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sábado, 21 de dezembro de 2013

Indigestão ambiental na escola de Gestão Ambiental da USP

18/12/2013 - por Juliana Guarexick, da Envolverde

Infestação por ratos, ácaros de pombos e contaminação da água causaram mais uma interrupção das atividades acadêmicas no Campus Leste da Universidade de São Paulo (USP) desde a segunda-feira, (16).

Ironicamente, os problemas ambientais se intensificam na unidade que concentra o curso de gestão ambiental da mais importante universidade da América Latina.

Alunos, professores e funcionários marcam ato de protesto em frente à Reitoria nesta quinta-feira (19) às 17 horas (Marcelo Camargo/ABR)

Alunos, funcionários e professores já haviam feito, em setembro, uma greve que durou 50 dias, para exigir medidas saneadoras da direção da Escola de Artes, Ciências e Humanidades (EACH), que em 2 de agosto foi advertida pela Companhia de Tecnologia de Saneamento Ambiental (Cetesb) de que deveria cumprir exigências para descontaminação do solo do campus e afastar o risco de explosão.

Os prazos para atendimento de todas as exigências da Cetesb é abril de 2014. Porém, a companhia exige que algumas etapas sejam concluídas até o final de dezembro, como por exemplo “a definição sobre a implantação dos sistemas de extração de gases e a finalização das investigações do solo contaminado”.

Além disso, a Cetesb adverte que “não serão autorizadas quaisquer intervenções nos solos, ou nas águas subterrâneas, na área do campus da EACH, até que um estudo de investigação ambiental e um plano de intervenção tenham sido aprovados pela companhia”.

No e-mail dirigido aos alunos, professores e funcionários para comunicar a suspensão das atividades acadêmicas, o vice-diretor no exercício da direção da EACH, Edson Leite [foto-D], informou que já foram iniciadas as providências para saneamento das instalações de água, com a limpeza dos reservatórios, dedetização e desratização geral do campus e troca de filtros dos bebedouros.

Quanto aos ácaros, estava prevista para ontem (17) uma inspeção detalhada em todas as instalações da unidade para planejar as ações necessárias.

Riscos à saúde
No final de novembro, o Ministério Público Estadual (MPE) entrou com uma ação civil pública solicitando a suspensão das aulas e a interrupção das obras de ampliação no Campus Leste.

O detalhamento dos riscos à saúde e dos problemas ambientais também estão entre as demandas do MPE.

Apesar de admitir que a água do subsolo está contaminada em diversos pontos do campus, a direção publicou no site da EACH que “estudos apontam a inexistência de riscos atuais aos trabalhadores e estudantes do campus, desde que não haja ingestão de água do subsolo”.

Afirma também que “não existe nenhuma relação do gás metano com a água fornecida pela Sabesp ou com a água de reúso do Campus USP Leste”. Os detalhes sobre a segurança ambiental do campus podem ser acessados aqui.

O terreno, cedido pelo governo do Estado de São Paulo, já funcionou como aterro de dejetos do Rio Tietê.

Com o passar do tempo, o material decomposto começou a emitir gás metano. Segundo a Cetesb, esse contaminante é tóxico e pode até ser explosivo.

Parecer técnico elaborado por professores de Avaliação de Impacto Ambiental e de Gestão de Recursos Hídricos da EACH ressalta, porém, que “o risco à saúde humana é um risco crônico que somente irá se manifestar depois de algum tempo”. Veja o documento completo aqui.

Campus da USP Leste, em Ermelino Matarazzo. Foto: Divulgação

O buraco é fundo
Nós estamos mergulhados no caos. O cenário na EACH é uma fratura exposta da USP”, disse à Envolverde o professor de Gestão de Políticas Públicas da unidade, Marcelo Nerling [foto], ao relatar que a situação no campus não se restringe aos problemas ambientais.

“Há prática de abuso de autoridade, constrangimento de professores e incapacidade de ampliação do espaço físico.”

Nerling diz que a gestão do campus, atualmente sob responsabilidade do vice-diretor Edson Leite, é parte de “um jogo de ‘faz de contas’ com o diretor José Jorge Boueri Filho, afastado do cargo em 13 de setembro por decisão de reunião aberta da Congregação da USP Leste”.

Boueri foi afastado temporariamente em consequência do despejo de terra de origem desconhecida no campo central, em 2011.

O afastamento definitivo deve ser oficializado em novo encontro da congregação.

Até agora nenhuma reunião foi marcada e o poder concentra-se 
nas mãos de Leite, que não tem capacidade nem legitimidade para funcionários, professores e alunos”, diz o professor Nerling.

Todos esses fatores, segundo ele, compõem “um quadro comprometedor da qualidade de ensino”.

Ato por respeito à EACH
A interrupção das aulas ocorre justamente no período de finalização do semestre, já atrasado para reposição dos dias da greve que se estendeu até o dia 29 de outubro.

Alguns alunos faziam provas, outros teriam trabalhos e outros ainda tinham aulas”, explicou à Envolverde Augusto Amado, aluno do 5° ano de gestão ambiental.

Segundo ele, “estava marcada para quinta-feira uma cervejada de fim de ano”, mas a confraternização vai ser substituída por um ato em frente à reitoria da USP Butantã às 17 horas – no mesmo dia da eleição do novo reitor da Universidade.

Até o fechamento desta matéria, mais de 670 pessoas já tinham confirmando presença na página do evento no Facebook.

Procurada pela Envolverde para se manifestar sobre o assunto, a direção da EACH informou por e-mail que “estará em recesso entre os dias 18 de dezembro e 3 de janeiro de 2014. As atividades serão retomadas no dia 6 de janeiro de 2014 (segunda-feira)”.

* Edição:
Sávio de Tarso - Envolverde

Fonte:
http://envolverde.com.br/noticias/indigestao-ambiental-na-escola-de-gestao-ambiental-da-usp/

domingo, 11 de agosto de 2013

"EU NÃO. EU SOU DEUS"




Laerte Braga



Quando o ex-presidente Fernando Henrique diz que “o PSDB não é farinha do mesmo saco”, não estava querendo defender o partido. Isso é o que pode parece à primeira vista. Estava defendendo a si, largando os “amigos” (não tem, tem cumplices) na chuva e cuidando de sua própria pele.

É deus, privatizou o mundo em seis dias e depois foi a Camp David passar o sétimo com Bil Clinton onde recebeu a mala pelos serviços prestados.

O que está dizendo é que não o confundam com Serra, com Alkmin, com Aécio, com Álvaro Dias, com Portelinha, Azeredo e toda a corja. Ele não. É deus e está acima do bem e do mal. O que fez não importa se eivado de corrupção, importa que ele é “deus”.

Parênteses.

No caso de Aécio estar no PSDB é falta de vergonha na cara, ou já está num estado de depauperação mental irrecuperável. Tancredo tinha horror de FHC.

Fernando Henrique percebeu a gravidade do caso do metrô paulista e sente o cheiro da podridão que exala da REDE GLOBO, donde podem surgir segredos aterradores do seu governo, falo da sonegação fiscal de 600 milhões.

A GLOBO sempre foi fétida, só que agora o cheiro está chegando com insuportável odor às ruas.

São as duas grandes questões pontuais que vive o País nesse momento e são elas que devem fazer parte de qualquer bandeira de protesto, onde quer que se vá. no território nacional, ao lado das grandes causas,  a Constituinte Popular, por exemplo. São produtos da podridão e da falência do Estado desde a época da ditadura militar.

Um corpo corroído muito mais pelos corruptores, principais acionistas desse Estado (bancos, grandes empresas, latifúndio, templários evangélicos, que pela corrupção, que é consequência (a bancada evangélica é uma espécie de ordem dos templários da Idade Média, mas caricata, latifúndios são pistoleiros do velho oeste e banqueiros e grandes empresários são a OPUS DEI).

O sistema político eleitoral brasileiro permite que os corruptores elejam e mantenham a maioria das casas legislativas, prefeituras, esse adereço desnecessário câmaras municipais, governos estaduais, assembleias e as duas casas legislativas nacionais, uma delas a chamada representação popular, a Câmara dos Deputados e a outra, outro adereço desnecessário, o Senado, representação dos estados de uma federação que não existe exceto no papel.

 Nosso sistema judiciário é uma teia de não resolve nada e isso é proposital. Quem vai ter peito de encarar o mea culpa no erro do “mensalão? Todo o arcabouço do Estado brasileiro guarda consigo “preciosidades” do Brasil colônia, do Brasil império e das várias “repúblicas” que tivemos ao longo de nossa História, mas sempre sob o controle das elites econômicas. O caráter democrático,  que é também o caráter humano que deveria prevalecer não existe.

E aí, entra FHC, como entra o grupo GLOBO, como entram os que compram e se beneficiam do que na verdade é a diferença de classes, que por sua vez nos remete à luta de classes, necessária e fundamental para a construção de um Estado democrático. Aquele em que o trabalhador decide ao invés de ser alvo de gás lacrimogênio ou gás de pimenta, além da borduna da excrescência Policia Militar, outra “preciosidade” que trouxeram de antanhos.

Neste momento temos o que se chama de “condições objetivas” para buscar mudanças estruturais indispensáveis, a não ser que queiramos aceitar o papel de zumbis em função dos interesses dos donos. Não mudanças totais, plenas, mas portas para a construção de um futuro socialista.

No Brasil e em quase todos os países, há um problema complicado. Classe média. Come arroz e feijão, deve horrores ao banco para ter carro do ano e arrota maionese. Pior, lê VEJA e acha que o JORNAL NACIONAL é o ponto de referência da verdade absoluta. Extasia-se com o ET de Varginha.

No caso específico de FHC um safardana de grande porte, amoral, logo destituído de qualquer principio e que em sua versão fumante de charuto cubano acredita que tudo é obra dele.

E que numa frase, como a que disse, falou para fora uma coisa, falou para dentro outra coisa, até porque se chegarem a ele respingos desse processo do metrô, da GLOBO, o risco de retaliação é imenso. É detentor de segredos desde alcovas a gabinetes escuros e sombrios como aqueles que Drácula usa e não vai ter escrúpulos em esgrimá-los a seu favor.

É característica do amoral.

Foi o que ele quis dizer.

“EU NÃO. EU SOU DEUS”.

O PSDB não é farinha do mesmo saco só, é um tipo de farinha predadora e que ao invés de alimentar devora.


Publicado orignalmente no Site Redecastorphoto.

sexta-feira, 28 de junho de 2013

Desmilitarização da polícia, a pauta urgente

ECOS DO PROTESTO

Por Sylvia Debossan Moretzsohn* em 27/06/2013 na edição 752 do Observatório da Imprensa

   
A truculência na repressão indiscriminada e gratuita a manifestantes que participaram de várias das passeatas nos últimos dias, desde a quinta-feira sangrenta (13/6) na Avenida Paulista, impôs a urgência de uma velha demanda: a desmilitarização das polícias e a discussão sobre o papel dessa instituição num Estado democrático.

A indignação contra a violência policial se espalhou imediatamente nas redes sociais, muitas vezes acompanhada de vídeos incontestáveis: soldados lançando bombas de gás e disparando balas de borracha contra pessoas que esperavam a abertura dos portões do metrô para voltar para casa, ou estavam em bares, ou observavam o movimento e levantavam as mãos, encurraladas pela polícia.

A avalanche de denúncias, entretanto, animou muita gente a lembrar um detalhe essencial, que teve o poder de síntese de um slogan: na favela, as balas não são de borracha. Noutras palavras: os que sentiram agora o peso das forças da ordem precisam acordar para a gravidade do que ocorre cotidianamente na periferia social.

A propósito, o site da ONG Justiça Global resume, no início do artigo em que defende a desmilitarização das polícias: “A polícia que reprime as manifestações é a mesma que executa pessoas nas favelas e periferias e a mesma que implanta nos morros as Unidades de Polícia Pacificadora (UPPs)” (íntegra aqui).

O exemplo mais recente veio agora mesmo, na segunda-feira (24/6): no início da tarde, uma pequena manifestação de jovens na Praça das Nações, em Bonsucesso, no Rio, convocada pelo Facebook, levou a PM a mobilizar, segundo O Globo, “250 homens e até um blindado”, o famoso “caveirão”, para “garantir a segurança e coibir saques”. No início da noite, teria havido um início de arrastão e, para perseguir os bandidos, os policiais iniciaram uma “operação” nas favelas do chamado Complexo da Maré. Resultado: um morador morto, logo depois um sargento do Bope e, em seguida, a chacina. Total oficialmente reconhecido até quarta-feira (26/7): nove mortos.

A palavra de ordem pela desmilitarização da polícia ressurgiu com força depois disso: na manhã da quarta-feira, estava nos precários cartazes de papelão presos nas grades do prédio da Secretaria de Segurança, onde um grupo de moradores se reuniu para protestar. E foi incorporada pelos que se mobilizam para a passeata marcada para quinta-feira (27), no Centro do Rio.

Os métodos da polícia

Quem participou dos protestos no Rio de Janeiro pôde conhecer, se já não sabia, os métodos da repressão. No dia 17/6, incapaz de cercar e conter os que depredavam a Assembleia Legislativa, policiais começaram a prender indiscriminadamente pessoas que apenas assistiam ou documentavam o ato: a maioria jovens universitários, mas também um morador de rua. “Algumas mochilas foram retidas, mochilas que depois apareceram, na delegacia, com pedras e outras coisas que foram colocadas lá como provas”, anotou Carmen Astrid, uma das presas. Filha de exilados políticos chilenos, ela não se dizia surpresa, apenas não entendia qual era a acusação: “Me sentia no Processo de Kafka. Se um policial diz que você fez algo, é a palavra dele que vale”.

Dias depois, na entrevista coletiva de que participou, após a soltura dos jovens, o fundador da ONG Rio da Paz, cujo filho também tinha sido preso, declarou:

“Eu me senti negro, pobre, morador de favela, numa viela escura de uma comunidade pobre. Porque, ao pedir informação para o policial, era como se eu estivesse falando com um androide. Com uma estátua de mármore, com um boneco de gesso. Nenhuma explicação, nenhuma justificativa”.

Na passeata do dia 20/6, foi ainda pior: depois do início do confronto, na frente do prédio da prefeitura do Rio, grupos de vândalos saíram quebrando vidraças, postes, sinais de trânsito, destruindo ônibus, tocando fogo nas ruas. A polícia, entretanto, investiu em quem nada tinha a ver com isso. Muitos procuraram abrigo em dois prédios da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ) que funcionam no Centro – a Faculdade de Direito e o Instituto de Filosofia e Ciências Sociais (IFCS) – e só conseguiram sair de lá em segurança muitas horas depois, após a intervenção da OAB e do Ministério da Justiça.

Pai de uma das jovens que estava no IFCS, o professor João Batista de Abreu relatou:

“Os que embarcariam no metrô foram orientados por advogados a não saltar na estação do Largo do Machado. Do lado de fora da estação, por volta de 21h, havia um cerco de 15 policiais fardados aguardando os que desembarcavam. Ao lado deles, três homens fortes, todos com cassetetes na mão, ameaçavam espancar os que saíssem correndo, no que eles considerassem atitude suspeita. Quando interpelados por uma senhora de 65 anos, começaram a destratá-la, dizendo que ela deveria estar em casa. Havia um forte sentimento de que eles tinham recebido carta branca para agir. O comentário geral é de que esses homens, à paisana e sem identificação, teriam sido contratados pela Companhia do Metrô para agredir os estudantes. Como não pertencem aos quadros do Metrô, seria mais fácil depois escondê-los”.

Pessoas que se reuniram em bares na Lapa foram agredidas. Jovens que aguardavam a abertura dos portões do metrô foram atacados, apesar dos pedidos de paz. Mais grave: a polícia chegou a disparar balas de borracha e bombas de gás contra o Hospital Souza Aguiar, para onde iam os feridos ou aqueles que tentavam fugir do caos.

A médica Daniela Judice, que trabalha ali, comentou:

“Meu plantão acaba às 20h. Tentávamos sair quando, de repente, gritaria e fumaça entrando pelo hospital. O gás pimenta subiu pelas escadas até alcançar a pediatria, no sétimo andar. Vários funcionários passaram mal. Mães e crianças aspirando aquele horror. No SÉTIMO andar! Nos isolamos no CTI. Conseguimos sair de lá às 22h15. Passo pela Presidente Vargas, que parecia vítima de um tornado”.

(Breve observação sobre o comportamento do maior telejornal do país, que no dia seguinte conseguia a proeza de veicular um compacto com uma seleção dos “melhores momentos” dos atos de vandalismo: quatro minutos de cenas de destruição, sem narração. Apenas no sábado (22/6), o Jornal Nacional abriu espaço para as denúncias que desde o início circulavam nas redes sociais, inclusive com vários vídeos sobre o descalabro da repressão policial. Ainda assim, a apresentação cercou-se da cautela do condicional: falava nos “abusos que teriam sido cometidos por policiais militares”, apesar das evidências).

O discurso terrorista e discriminatório

Ao analisar o comportamento da polícia no tumulto em frente à Assembleia Legislativa, diante de cenas em que um policial descarrega uma metralhadora para o alto, o comentarista do RJTV Rodrigo Pimentel, ex-membro do Bope – inspirador do “capitão Nascimento”, personagem do filme Tropa de Elite –, declarou: “Isso é desastroso, uma arma de guerra, uma arma de operação policial em favelas, não é uma arma pra ser usada no ambiente urbano...”.

Porque, como sabemos, favela não é ambiente urbano, é território livre para a barbárie.

Para quem tem alguma memória, Pimentel repetia então o raciocínio do secretário de Segurança Pública, José Mariano Beltrame, sobre uma operação policial na favela da Coreia, Zona Oeste do Rio, há alguns anos, quando traficantes que tentavam fugir foram mortos com tiros disparados de um helicóptero: “Um tiroteio na Coreia é uma coisa, em Copacabana é outra”.

O próprio Beltrame, na coletiva sobre os excessos policiais nas manifestações da semana passada, declarou, medindo as palavras: “De nada adianta demonizar a polícia. A polícia é a que o Estado brasileiro tem. Demonizar a polícia talvez seja benéfico para vândalo”.

O mesmo discurso terrorista de sempre, que silencia toda crítica, para afastar a hipótese de que essa crítica sirva ao “inimigo”. Quem não está conosco está contra nós.

A questão estrutural

Quando discursou em rede nacional na noite de sexta-feira (21/6), após os conflitos que marcaram os protestos ao longo da semana em todo o país, a presidente Dilma Rousseff fez o discurso da lei e da ordem: saudou o “vigor” das manifestações mas condenou enfaticamente os “arruaceiros”. Não deu uma palavra sobre a brutalidade policial, que foi flagrante e precisaria ser enfaticamente condenada por uma questão de princípio, embora, evidentemente, a administração das polícias seja uma tarefa para os governadores.

Esse aspecto do discurso, em particular, mereceu muitas críticas nas redes sociais, exatamente por parte daqueles que apontavam a necessidade de aproveitar a indignação da classe média para alertar sobre a violência cometida cotidianamente contra os pretos e pobres.

Porém o problema é estrutural, e uma visita a um artigo do falecido criminalista Augusto Thompson ajudaria a esclarecer. Ele mostra que os policiais são treinados para incorporar o estereótipo de criminoso, associado à pobreza e à cor da pele, e afirma que a polícia que temos é a que convém ao sistema: “Venal, submissa ao jogo das pressões, atrabiliária, preconceituosa”.

O criminalista indica ainda as armadilhas discursivas que desviam o foco da questão estrutural: bastaria apresentar a “podridão policial” como problema conjuntural, fruto de defeitos e vícios individuais, e anunciar o saneamento – ou, como popularmente se diz, a “faxina”.

“Logo o órgão começará a cumprir suas atribuições de forma limpa, justa, correta, quando, então, viveremos no melhor dos mundos. Ciclicamente promovem-se campanhas de depuração nas hostes policiais, aplicam-se mais recursos no setor, aprimoram-se equipamentos, garantindo-se que já, já, a perfeição será atingida”.

(Bem a propósito, o secretário Beltrame, diante dos “possíveis excessos” cometidos na Maré, declarou: “Essas coisas têm de ser apuradas. Temos aqui mais de 1.500 policiais expulsos. Isso não é problema e, se tiver que expulsar mais, vamos expulsar”.)

Luta de classes

Thompson aponta a manobra operada através dos meios de comunicação com o objetivo de convencer a população de que a questão relativa à distribuição de uma justiça criminal perversa decorre de mero acidente, “ou, ainda, em último caso, porque de um povo que não presta fica inviável recrutar gente de bem para integrar o corpo policial (‘cada povo tem a polícia que merece’)”.

O resultado é que as pessoas esquecem que o problema está nos próprios fundamentos do sistema, feito para funcionar exatamente assim, e gastam suas energias “em brados de revolta contra a polícia que atualmente existe”.

Diante dos acontecimentos das últimas semanas, estaríamos, talvez, em condições de levantar essas questões estruturais: porque finalmente as pessoas estão percebendo o que é esta polícia é que precisaríamos, urgentemente, protestar e exigir o fim desta polícia, ou então não estaremos vivendo no que minimamente se poderia chamar de democracia.

Porém, passada a indignação inicial, talvez tudo volte a ser como sempre. Os acontecimentos na Maré, que vararam a madrugada de segunda para terça-feira, oferecem uma boa oportunidade para saber de que lado estamos e o que queremos de fato.

Afinal, como disse um poeta da periferia paulistana durante uma das recentes manifestações em São Paulo, “esta não é uma luta qualquer; é uma luta de classes”.

***

Sylvia Debossan Moretzsohn é jornalista, professora da Universidade Federal Fluminense, autora de Repórter no volante. O papel dos motoristas de jornal na produção da notícia (Editora Três Estrelas, 2013) e Pensando contra os fatos. Jornalismo e cotidiano: do senso comum ao senso crítico (Editora Revan, 2007)

http://www.observatoriodaimprensa.com.br/news/view/desmilitarizacao_da_policia_a_pauta_urgente

terça-feira, 18 de junho de 2013

O circo está pegando fogo e o pão está pela hora da morte


 Por Fátima Lacerda*

 Resgato a constatação, coletada no facebook, da arqueóloga Sílvia Peixoto, que sintetiza com exatidão o espírito das manifestações: o circo está pegando  fogo e o pão está pela hora da morte.

 “Quem disse que o Brasil é só futebol?” – lia-se em uma das faixas estendidas durante a manifestação em Brasília, na abertura da Copa das Confederações.  Anunciada a presença do presidente da Fifa, Joseph Blatter, o estádio Mané Garrincha explode em vaias ao mandatário da instituição que ostenta o título de “maior que a ONU” e à presidenta do Brasil, Dilma Rousseff.

 Dois dias depois (17), cem mil pessoas na Avenida Rio Branco e arredores, no Rio de Janeiro; 65 mil em São Paulo; mais de 20 mil em Belo Horizonte. Dez mil em Curitiba, Belém e Porto Alegre. Entre cinco e seis mil em Salvador, Brasília e Vitória. Quatro mil em Novo Humburgo (RS). Duas mil em Maceió (AL), Foz de Iguaçu (PR) e Campos (RJ). Mil em Fortaleza, Santos e Guarujá. Mais de 500 em Poços de Caldas (MG), Bauru (SP) e Três Rios (RJ). Em Pindamonhangaba (SP), 200. Até em Araraquara (SP), 150 pessoas, segundo a PM Os dados foram divulgados pelo G1. Grupos de brasileiros se manifestaram, em solidariedade, também em Nova Iorque (EUA) e em várias cidades da Europa.

 O movimento é plural. A maioria protesta pacificamente. No entanto, parte dos manifestantes, alguns de orientação anarquista, outros por simples revolta, faz questão de atingir os símbolos do poder, como vidraças de bancos e o Congresso Nacional, em Brasília. A Assembléia Legislativa do Rio de Janeiro (Alerj) foi foco do confronto mais explosivo no final do dia desde histórico momento nacional.

O problema não são os vinte centavos do ônibus, não é simplesmente a corrupção do partido de plantão no governo federal. Não é apenas o “mensalão”, como dizem oportunistas da oposição de direita, que também já tiveram os seus “mensalões” e se comportam como urubus na carniça.  O problema é o roubo do sistema bancário, o roubo deslavado das empreiteiras acoitadas e associadas aos governadores e prefeitos. A violência de todos os lados, mas, sobretudo, a violência da polícia de Alckimin e de Cabral contra os pobres. É a violência dos ruralistas contra os nossos índios.

É o desrespeito aos símbolos da nossa cultura, como o acarajé e o Museu do Índio, patrimônios que os governos não se preocupam em preservar, desde que as obras milionárias possam render alguns milhões desviados da cultura, do saneamento básico, das escolas e dos hospitais para os bolsos dos empresários e políticos.

 As manifestações também são a expressão da falta de perspectiva. Para muitos, mais do que a revolta com a corrupção sistêmica, é o sentimento de ter sido traído por aqueles em quem confiavam. Eu nem precisaria citar o Partido dos Trabalhadores (PT). Que não se assanhe o PSDB. Ele e outros “Pês da vida” jamais serão herdeiros das esperanças dos jovens, porque estão ainda mais carcomidos.

 Por último, devo dizer: o momento da Copa das Confederações – ou seria da “Copa das Manifestações”? – é oportuno sim. A repercussão internacional não é nada desprezível como andei lendo em alguns sites que talvez não soubessem muito bem o que dizer. Foi por causa da Copa e de outros megaeventos programados no Brasil que pelo menos 250 mil pessoas foram despejadas. E sequer uma casa nova foi construída.

 Como se não bastasse, nossos políticos, sempre tão espertos, esqueceram de uma das lições básicas de Maquiavel: jamais deixe o povo sem pão e sem circo. O pão, as passagens, o pimentão, o tomate, está tudo pela hora da morte. A Fifa impôs ingressos caros, proibiu pandeiro, tamborim e até xingar o juiz nos estádios. Proibiu o povo de ter acesso aos jogos e pasteurizou tanto esse esporte que tirou toda a nossa graça de torcer.

 Pela primeira vez, desde que me entendo por gente, não se vê uma única rua pintada de verde e amarelo. Pensaram que iam nos fazer de bobos da corte? O brasileiro hoje já sabe que o futebol é um grande negócio para enriquecer meia dúzia de empresários e políticos. Foram com muita sede ao pote. Tiraram o pão da boca do povo e o povo da arena dos jogos. Queriam o quê? Agora estão colhendo aquilo que vêm plantando.

 Fonte: Fátima Lacerda é jornalista da Agência Petroleira de Notícias.