Mostrando postagens com marcador François Hollande. Mostrar todas as postagens
Mostrando postagens com marcador François Hollande. Mostrar todas as postagens

segunda-feira, 23 de dezembro de 2013

Líderes europeus rejeitam apoio a missões militares francesas na África

20/12/2013 - Por Redação, com DW - de Brasília - Correio do Brasil

Líderes da UE rejeitaram ajuda financeira pedida por Hollande para apoiar missões militares francesas no continente africano

O presidente da França, François Hollande [foto], sofreu uma derrota no primeiro dia do encontro de cúpula da União Europeia (UE), em Bruxelas. Os líderes da UE rejeitaram a ajuda financeira pedida por Hollande para apoiar as missões militares francesas no continente africano.

Na reunião, os 28 países-membros da UE aprovaram somente uma avaliação das regras que preveem o financiamento conjunto de missões militares realizadas por um ou mais parceiros do bloco europeu.

- Não podemos financiar nenhuma missão em que não estivemos envolvidos no processo de decisão – declarou a chanceler federal alemã, Angela Merkel [foto], no final do primeiro dia do encontro.

Merkel declarou ainda que a Alemanha e outros países-membros da UE esperam, no futuro, uma mudança de comportamento da França.

Segundo Merkel, uma decisão do Conselho de Segurança das Nações Unidas não é suficiente para que um país-membro da UE empreenda uma missão militar.

É necessário também que a missão seja coordenada e aprovada pelos parceiros da UE caso se almeje uma corresponsabilidade europeia.

Merkel afirmou que já teria dito isso a Hollande, em encontro bilateral na quarta-feira em Paris.

Solidariedade europeia em estruturas europeias
No ano passado, Hollande mandou tropas francesas para o Mali e, recentemente, enviou 1.600 soldados para a República Centro-Africana, com o objetivo de reprimir revoltas e pacificar países que se localizam em tradicional zona de influência francesa na África Ocidental.

A França está, portanto, agindo em interesse próprio.

Mas, devido ao alto custo das missões militares, Hollande sugeriu um fundo europeu permanente para o financiamento de tais missões.

O presidente francês, por sua vez, afirmou no primeiro dia de reuniões que a Polônia se dispôs a apoiar, com 50 técnicos da Força Aérea, a missão militar francesa na República Centro-Africana.

Antes do encontro, Hollande havia dito que tanto a ONU quanto a União Europeia teriam apoiado a intervenção no Mali e na República Centro-Africana (RCA).

“E ao financiamento deve seguir o apoio político”, exigira Hollande.

O presidente, no entanto, parece ter se enganado.

Além de Merkel, também o primeiro-ministro sueco, Fredrik Reinfeldt [foto], afirmou que, “quando se pede a solidariedade europeia, então a tomada de decisão deve se encontrar dentro de estruturas europeias”.

Cameron, Rasmussen e a Otan
O primeiro-ministro britânico, David Cameron [foto], afirmou que considera sensata uma cooperação militar entre os europeus.

Mas não é correto que a União Europeia possua tais capacidades – um Exército próprio, Força Aérea etc.

Cameron não quer de maneira alguma estruturas paralelas à Otan.

Isso não somente seria um desperdício de dinheiro, argumenta, mas também poderia vir a enfraquecer a Otan.

Nesse ponto, no entanto, Cameron contradisse ninguém menos que o próprio secretário-geral da Otan, Anders Fogh Rasmussen [foto abaixo], que também foi convidado para as negociações em Bruxelas.

Rasmussen não disse ver nenhuma contradição entre um aumento da capacidade de defesa da Europa e uma Otan forte.

“Se nós, europeus, não pudermos mais cuidar da nossa segurança, corremos o risco de que os EUA se afastem de nós.”

Para acalmar os ânimos de Cameron, defensor das relações com os EUA e com a Otan, Rasmussen acresceu que não se trata de criar um Exército europeu.

As Forças Armadas continuam a pertencer aos diversos países.

Cooperação em tempos de crise
De qualquer forma, em tempos de “vacas magras”, os chefes de Estado e governo aprovaram em Bruxelas uma cooperação europeia mais estreita na política de segurança e armamentos.

Em 2014, a UE pretende aprovar ao menos uma estratégia de segurança marítima comum e pretende chegar a um acordo sobre um enquadramento legal para a defesa contra ataques cibernéticos.

Além disso, entre 2020 e 2025, os países-membros da UE pretendem desenvolver um drone europeu.

Isso poderia ajudar a encontrar uma solução para o problema da partida e aterrissagem de aviões militares não tripulados em espaço aéreo civil, o que foi um dos motivos para o fracasso na Alemanha do desenvolvimento do drone Euro Hawk.

Fonte:
http://correiodobrasil.com.br/destaque-do-dia/lideres-europeus-rejeitam-apoio-a-missoes-militares-francesas-na-africa/672066/?utm_source=newsletter&utm_medium=email&utm_campaign=b20131221

Nota:
A inserção de algumas imagens adicionais, capturadas do Google Images, são de nossa responsabilidade, elas inexistem no texto original.

Leia também:
- Duas aventuras pan-europeias: na África e na Ucrânia - Rui Peralta, de Luanda

terça-feira, 19 de fevereiro de 2013

Mali: rejeitemos esse desafio à civilização


Bandeira francesa junto a soldados do Exército do Mali. Foto: AFP

Por Antonio Negri*

A intervenção francesa no Mali reflete uma crise política que tende a generalizar-se na África saariana e subsaariana depois da “Primavera Árabe” do Magreb. “Manifesta-se o lado perigoso da Primavera Árabe”, escreve em manchete o New York Times, e acrescenta: “tinha razão o coronel Kadafi, quando previa que, se ele caísse, o pessoal de Bin Laden chegaria por terra e mar para ocupar as margens do Mediterrâneo”.

Mas, é isso que, realmente, impulsiona à rebelião os novos guerrilheiros nos desertos do Norte da África, ou são impulsionados por miséria cada vez mais feroz e pela lógica sempre destrutiva dos governos da ex-Françáfrica? As zonas rurais dos países do Sahel permaneceram, apesar delas mesmas, nos últimos anos, em situação de miséria profunda, que alimenta o êxodo da população e a desestabilização das grandes cidades. Frente a isso, as estatísticas macroeconômicas mostram a existência de um “falso” desenvolvimento vinculado à atual corrida pela extração de minérios em direção àqueles territórios ricos desses recursos: o Mali, por exemplo, é o terceiro produtor mundial de ouro, rico em urânio, e prevê-se que seja também muito rico em hidrocarbonetos.

O jihadismo entra nesses territórios não pelo fanatismo de alguns e não os submete a partir da ‘barbárie terrorista’ (como dizem à opinião pública ocidental), mas, sim, porque nesses países as instituições continuam a dissolver-se, dada a fragilidade econômica e civil. Por isso, o êxito dos “invasores” que não são invasores está praticamente garantido.

O Mali é só mais um país do Sahel – os demais também estão em situação crítica semelhante. A dúvida sobre o aprofundamento da crise em cada um deles depende só de alguns fatores casuais que ainda contêm o desabamento recém iniciado do “dominó”. No Mali, que em certo momento foi “vitrine da democracia”, o governo estava em crise há bastante tempo, asfixiado pela corrupção, por repetidos golpes de Estado e pela rebelião popular dos tuaregues no norte. Os tuaregues querem a independência do Azawad (vasta região desértica do norte do Mali). Essa revolta encontrou ocasião de triunfar porque, com a queda do governo do coronel Kadafi, muitos tuaregues voltaram ao seu país natal com armas (em grande e sofisticada quantidade) e equipamentos (logísticas regionais e alianças com parte do exército maliense). Deve-se ter em mente que a intervenção francesa (e da OTAN) na Líbia produziu naquele país a implosão de mil facções locais, ideológicas, étnicas, as quais, depois de Kadafi, ficaram sem qualquer autoridade capaz de ostentar força legítima.

A rebelião tuaregue armada encontrou, além disso, apoio forte e provavelmente decisivo em grupos salafistas e jihadistas que já em 2002, ao terminar a guerra civil argelina, haviam instalado os fundamentos da al-Qaeda no Magreb. Há cerca de dez anos, esses grupos vinham construindo (aproveitando a “indústria dos sequestros” e o apoio aos “traficantes’ ilegais que operam nesse amplo território) bases e redes de apoio à guerrilha. O perigo era evidente. Há três, quatro anos, está em andamento uma cooperação bilateral França-EUA para combater o que alguns chamam de “eixo Kandahar-Dakar”. Recentemente, o New York Times revelou que o Departamento de Estado investira cerca de 500 milhões de dólares nessa região, nessa estratégia de antiterrorismo. Já no início de 2012, o comando norte-americano na África, AFRICOM, deu-se conta de que boa parte das tropas malienses adestradas pelos norte-americanos haviam-se unido à revolução no norte do país.

Agora, vimos a intervenção francesa, em resposta a pedido urgente do governo de Bamako (ou do que resta dele) formalmente apoiado por extensa coalizão de países africanos e governos europeus. Mas a guerra francesa já parece estender-se como mancha de azeite para grande número de países vizinhos. O que se viu acontecer na Argélia na última semana, quando a gentil intervenção daquele governo e de seu exército já produziu centenas de assassinatos, é só o começo desse amargo desenvolvimento.

Por enquanto, consolam-se a imprensa e a opinião pública francesa com a crença de que não se trataria de guerra de usura (como a guerra no Iraque ou no Afeganistão) cujos protagonistas movem-se “entre as populações”; tratar-se-ia de guerra clássica no puro deserto, guerra de posições e de movimentos. As coisas não demorarão a mudar muito. Talvez os franceses, com as tropas de outros países africanos (que permanecerão sob comando dos franceses, enquanto os EUA continuarem reticentes e resistirem a envolver-se na mudança) consigam a vitória em campo. Mas em seguida... como governar no deserto, em situação de paz que não é paz, numa “guerra nômade” que começa, em quadro de histeria frente a eventuais ataques terroristas na França continental e, sobretudo, em face da memória da vergonha colonial e do despotismo pós-colonial mantido pela potência francesa? Mas, sobretudo, como considerar, na situação atual e em situação de pós-guerra – aspectos que nos permitimos chamar “aspectos bons” da Primavera Árabe, ou, melhor dizendo, daquela “Primavera Africana” que parecia estar começando a apontar também no Sahel?

É inútil – e vale a pena repetir – culpar o extremismo de um islamismo salafista radical, quando se está sufocando a única alternativa verdadeira que realmente teria chances de concretizar-se: o amadurecimento – já iniciado nesses territórios – de elites jovens, democráticas, anticapitalistas. É necessário atacar as causas socioeconômicas dessa crise.

Se se ouvem os especialistas, dizem que, para desenvolver um programa de reconstrução e de desenvolvimento, seria necessário intervir nesses territórios nos setores agrícolas, de reflorestamento, de criação de animais, na melhoria de estradas e do transporte, no acesso à água, na promoção da energia solar e eólica, etc. E logo reiniciar os programas de produção de algodão e de cereais nessas regiões... Em resumo: tudo. Por fim e especialmente, “as populações devem beneficiar-se da renda da mineração; do ouro, para começar, primeiro produto de exportação”.

Não é solução, de fato, cômica? E na risada não aparece, evidente, o cinismo, no mínimo hipócrita, que há em tanto insistir na mesma execrável sede de dinheiro que arrasta esses governos liberais a combater terroristas pelas impiedosas terras desérticas do Sahara e do Sahel como se fossem trunfos a distribuir entre os inimigos (porque é muito difícil identificar quem é terrorista e quem é camponês pobre ou proletário metropolitano agora sublevados). Ainda mais: não lhes parecem lágrimas de crocodilo – e na Itália todos as confundem – as lágrimas que nossos democratas tanto choram?

Pesado fardo de nossa civilização, que nos obriga a intervir! Sagrada obrigação da soberania, dessa vez exercida em nome da Europa! Atenção! Até os EUA já pararam de repetir essas estupidezes, depois das terríveis derrotas no Oriente Médio! Reconheçamos, isso sim, que só modificando radicalmente nossa consciência política, só rompendo radicalmente com formas de governos harmônicas e funcionais em relação ao capital, poderemos voltar a nos orientar corretamente.

No marco da globalização, não se pode raciocinar como raciocinam os Parlamentos nos países da Europa e o Parlamento Europeu, com homens e “mídia ou imprensa-empresa” votando a favor da intervenção francesa (e foi particularmente odiosa, em Estrasburgo, a atitude belicosa dos Verdes europeus).

Gilles Kepel – talvez o maior especialista em temas árabes conhecido no Ocidente – destaca que “o que está em jogo no Mali é um desafio à civilização na época da globalização. O Sahel é, ao mesmo tempo, vítima por excelência e lugar da incandescência”.

Acrescentamos: a resistência e a guerrilha anti-imperialista naquele desesperado local despossuído e devastado são luta anticapitalista. Não gostaremos de ter de reconhecer que os islâmicos têm razão.

*sociólogo e ativista político italiano, é autor, com Michael Hardt, de Império (Record, 2001). Tradução: Vila Vudu.

Leia ainda:
- Não à intervenção colonial no Mali
- Journal du Mali: O Mali, a França e os extremistas

sábado, 26 de janeiro de 2013

Malvinas: Reino Unido teria apoio da França em ofensiva contra Argentina

Por Renato Rovai, em seu blog
Publico abaixo uma notícia a qual tive acesso a partir de informações no twitter do @stanleyburburin e do @jamesrusso21. Trata-se de um texto em espanhol divulgado pelo site da HispanTV. Fiz uma tradução livre e apresento aos amigos porque mesmo que pareça pequena a chance de a Argentina vir a ser atacada pela Inglaterra, a hipótese aventada faz sentido.

Principalmente depois da declaração da presidente Dilma Rousseff alertando para o fato de que a França poderia estar tratando o Mali como se ainda fosse sua colônia. Muito estranho Dilma ter sido tão dura de forma tão rápida.

Segue a tradução:

Um grupo de parlamentares do Reino Unido revelou que o país britânico está apoiando a intervenção militar francesa no Mali para conseguir em troca respaldo em um eventual conflito com a Argentina pelas Ilhas Malvinas. O pretexto para a ação da Real Força Aérea Britânica (RAF), porém, seria dar “apoio logístico” à França em sua campanha terrestre com o objetivo de deter o avanço dos combatentes no país africano. Essas informações foram publicadas na quarta-feira no jornal 'The Bolton News'.

O parlamentar David Crausby, citado pelo Bolton, informou que o apoio militar francês junto a um aumento nos gastos militares são as únicas vías que possibilitariam a Inglaterra levar a cabo uma ofensiva contra a Argentina.

Além disso, outros veículos, como a revista semanal de notícias The Week, informam que membros da inteligência do Reino Unido têm advertido o primeiro ministro britânico, David Cameron, acerca de uma possível ação agressiva da Argentina se no referendo, previsto para março, os habitantes das Malvinas (o que parece certo) vierem a votar a favor da permanência como parte do país europeu.

Essas notícias explicam a postura de Cameron em não aceitar a via do diálogo como solução para o caso das Malvinas.

Cabe mencionar que o vice-presidente de Argentina, Amado Boudou, havia condenado a decisão do governo Britânico de convocar um referendo sobre o “status político” das Malvinas. E qualificou a decisão como falta de respeito à inteligência e ao dereito nacional e internacional.

Desde 1833, as islas Malvinas são ocupadas pelos Britânicos, que, naquele ano, expulsaram as autoridades e a população argentina local, levando ingleses para o território invadido.

Relacionadas:
-'Journal du Mali': O Mali, a França e os extremistas
-Não à intervenção colonial no Mali

quarta-feira, 23 de janeiro de 2013

Journal du Mali: O Mali, a França e os extremistas


Por Tariq Ramadan*
O mundo observa, e a classe política francesa parece unanimemente de acordo quanto ao início de uma intervenção militar ao norte do Mali contra os “islamistas”, “jihadistas”, “extremistas”. Nada a criticar por o governo ter-se engajado sozinho, mas a decisão de iniciar ação militar foi considerada “justa”. O presidente francês, François Hollande (acima), que parecia perdido no coração de governo confuso e desorientado, aplica belo polimento ao brasão e reconstrói para si a imagem de homem de Estado, de chefe de guerra, que quer “destruir o inimigo”, “impedi-lo de avançar”. E assim a França vê luzir no norte do Mali, afinal, a imagem de um presidente firme, forte, determinado, instalado em Paris.

É preciso começar pelo começo e assumir posição clara. A ideologia e as práticas das redes, grupos e grupúsculos de salafistas jihadistas e extremistas devem ser condenadas com absoluta firmeza. O modo como compreendem o Islã, o modo odioso como instrumentalizam a religião é abominável, os castigos físicos e corporais são absolutamente inaceitáveis.

Mais uma vez, a consciência muçulmana contemporânea internacional deve manifestar-se alto e forte para dizer e repetir que aquela compreensão e aquela aplicação do Islã são traição, são horrendas, são vergonhosas. Os primeiros a oporem-se àquilo têm de ser os muçulmanos, pessoalmente, e as sociedades majoritariamente muçulmanas. Politicamente, intelectualmente e com toda a força da consciência e do coração, sem restrições, sem concessões.

A essa firme posição de princípio, é preciso acrescentar a análise geoestratégica, e não confundir a clara posição moral, de um lado; com uma posição política ingênua, binária, simplista. Ser contra os extremistas jihadistas não implica, não, de modo algum, aceitar sem protesto a política francesa naquela região.

A expressão “estão conosco ou estão contra nós” de George W. Bush é falsa nos fundamentos e perigosa tanto na substância como nas consequências. Por trás do engajamento “nobre” da França ao lado dos povos africanos ameaçados, há algumas questões que têm de ser expostas e explicadas com clareza.

O ocidente em geral e a França em particular esqueceram aqueles povos durante décadas, sob ditaduras na Tunísia, no Egito e na Líbia, antes de porem-se a entoar loas a “revoluções”, à “primavera árabe” e à liberdade. Na Líbia, a intervenção humanitária encobriu aspectos sombrios, odores de interesses petroleiros e econômicos mal dissimulados, quando não declarados.

Poucos meses adiante, a França intervém no Norte do Mali para o bem do povo, com a única intenção declarada de proteger aquele país “amigo” do perigo dos extremistas aliados a rebeldes tuaregues. É o que dizem. Em todas as exposições políticas e midiáticas dos fatos, faltam dados econômicos e geoestratégicos – o que é grave. Nada se diz da história longa, nem da história recente, das alianças da França com vários e sucessivos governos do Mali. Tudo se passa como se a França não fizesse outra coisa além de exprimir solidariedades políticas gratuitas aos povos, generosamente, sem outra intenção ou projeto.

De fato, nos bastidores dos recentes tumultos políticos jamais deixou de haver o dedo da França, que interveio, que pressionou, que descartou os atores malineses que a perturbavam (fossem políticos ou militares), que fez alianças úteis, que participou de reuniões do governo e também de reuniões em territórios tribais, em espaços civis e militares. Amadou Toumani Touré, derrubado por um golpe de Estado dia 22/3/2012, foi enormemente fragilizado e acabou isolado após a queda do coronel Kadafi.

Parece ter pago o preço político que lhe foi imposto por suas políticas favoráveis ao Norte e por suas ideias sobre a atribuição de futuros mercados de exploração do petróleo. Os laços (várias vezes difíceis) entre a França e a organização separatista “Movimento Nacional para a Libertação do Azawad” (MNLA) não são segredo; aqueles laços levaram a que se instalasse uma fratura entre o sul e o norte do Mali, bem útil para os que se programavam para explorar riquezas minerais muito promissoras. A presença da Al-Qaeda no Magreb Islâmico e a aliança que fez com as tribos tuaregues no Norte são já há três anos, e ainda mais agora, como se vê, fatores que explicam também, mas nada explicam sozinhos, a presença militar francesa na região – a qual foi afinal oficializada depois de declarada “a guerra”, há poucos dias.

O governo francês e os executivos da transnacionais de petróleo e gás sempre minimizaram o mais possível as descobertas de recursos minerais na região do Sahel entre a Mauritânia, o Mali, o Niger e a Argélia. Em certo momento, falou-se de um “milagre malinês”. Mas fato é que os dados são bem mais conhecidos e comprovados do que fazem crer as “declarações”.

Jean François Arrighi de Casanova, diretor da Total francesa para o norte da África, não hesitou em falar de “um novo Eldorado”, ante a descoberta de gigantescas jazidas de petróleo e gás. Há naquela área nada menos que cinco bacias muito promissoras. A bacia de Touadenni, na fronteira com a Mauritânia, já revelou a importância de seus recursos. A essa se acrescentam as bacias de Tamesna e de Lullemeden (na fronteira com o Niger), a bacia de Nara (perto de Mopti) e a bacia de Gao.

A Autoridade para Pesquisa de Petróleo [orig. Autorité pour la Recherche Pétrolière (AUREP)] confirma o potencial do subsolo do norte do Mali (essencialmente, são reservas de gás e petróleo). O Mali, a Mauritânia, a Argélia e o Niger são os primeiros afetados e – com a queda do coronel Kadafi – as perspectivas de exploração abriram-se para empresas francesas (à frente delas, a Total), italianas (ENI) e argelinas (Sipex, filial de Sonatrach) que já investiram mais de 100 milhões de dólares (segundo estimativas) em estudos e sondagens, apesar das dificuldades devidas à aridez da região e à segurança precária.

O amigo povo malinês vale bem que a França o defenda, seu sangue, sua liberdade e sua dignidade, sobretudo se se sabe que, acessoriamente, o trabalho implicará farta sobremesa em gás e petróleo. Os recursos minerais do norte do Mali não são fantasia, nem são miragem. Miragem é, isso sim, a descolonização.

Ninguém pode negar a existência de grupos extremistas violentos e radicalizados que constroem e disseminam compreensão pervertida e inaceitável do Islã. É verdade e já o dissemos: é necessário condená-los. É preciso ver e mostrar que esses grupos adotam estratégias políticas contraditórias, além da muito suspeita tendência a aparecerem e se instalarem exatamente onde haja recursos minerais em disputa. Lá estavam, no Afeganistão (numa área imensamente rica de petróleo, gás, ouro, lítio...) e agora, outra vez... Não se entende por que os “loucos” extremistas aparecem agora instalados no Sahel malinês, para ali aplicar sua “xaria” desumana e tão pouco islâmica. No Sahel desértico!

É preciso dizer e repetir, para que não reste qualquer dúvida. Não se contesta que esses grupúsculos de islamistas existam. Mas é preciso explicar inúmeros detalhes de como seus grupos podem ter sido infiltrados (os serviços de informação USAmericanos, e também os europeus, já admitiram o uso de táticas de infiltração e de agentes provocadores ou instigadores). Os pontos onde os grupos islamistas instalaram-se e seus métodos de operação podem bem ter sido orientados, induzidos. Já se viu acontecer durante o governo de George W.Bush, vê-se agora outra vez no Mali, o quanto “terroristas” podem ser úteis.

Um chefe malinês falou de seus problemas, em nossa mais recente visita à região: “Temos ordem de exterminá-los, de destruí-los, mesmo que estejam desarmados. Não fazer prisioneiros! Fazemos de tudo para enlouquecê-los e empurrá-los para o radicalismo”. Espantosa estratégia de guerra!

O jornal Le Canard Enchaîné noticia que o aliado francês, o Qatar, teria assinado um acordo com a empresa Total – para as explorações no Sahel – e, paradoxalmente, daria também apoio logístico e financeiro a grupos radicais, como os “insurgentes do MNLA (independentistas e laicos) e os movimentos Ansar Dine, AQIM e MUJAO”. Caso tudo isso seja comprovado... haveria aí alguma contradição descabida? Ou seria modo de estimular a ação dos pirômanos extremistas, até o ponto em que se torne necessário, urgente, inadiável chamar os bombeiros (franceses)?

Uma divisão de funções, tão eficaz quanto cínica.

O mundo observa, e a recente captura de reféns na Argélia mobilizará ainda mais fortemente sentimentos nacionais em apoio à operação militar. Reféns americanos, ingleses, noruegueses, etc. e tudo em solo da Argélia: o contexto extravasa da França. O povo do Mali rejubila-se, na maioria, muitos não são ingênuos: a França amiga é mais amiga sempre de seus interesses; e o seu modo de intervir seletivamente (na Líbia ou no Mali, mas não na Síria ou na Palestina) nada tem de novidade. A política enviesada da “France-Afrique” acabou, nos dizem, e as colonizações políticas e/ou econômicas já são cinza; raiou a liberdade; “soou a hora da dignidade das nações e da democracia”! É indispensável, pois, aderir beatamente a essa hipocrisia generalizada.

É preciso denunciar os extremismos, condenar ações extremistas e a instrumentalização da religião e das culturas, mas chega afinal o dia quando se tem também de olhar cara a cara as responsabilidades. Olhar cara a cara a responsabilidade dos Estados africanos e árabes que esquecem os princípios elementares da autonomia e da responsabilidade política (além do respeito e da dignidade de seus povos). Olhar cara a cara as elites africanas e árabes, e nós todos, que somos tão altamente incapazes de propor uma visão clara da independência política, econômica e cultural. Olhar cara a cara os povos que se deixam arrastar por emoções populares e miragens de “potências amigas”. Olhar cara a cara nós mesmos, todos, políticos, intelectuais e cidadãos preocupados com manter a dignidade e a justiça nos países do Sul. É preciso olhar firmemente o espelho da nossa responsabilidade decisiva quanto ao que se passa sob nossos olhos.

A “destruição” dos extremistas jihadistas do norte do Mali não é nem promessa, nem garantia de liberdade para o povo do Mali; é, isso sim, no longo prazo, uma forma, sofisticada, de nova alienação. Contudo, nunca como hoje as forças de resistência dos países do “Sul Global” (com os movimentos políticos e engajados do norte), nunca como hoje, dizíamos, essas forças encontraram melhor oportunidade para abrir novos horizontes e abrir novas trilhas da direção da própria liberdade.

Nada se vê hoje além dessa euforia, a celebração, ou então o silêncio, a ação libertadora da França e da “comunidade internacional” que unanimemente apoia a França. Como se o Oriente Médio e a África tivessem aceito ser submissos ante os últimos cartuchos lançados por esse ocidente que agoniza, ferido por suas dívidas, suas dúvidas e as crises econômicas, políticas e identitárias que o atravessam.

O melhor serviço que a África pode prestar a ela mesma, e ao ocidente, é não curvar-se à nostalgia e aos delírios de poder do ocidente, mas resistir-lhes com dignidade, com coerência, em nome dos valores que o próprio ocidente e a própria França defendem quase tanto quanto traem, diariamente, sob o peso de suas políticas de mentira e hipocrisia, na América Latina, na África, como na Ásia.

O norte do Mali é revelador. Ali se vê em ação o que mais medo nos deve causar: um povo que canta sua liberdade política à qual aparece associado um novo desenvolvimento econômico. E há políticos ou intelectuais africanos ou árabes que aplaudem o que veem (conscientes ou inconscientes, ingênuos, arrivistas ou interesseiros).

A hipocrisia e a covardia dos interesseiros espelha a hipocrisia e a manipulação das “grandes potências”.
*via 'redecastorphoto', com tradução do coletivo Vila Vudu

Leia também:
Não à intervenção colonial no Mali

segunda-feira, 21 de janeiro de 2013

Não à intervenção colonial no Mali


A França abusa do imperialismo mais desenfreado. Após realizar com os britânicos o massacre 'terceirizado' - e regado a bombas de urânio empobrecido - à Líbia de Kadafi em 2011, agora volta sua artilharia contra o Mali. Está prestes a fazer o mesmo com a Argélia. Para proteger interesses de seu país no noroeste africano, sobretudo ativos ambientais e commodities explorados por multinacionais francesas nas ex-colônias, o presidente François Hollande não poupa esforços e tem com isso garantido alta aprovação de seu eleitorado, o mesmo que meses após levá-lo ao Palácio do Eliseu (maio de 2012) demonstrava crescente insatisfação com o governo. Para atacar e invadir o Mali, Hollande tem contado com a preciosa ajuda da Itália do eterno 'premiê interino' Mario Monti.

O secretário de Relações Internacionais do Partido dos Comunistas Italianos (PdCI), Fausto Sorini, distribuiu nota repudiando a intervenção colonial francesa no Mali e o envolvimento da Itália nessa ação de guerra.


Via Rede Democrática*

"Somos totalmente contrários à intervenção militar francesa no Mali e à decisão do governo italiano de dar apoio “logístico” às operações bélicas e ao envio de militares ao terreno. 

A decisão assumida pelo presidente “socialista” Hollande (que tinha avalizado a decisão de Sarkozy de fazer a guera contra a Líbia) se alinha com as tradições de intervencionismo neoimperialista das classes dominantes francesas e desmente uma vocação progressista que de maneira muito apressada e incauta foi-lhe atribuída por amplos setores da esquerda italiana e europeia.

Associamo-nos à crítica clara feita ao presidente Hollande pelos comunistas franceses e pela Frente de Esquerda. A intervenção militar francesa não corresponde de nenhum modo à orientação do Conselho de Segurança da ONU e se destina a estender, e não resolver, as agudas contradições e a conflitualidade política de que a região é um ponto culminante (como se vê pelos enfrentamentos militares que também estão ligados à captura de centenas de reféns e ao massacre que se seguiu: o episódio que já envolveu a Argélia, agora com o risco de estender-se a outros países circunvizinhos, como o Niger).

O Mali é objeto de uma guerra civil onde, ao Norte do país, atuam componentes islâmcos radicais, que são uma consequência da desestabilização regional provocada pela guera contra a Líbia de Kadaff, e que foram alimentados pelo recente golpe no Mali que dividiu o país e radicalizou as facções em luta.

Nesta situação, a ONU autorizou uma intervenção pacificadora de capacetes azuis compostos exclusivamente de contingentes interafricanos; ao contrário, a intervenção unilateral francesa – que já recebeu o apoio da OTAN – se insere arbitrariamente em tal contexto com finalidades meramente neocoloniais, a retomada do controle da região e das riquezas (ouro, pedras preciosas, petróleo, urânio) de que o Mali é ditado.

O ex-presidente francês gaulista Valéry Giscard d'Estaing, em uma entrevista concedida em 13 de janeiro ao Le Monde, denuncia os riscos da intervenção e afirma que quer “pôr-se em guarda contra uma evolução da ação francesa no Mali, que seria de tipo neocolonialista”. Também os principais jornais argelinos acusam Hollande de reacender antigas veleidades coloniais da França.

A decisão do governo italiano de dar apoio político e militar “logístico” à intervenção francesa – governo demissionário que deveria estar encarregado apenas da administração! - viola o artigo 11º da Constituição, que repudia a guerra como instrumento de solução das controvérsias internacionais. É grave que não só o Pólo da Liberdade [direita] e o polo centrista, mas também a direção do Partido Democrático [centro-esquerda] – consultados por Monti [primeiro-ministro demissionário] – tenha avalizado a escolha do governo, enquanto não se vê até agora nenhuma dissociação clara em relação a Grillo [ministro das relações Exteriores].

Um motivo a mais para convencer a opinião pública que se inspira nos valores da paz da nossa Constituição de quanto é importante dar força política – e uma consistente presença no Parlamento – às forças comunistas, de esquerda e democráticas que hoje se agrupam na chapa de Ingroia. Esta lista eleitoral deverá, a partir deste acontecimento, dar impulso a uma consolidação política e programática à própria orientação contrária à guerra e por uma política externa de paz na Itália, no espírito e na lera da nossa Constituição."
*traduzido do italiano pela redação do Vermelho

Relacionadas:
-Conselho Mundial da Paz: Repúdio à intervenção militar francesa no Mali
-Argélia: Paris diz que sequestro em campo de gás foi 'ato de guerra'
-Operação francesa no Mali marca virada na presidência de Hollande

domingo, 16 de dezembro de 2012

Voltei e o Anti-Consenso de Washington

[Nosso entendimento é que esse discurso de Lula, adiante comentado por André Singer, não está desassociado d'O Anti-Consenso de Washington'uma "nota conjunta histórica, encabeçada por Lula e pelo presidente francês François Hollande. Nela, convocam-se instituições, fundações e demais entidades ligadas à social-democracia para definir um novo modelo de governança global, baseado na experiência brasileira pós-crise de 2008."

Esta é a razão de os publicarmos juntos, pois acreditamos que qualquer análise que se faça sobre a possibilidade de inserção da perspectiva da volta de Lula ao universo da política brasileira precisará transcender nossas fronteiras e situá-la automaticamente em uma nova perspectiva, desta vez mais ampla, na medida do seu alcance internacional.

É, portanto, à luz da complementariedade que entendemos estar contida nesses dois textos que formulamos um convite especial à leitura e reflexão dos nossos leitores.
(Equipe Educom)]


15/12/2012 - André Singer (*)
- Folha de São Paulo - Colunistas - UOL

O discurso de Lula anteontem [12/12] em Paris deve ser lido com atenção.
Não só porque foi mencionada a chance de nova candidatura, o que lhe dá sabor histórico.

Quiçá, no futuro, o cabalístico 12/12/12 fique como o dia da célebre entrevista em que Getúlio anunciou a Wainer: "Eu voltarei".



Para os que buscam sinais, aliás, convém anotar outras passagens. A certa altura, o antigo mandatário deixa escapar: "Se é verdade o número que o meu ministro da Economia falou na hora do almoço...". Adiante, afirma aguardar que "a gente consiga fazer um acordo mais razoável" na conferência do clima prevista para se dar em Paris em 2015.

Já quase ao final, solta o seguinte: "Espero que os presidentes das Repúblicas não se reúnam mais para discutir crise. Nós temos que discutir soluções".

Os indícios esotéricos espalhados em uma hora e 20 minutos de duração não constituem, contudo, os elementos centrais do pronunciamento.

Se o ex-metalúrgico será ou não candidato em 2014, depende de fatores cujo controle escapa a qualquer um. Interessa a disposição atual do personagem e, acima de tudo, o programa com que sobe ao palanque.

O orador fez, com voz firme, diagnóstico amplo da crise econômica mundial e dos consequentes desafios postos aos homens e mulheres de Estado no início do século 21.

Os ouvintes que se deixarem levar pela forma - a aparência simples dos enunciados - perderão a abrangência do raciocínio, concorde-se com ele ou não.

Para Lula, os impasses chegaram a tal ponto que ou a política reassume o comando para preservar os avanços obtidos depois da Segunda Guerra Mundial ou caminharemos para o pior.

Comparando a situação europeia - epicentro de processo regressivo mais geral - a um paciente com a perna já amputada, disse que "se demorar mais um pouco, poderá morrer".

Mas diante de quadro tão grave, o que impede os Estados de agirem para interromper a gangrena, salvando o bem-estar social e devolvendo perspectivas de desenvolvimento para o conjunto da humanidade?

Quem são os tão poderosos inimigos da raça humana?

Aí a surpresa. Refratário, em condições normais, a nomear adversários, o ex-presidente, nas derradeiras frases, decidiu colocar pingos nos "is".

"Essa crise é da responsabilidade de pessoas que nós nem conhecemos porque, quando o político é denunciado, a cara dele sai de manhã, de tarde e de noite no jornal.

"Que paguem os bancos, não os povos"
Vocês já viram a cara de algum banqueiro no jornal?"

Acaso fosse necessária indicação adicional sobre como, na visão de Lula, estariam relacionadas a esfera global e as acusações de corrupção no Brasil, fez questão de arrematar: rosto de banqueiro não aparece "porque é ele que paga a propaganda".

(*) André Singer é cientista político e professor da USP, onde se formou em ciências sociais e jornalismo. Foi porta-voz e secretário de Imprensa da Presidência no governo Lula.

Fonte:
http://www1.folha.uol.com.br/colunas/andresinger/1201658-voltei.shtml

Nota:
A inserção das imagens, quase todas capturadas do Google Images, são de nossa responsabilidade e, excetuando uma ou outra, não constam do texto original.


**********************************
14/12/2012 - O Anti-Consenso de Washington - por Castor Filho
- Anti-Consenso de Washington - Coluna Econômica Nassif 

Antes de ontem, em reunião conjunto do Instituto Lula com a Fundação Jean Jaurès, do Partido Socialista francês, foi divulgada uma nota conjunta histórica, encabeçada por Lula e pelo presidente francês François Hollande.

Nela, convocam-se instituições, fundações e demais entidades ligadas à social-democracia para definir um novo modelo de governança global, baseado na experiência brasileira pós-crise de 2008.

**********************

Entenda melhor o alcance desse manifesto.
Desde a Revolução Industrial inglesa, duas linhas de pensamento dominaram as discussões sobre políticas econômicas nacionais.

Uma delas, internacionalista, defendia o primado do mercado, limitava as ações regulatórias e reduzia o grau de intervenção das políticas nacionais.

Crescia em períodos de esgotamento dos modelos nacionais, acumulava forças, sobrepunha-se a toda forma de regulação, privilegiava o livre fluxo de capitais e, depois, esgotava-se em seus próprios exageros, imersas em grandes crises globais.

A segunda, nacionalista, impunha controles aos capitais, práticas protecionistas, graus crescentes de intervenção estatal e, assim como a primeira escola, acabava se esgotando nos seus próprios excessos de intervencionismo.

De certo modo, desde o século 19 a economia mundial capitalista oscila entre esses dois extremos.

***********************

Os modelos de intervenção do Estado assumiram um caráter desenvolvimentista nos países do terceiro mundo e um caráter social nos países desenvolvidos. Nesse segundo grupo gerou a social democracia europeia, responsável pelo avanço do chamado estado do bem estar social.

**********************

Do pós-Guerra até os anos 60 vigorou a linha mais intervencionista. No plano global, foi o período de predominância das grandes instituições multilaterais - FMI, Banco Mundial, BIRD -, do controle de capitais e das oscilações cambiais.

De 1972 em diante - quando o presidente norte-americano Richard Nixon desvinculou o dólar do ouro - predominou um período de gradativa liberalização financeira. No início dos anos 90, um documento denominado de "Consenso de Washington" sugeriu as linhas básicas de política econômica a serem adotadas pelos diversos países que pretendessem se integrar à globalização.

Através de Fernando Henrique Cardoso, o Brasil foi um seguidor religioso do receituário, deixando de lado investimentos públicos e políticas sociais para se concentrar exclusivamente na criação de um ambiente propício ao grande capital. Supunha-se que, atendidas suas exigências, o desenvolvimento viesse automaticamente.

Essa ilusão atravessou os dois governos FHC e o governo Lula até a grande crise de 2008.

***********************

De lá para cá, houve mudanças gradativas na política econômica interna. Constatou-se que políticas sociais, em vez de passivo, tornou-se um enorme ativo nacional, na medida em que gerou um mercado de consumo dinâmico. Em todas as crises do governo FHC, a reação automática era a de um pesado pacote fiscal que aprofundava ainda mais a crise.

Nesse mesmo período, a Europa se afundou na maior crise desde a Segunda Guerra, fruto de políticas econômicas ortodoxas. Pior: iniciou o desmonte do seu estado de bem-estar, um dos grandes avanços civilizatórios do século.

***********************

É nesse quadro que se situa o manifesto, em cima de grandes forças globais atrás de um discurso que unifique as ações e permita a superação do modelo e da crise atuais.

As virtudes da globalização
Começa pelo reconhecimento da inevitabilidade da globalização: "A globalização é um imenso desafio com o qual se confronta a humanidade. Ela tem um poder formidável de mudança para todas as sociedades: a mudança econômica, com a intensificação das trocas; a mudança cultural, pois essas trocas possibilitam a circulação de ideias e a transformação das práticas culturais e de costumes; a mudança política".

Os problemas da globalização
Depois, aponta os problemas atuais: "A globalização, da forma que ocorre atualmente, está longe de satisfazer as aspirações que legitimamente suscita. A crise econômica internacional agrava a concorrência entre os países e as sociedades. Ela atinge os mais vulneráveis, particularmente os trabalhadores e os jovens. (...) Ela conduz governos a adiar as decisões necessárias para prevenir o aquecimento global".

As críticas às políticas de austeridade
Depois, uma crítica às políticas de austeridade adotadas pela União Europeia: "Isoladas, (...)  mostraram seus limites para encontrar a saída da crise.

A retomada ainda não esta garantida, ao mesmo tempo em que os direitos econômicos e sociais estão ameaçados. É imprescindível que sejam adotadas políticas de crescimento. Somente assim a globalização poderá garantir o respeito à coesão social e ao meio ambiente".

A nova governança
A defesa da nova governança: "Uma nova governança é necessária para regular os conflitos entre as nações e garantir a paz e, de outro, permitir que cada nação realize o modelo de sociedade que escolheu. Os poderes públicos devem garantir que todos tenham oportunidades de desenvolver suas capacidades individuais. Devem também trabalhar em prol da perenidade do meio ambiente para as gerações futuras.

Novo mundo em marcha
Depois, aponta as mudanças em curso: "A sociedade civil mundial se tornou uma realidade tangível. Políticas públicas inovadoras e outros modos de governar surgem em todos os continentes, particularmente nos países emergentes e em desenvolvimento. As instâncias multilaterais também estão se reconfigurando. A constituição do G20 reflete a mudança dos equilíbrios mundiais, mas seu impacto ainda limitado ilustra a dificuldade dos governos de chegarem a um acordo e de agir de forma concreta".

A conclamação
Finalmente a conclamação: "Os riscos que atualmente ameaçam a humanidade são grandes demais para nos focarmos apenas em uma gestão de curto prazo. Fazemos uma conclamação em defesa da confiança na capacidade humana de se reinventar e do poder criador de nossa sociedade-mundo, para sair definitivamente da crise e construir as bases de um futuro harmonioso que possa ser compartilhado por todos"

Fonte:
http://blogoosfero.cc/castorphoto/blog/o-anti-consenso-de-washington.

Blog: www.luisnassif.com.br

"Todos os direitos reservados, sendo proibida a reprodução total ou parcial por meio impresso"