PSDB que teria alguma chance contra Dilma, mas jamais concorreria por “chance”, afora a idade, advertiu sobre “salvadores da pátria”.

Joaquim Barbosa foi fabricado por uma imprensa do escândalo como um salvador da pátria.

A História já cansou de mostrar o engodo eficacial que foram os salvadores das pátrias.

Mas ela também mostra que grande parte do povo é uma moça bobinha que adora ser seduzida.

Ficam os críticos e intelectuais berrando já roucos em blogs e jornais; o povo pagando a conta; e a horda sorrindo com seus “salários” de 50 mil reais e meses de férias por ano.

A inteligência ainda não conseguiu reverter este quadro brasileiro.

Se Joaquim Barbosa tiver um pingo de juízo não capitula à política e desmoraliza quem o construiu.

O problema é que quando a mosca azul pica, danou, dizem.

(*) Jean Menezes de Aguiar, é jornalista e editor do blog Observatório Geral

Fonte:
http://observatoriogeral.com/2013/12/01/justica-intelectuais-pt-psdb-e-suspeitas/

Nota:
A inserção de algumas imagens adicionais, capturadas do Google Images, são de nossa responsabilidade, elas inexistem no texto original.

domingo, 1 de dezembro de 2013

Geni de uma biografia heroica e severina

25/11/2013 - Geni, por Roberto Amaral - Carta Capital

José Genoino, preso, algemado e torturado após a guerrilha do Araguaia. "Naquela hora eu pensava na minha família que esperava ter um filho doutor para ajudá-los"
(José Genoíno, sobre o momento da prisão em Xambioá)

É este ser humano que, para gáudio de seus torturadores, sofre o mais escandaloso linchamento moral a que um homem público brasileiro jamais foi submetido.

‘Nenhuma boa ideia merece um cadáver’.
(Héctor Erazo, escritor colombiano)

De sua vida conheço pouco. O suficiente, porém, para respeitá-lo e nutrir profundo desprezo pelos que tentam depredar sua história e sua honra.

Maria Laís e Sebastião Guimarães,
pais de José Genoíno 
Filho de camponês no interior do interior do Ceará [foto], em pleno semiárido nordestino, conheceu na carne, cedo, as forças telúricas que o sertanejo pobre precisa arregimentar para sobreviver.

Menino ainda, trabalharia com o pai como “cassaco” nas frentes de trabalho do DNOCS, carregando pedra e abrindo à força da enxada estradas de terra, pretexto para dar sobrevida aos flagelados da seca de 1958.

O salário era pago em alimentos e querosene para o lampião.

Pelas mãos de um pároco entusiasmado pela Teoria da Libertação (por onde andará o Padre Salmito?), do qual fora coroinha, deixa a roça para lutar na cidade grande por melhores oportunidades de sobrevivência digna.

Refaz a trajetória atávica de tantos antepassados.

Em Fortaleza, trabalha e estuda à noite em colégios públicos, ingressa na Faculdade de Direito (quando seria aluno de Paulo Bonavides) e é conquistado pelo movimento estudantil, pelo qual se destaca para conhecer a primeira prisão de sua vida severina (severíssima, saberia anos depois): na primeira incursão em defesa da democracia, em uma passeata contra o golpe de 1964 – golpe, relembre-se, maquinado nos quartéis e nos altos círculos do empresariado com destaque para os grandes capitães da grande imprensa brasileira, daquele de então e de hoje.

Golpe que, não sabia, naquela altura, o perseguiria até hoje.

Quatro anos passados, ainda universitário, é preso no Congresso da UNE em Ibiúna (1968), no interior de São Paulo.

Solto, tem a prisão preventiva decretada; sem alternativa, ingressa na clandestinidade e vai travar como lhe permitem as circunstâncias sua luta na resistência à ditadura.

Não sei o que, naquela altura, faziam seus algozes de hoje.

Da luta de massa, ele transita para a resistência armada.

Em junho de 1970, filiado ao PCdoB, ingressa na guerrilha do Araguaia.

Conhece o inferno e descobrirá que sua vida severina era uma quase-morte.

Preso em 1972 pelo Exército Brasileiro, vê-se, clandestino, incógnito, à mercê da humilhação, da ofensa, da degradação física e moral, a ignomínia da tortura a mais insidiosa, implacável, fria, bestial e científica, na qual o pau-de-arara, a “cadeira do dragão” (choques elétricos), o sufocamento, os “telefones” (pancadas nos ouvidos) e os pontapés eram o vestibular do inimaginável em termos de perversão e perversidade.

Foi torturado ainda no Araguaia (e como o foi!), em Brasília e em São Paulo.

Preso clandestino, incógnito, verdadeiro sequestrado, sem conhecimento da autoridade judiciária, inteiramente à disposição de seus algozes, sem o amparo sequer da lei de proteção aos animais, invocada nos idos do Estado Novo pelo apóstolo Sobral Pinto na defesa de Prestes. Só não padeceu onde não esteve.

Conheci-o no final dos anos 80 (só em 1977 ele recobraria a liberdade), chefiando eu a assessoria da bancada do PSB na Constituinte liderada pelo inesquecível e saudoso Jamil Haddad, ele um dos mais destacados deputados do PT.

Ex-guerrilheiro, líder radical do Partido Revolucionário Comunista (então uma fração dentro do PT), revela-se conciliador e articulador habilidoso, um dos costuradores de muitas das conquistas que a esquerda brasileira logrou trazer para a “Constituição cidadã”.

Torturado por militares, poucos como ele, porém, tanto lutariam pela aproximação entre civis e militares.

Eu o reveria, corajoso, dedicado, na jornada do impeachment contra o ex-presidente Collor, e continuaria acompanhando sua vida parlamentar, voltada à liberdade, à democracia e à defesa da soberania nacional.

Distanciava-se do marxismo-leninismo, mas permanecia obcecado pela justiça social, caminhando do esquerdismo para concepções socialdemocratas avançadas. Para o bem das esquerdas em geral, cultivava a crítica de nossas organizações.

No primeiro governo Lula é eleito presidente do PT, em substituição a José Dirceu, e por artes e maquinações que desconheço termina envolvido no chamado escândalo do “mensalão”.

Sempre alegando inocência, foi acusado, julgado, condenado e apresentou-se à execução da pena.

É este ser humano (sim, ser humano!) que, para gáudio de seus torturadores impunes, sofre o mais escandaloso, brutal, injusto linchamento moral a que um homem público brasileiro jamais foi submetido.

Não discuto sua culpa nem o mérito da pena após tão longo e tumultuado julgamento, e sei que sua biografia não absolve os erros do presente.

Digo que o linchamento não é pena capitulada em nosso Código Penal.

Mais do que o justo clamor da opinião pública ferida em seus brios, cansada de tanta impunidade selecionada e sedenta de punição, vejo, na sua execração, uma difusa vendetta.

Mais que os erros que lhe são imputados (dessa ainda não suficientemente esclarecida aventura do “mensalão”), pesa sobre sua imagem de hoje a sombra do guerrilheiro do passado.

É a este que se pune. A biografia agrava a pena.


Os que não puderam matá-lo (como fizeram com Rubens Paiva, Stuart Angel, Mário Alves, Manuel Fiel Filho, Pedro Pomar, Bérgson Gurjão, Joaquim Câmara, Marighela, Herzog e tantos e tantos heróis), os que foram derrotados com a redemocratização, os que perderam todas as eleições, querem a revanche e avançam covardemente sobre o carcará sem asas, já sem garras, já sem fôlego.

No momento em que escrevo, a presa é um homem abatido, um cardiopata com uma aorta artificial, lutando contra crises de pressão arterial.

É o cadáver atrasado que, impacientes, reclamam.

É nesse homem que batem, um  prisioneiro da Justiça, cumprindo pena como devem cumprir todos os condenados.

Quem ganha com isso? Que benefícios aufere nossa sociedade com a prática de tratar o oponente político como inimigo, e inimigo a ser abatido, destruído, dilacerado?

Estranhos tempos. Estranha história.

Maluf caminha lampeiro pelos gabinetes da Corte e o torturador Brilhante Ustra saboreia a aposentadoria que a impunidade lhe facultou.

Mas José Genoino Neto, um homem pobre após quase sete mandatos de deputado federal, cumpre pena por corrupção.

Estranhos tempos. Estranha história.

Nesta hora sombria, estendo a mão ao homem José Genoino Neto e nego-a aos que lhe jogam pedras, como na Geni de Chico Buarque.

Desprezo os linchadores, como desprezo os que se omitem diante de sua dor.
Fonte:
http://www.cartacapital.com.br/politica/geni-545.html

Nota:
A inserção das imagens, quase todas capturadas do Google Images, são de nossa responsabilidade, pois inexistem no texto original.

segunda-feira, 16 de setembro de 2013

Nassif: análise dura do STF e da mídia

15/09/2013 - Nassif faz análise dura do STF e da mídia
- Miguel do Rosário - Tijolaço

O blogueiro Luis Nassif [foto] acaba de publicar uma duríssima análise sobre os arbítrios que marcaram a cobertura do julgamento do mensalão.

Nassif observou que Celso de Mello deverá aceitar os embargos infringentes, mas em seguida tenderá a ser o mais severo dos ministros, num julgamento que, de há muito, perdeu o rumo.

Não há jurista ou advogado, estudante ou doutorado sério deste país que não tenha entendido o julgamento como o exercício abusivo do poder discricionário e da militância partidária.

A mídia, naturalmente, é peça fundamental nesse jogo de pressões para um julgamento político e de exceção.

Trata-se da estratégia Rupert Murdoch (o dono da Fox, canal que ficou conhecido nos EUA por um republicanismo reacionário de caráter histérico).

A estratégia demandava insuflar a classe média, ainda seguidora da mídia, com os mesmos recursos que marcaram grandes e tristes momentos da história, como o macarthismo, o nazi-fascismo europeu dos anos 20 e 30, a Klu Klux Klan nos anos 60."

"Essa estratégia exige uma linguagem virulenta, que bata no intestino do público, e pregadores alucinados, que espalhem o ódio."

"Qualquer espécie de juízo – isto é, da capacidade de separar vícios e virtudes – compromete a estratégia, porque ela se funda na dramaturgia, no maniqueísmo mais primário, na personificação do mal, na luta de extermínio.

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Íntegra do artigo de Nassif

Fonte:
http://tijolaco.com.br/index.php/nassif-faz-analise-dura-do-stf-e-da-midia/

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15/09/2013 - Celso de Mello é a última tentativa de legitimar o enforcamento
- Luis Nassif - GGN-O jornal de todos os Brasis

Não se iludam com Celso de Mello.

Suas atitudes mais prováveis serão:

1.     Votar pela aceitação dos embargos de infringência.

2.     No segundo julgamento, ser o mais severo dos julgadores, fortalecido pelo voto anterior.

A aceitação dos embargos será uma vitória de Pirro.

O resultado mais provável da AP 470 será um segundo julgamento rápido, em torno da tipificação  do crime de formação de quadrilha.

Poderá resultar em condenações um pouco menores, mas não o suficiente para livrar os condenados da prisão.

Com isso, se dará um mínimo de legitimidade às condenações.

Celso de Mello é um garantista circunstancial, apenas a última tentativa de legitimar um poder que perdeu o rumo.

A deslegitimação do STF
Para entender melhor o jogo.

No primeiro julgamento, devido à atuação do grupo dos 5 – Gilmar Mendes, Luiz Fux, Ayres Britto, Joaquim Barbosa e o próprio Celso – o STF foi alvo de críticas generalizadas – embora veladas – do meio jurídico.

Não há jurista ou advogado, estudante de direito ou doutor sério deste país que não tenha entendido o julgamento como o exercício abusivo do poder discricionário.

Apenas uma coisa diferencia Celso de Mello de seus pares.  

Este tentou preservar o mínimo apreço pela liturgia do cargo.

Os demais perderam o pudor, exercem a politicagem mais malandra, típica das assembleias político-estudantis  – como adiar o julgamento para permitir pressão da mídia sobre o voto de desempate de Celso – sem nenhuma estratégia de imagem.

Querem exercer o poder plena e abusivamente.

Não pensam na história, nem sequer na legitimação das sentenças, mas no gozo imediato do poder.

Lembram – em muito – os burgueses da revolução industrial, os texanos barões de petróleo invadindo a Europa, pisando no Louvre de botas, agindo 
sem nenhum apreço pela liturgia do cargo.

Mal comparando, Celso é o juiz do leste que ouve todos os réus, trata civilizada, mas severamente, as partes e, cumprindo os rituais, manda todos 
para a forca, com carrasco oficial seguindo o cerimonial.

Os demais se assemelham ao juiz do velho oeste, de barriga de fora, em um saloon improvisado de sala de julgamento, que interrompe o julgamento no meio, para não perder tempo, e manda enforcar os acusados na árvore mesmo.

São tão truculentos e primários que seguem a truculência primária da mídia, não cedendo em nenhum ponto, pretendendo o aniquilamento total, o extermínio, a vitória em todos os quadrantes, mesmo nas questões menos decisivas.

Tivessem um mínimo de esperteza, aceitariam os embargos, atrasariam por algumas semanas o final do julgamento, e profeririam as mesmas sentenças 
duras mas, agora, legitimadas pela aceitação dos embargos.

Mas são muito primários e arrogantes. 

A deslegitimação do padrão Murdoch
Essa é a perna mais fraca da estratégia de Rupert Murdoch e de sua repetição pelo Truste da Mídia (e pelo cinco do STF), quando decidiu conquistar o espaço político para enfrentar os verdadeiros inimigos – redes sociais – que surgiram no mercado.

A estratégia demandava insuflar a classe média, ainda seguidora da mídia, com os mesmos recursos que marcaram grandes e tristes momentos da história, como o macarthismo, o nazi-fascismo europeu dos anos 20 e 30, a Klu Klux Klan nos anos 60.

Essa estratégia exige uma linguagem virulenta, que bata no intestino do público, e pregadores alucinados, que espalhem o ódio

Qualquer espécie de juízo – isto é, da capacidade de separar vícios e virtudes – compromete a estratégia, porque ela se funda na dramaturgia, no maniqueísmo mais primário, na personificação do mal, na luta de extermínio, no pavor de qualquer mudança no status quo.


Não há espaço para nenhuma forma de grandeza, respeito ao adversário caído, pequenas pausas de dignidade que permitissem dar um mínimo de 
conforto aos seguidores de melhor nível.

Por isso mesmo, nenhuma personalidade de peso ousou aderir a esse novo mercado que se abria.

E ele passou a ser ocupado pelos aventureiros catárticos, despejando impropérios, arrotando poder, mostrando os músculos, ameaçando com o fogo do inferno, todos vergando o mesmo figurino de um Joseph McCarthy e outros personagens que foram jogados no lixo da história.

Guardadas as devidas proporções, foi essa divisão que se viu no Supremo.

A recuperação dos rituais
O universo jurídico ainda é o mais conservador do país, o mais refratário às mudanças políticas e sociais, aos novos atores que surgem na cena pública. Certamente apoiaria maciçamente a condenação dos réus.

Mas o que viam no julgamento?

Do lado dos acusadores, Ministros sem nenhum apreço pela Justiça e pelos rituais, exercitando a agressividade mais tosca (Gilmar), o autoritarismo e deslumbramento mais provinciano (Joaquim), a malandragem mais ostensiva (Fux), a mediocridade fulgurante (Ayres Britto) a hipocrisia sem retoques (Marco Aurélio) [foto].

Do lado contrário, a dignidade de Ricardo Lewandowski, um seguidor das tradições das Arcadas, percorrendo o roteiro que todo juiz admira, mas poucos se arriscam a trilhar: o julgador solitário, enfrentando o mundo, se for o caso, em defesa de suas convicções.

Aí se deu o nó.

Por mais que desejassem a condenação dos “mensaleiros”, para a maior parte dos operadores de direito houve enorme desconforto de se ver na companhia de um Joaquim, um Gilmar, um Ayres Brito e do lado oposto de Lewandowski.

Pelo menos no meio jurídico paulista, ocorreu o que não se imaginava: assim como os petistas são “outsiders” do universo político, os quatro do Supremo tornaram-se “outsiders” do universo jurídico.

E Lewandowski, achincalhado nas ruas, virou – com justiça – alvo da admiração jurídica. 

Além de ser um autêntico filho das Arcadas.

É aí que surge Celso de Mello para devolver a solenidade, remontar os cacos da dignidade perdida da corte, promover a degola dos condenados mas sem atropelar os rituais.

Ele não é melhor que seus companheiros.

Apenas sabe usar adequadamente os talheres, no grande festim que levará os condenados à forca.

Fonte:
http://jornalggn.com.br/noticia/celso-de-mello-e-a-ultima-tentativa-de-legitimar-o-enforcamento

sábado, 7 de setembro de 2013

Um julgamento a ser revisto

05/09/2013 – Wanderley: Julgamento do mensalão tem de ser revisto
- Miguel do Rosário em seu blog O Cafezinho

Em seu artigo de hoje [5/9], o professor Wanderley Guilherme dos Santos afirma que os erros grosseiros do julgamento da Ação Penal 470 fazem com que seja necessário “rememorá-lo sempre até que seja revisto”.

Ele critica também a tendência dos ministros do STF de pretenderem ser os portadores de soluções políticas para os problemas nacionais. Cada um teria a sua “reforma de estimação”.

Ao invés disso, é necessário reformar também o judiciário, visto que desde suas instâncias mais humildes, em comarcas do interior, até a corte suprema, todas se vêem fragilizadas pelas pressões do poder econômico.

Assim como o Legislativo, contudo, o Judiciário resiste a reformas, de maneira que estas devem constar em programas de governo. Só assim, conclui Wanderley, teremos uma justiça democrática, e não uma justiça “televisiva”.

A Globo não escapou da análise do professor.

Trecho:

(…) o Brasil contará mais meio século antes que a mesma Organização Globo venha outra vez a público dizer que se equivocou no que está perpetrando agora. Já terão morrido os responsáveis pelos assassinatos de caráter que patrocinam hoje, seus comentaristas e cronistas, como já morreram os que, em 1954 e 1961, e novamente em 1964, desta vez com sucesso, conspiraram, participaram, apoiaram e se beneficiaram de todos os movimentos reacionários já ocorridos na história republicana.

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A hora da justiça para todos
- Wanderley Guilherme dos Santos

 Seria surpresa se ocorresse alguma alteração nas penas do julgamento da Ação Penal 470. A composição do Supremo Tribunal Federal está irremediavelmente contaminada pela obstinação de vingança.

Cada um dos ferozes membros persecutórios terá sua razão para tanta ousadia, não sendo de ignorar a ânsia coletiva de abiscoitar segundos de televisão.

Televisão comprometida, que divulgava e assediava, promovia e cobrava.

Difícil imaginar Joaquim Barbosa [foto] expondo a mesma agressividade e maus modos em outro julgamento.

Ou a perfídia demonstrada pelo alquimista da “teoria quântica do Direito”, Ayres de Brito, a despudorada confissão de Luis Fux dos caminhos que percorreu até conseguir a indicação para uma vaga.

Manobras entre as quais se inclui a bajulação de José Dirceu, a quem devolve, em paga, a inclemência de um juízo ao arrepio das evidências.

Ayres Brito
Muito especialmente, não fora a televisão e os pares não teriam paciência para os arrebatados libelos fascistóides de Celso de Melo. Ele, Ayres de Brito e Joaquim Barbosa oficiaram sucessivos rituais de degradação e humilhação de que são poupados até mesmo reais assassinos.

Chamando os fatos por seus nomes, deviam ser constitucionalmente afastados dos privilégios que detêm e submetidos a julgamento por calúnia e difamação.

Não ocorrerá, com certeza, e o Brasil contará mais meio século antes que a mesma Organização Globo venha outra vez a público dizer que se equivocou no que está perpetrando agora.

Luis Fux
Já terão morrido os responsáveis pelos assassinatos de caráter que patrocinam hoje, seus comentaristas e cronistas, como já morreram os que, em 1954 e 1961, e novamente em 1964, desta vez com sucesso, conspiraram, participaram, apoiaram e se beneficiaram de todos os movimentos reacionários já ocorridos na história republicana.

Revisão do julgamento inteiro é o que se impõe. Esse processo não pode terminar pela prepotência e pela sede de vingança. Há que rememorá-lo sempre até que seja revisto.

Celso de Melo
Imagino o que se passa nos rincões do País aonde não chegaram as garantias do Judiciário, ficando a população pobre entregue aos potentados locais. Ou, se elas chegaram, apresentam-se inúteis, tendo seus agentes, os juízes, intimidados ou corrompidos pelos mesmos milionários.

Sabendo ou não sabendo o que dizem, ocupados e desocupados, sucedem-se os advogados de uma reforma política, acusadores permanentes do Legislativo.

Aliás, não há um só ministro de qualquer instância que não proclame os benefícios de sua reforma de estimação. Como se ao Judiciário tivesse 
bastado a modernização que, de fato, sofreu. Mas não basta.

Há corrupção, negligência e desvirtuamento da função judiciária por esse Brasil a fora. Inútil esperar de seus pares (como eles afirmam dos políticos) as iniciativas para assegurar um sistema realmente moderno e independente em todo o território nacional. Deve ser programa de governo.

A população pobre do Brasil já teve fome. Hoje, tem a perspectiva do alimento e do teto. Necessita de justiça.

Enquanto não houver justiça para todos digna desse nome não se poderá dizer que o Brasil é um país solidamente democrático.

Fora do alcance da justiça, não obstante eventual existência de instituições judiciárias, sobrevive complexa sociedade na qual os capítulos constitucionais dos direitos sociais e políticos dos cidadãos são letra morta.

A constitucionalização urgente de todo o País é programa de governo. Justiça para todos ou o Supremo não será nem tribunal, nem federal, apenas uma corte televisiva.

Fonte:
http://www.ocafezinho.com/2013/09/05/wanderley-impoe-se-revisao-do-julgamento-inteiro/