segunda-feira, 8 de julho de 2013

Contra as tramóias da direita: sustentar a Dilma Roussef

Por Leonardo Boff  *- em seu Blog

É notório que a direita brasileira especialmente aquela articulação de forças que sempre ocupou o poder de Estado e o tratou como propriedade privada (patrimonialismo), apoiada pela midia privada e familiar, estão se aproveitando das manifestações massivas nas ruas para manipular esta energia a seu favor. A estratégia e fazer sangrar mais e mais a Presidenta Dilma e desmoralizar o PT e assim criar uma atmosfera que lhes permite voltar ao lugar que por via democrática perderam.

Se por um lado não podemos nos privar de críticas ao governo do PT (e voltaremos ao tema), mas críticas construtivas, por outro, não podemos ingenuamente permitir que as transformações politico-sociais alcançadas nos últimos 10 anos sejam desmoralizadas e, se puderem, desmontadas por parte das elites conservadoras. Estas visam a ganhar o imaginário dos manifestantes para a sua causa que é inimiga de uma democracia participativa de cariz popular.

Seria grande irresponsabilidade e vergonhosa traição de nossa parte, entregar à velha e apodrecida classe política aquilo que por dezenas de anos  temos construido, com tantas oposições: um novo sujeito histórico,  o PT e partidos populares, com a inserção  na sociedade de milhões de brasileiros. Esta classe se mostra agora feliz com a possibilidade de atuar sem máscara e mostrando suas intenções antes ocultas: finalmente, pensa, temos chance de voltar e de colocar esse povo todo que reclama reformas, no lugar que sempre lhe competiu historicamente: na periferia, na ignorância e no silenciamento. Aí não incomoda nem cria caos na ordem que por séculos construimos mas que, se bem olhrmos, é ordem na desordem ético-social.

Esta pretensão se liga a algo anterior e que fez história. É sabido que com a vitória do capitalismo sobre o socialismo estatal  do Leste europeu em 1989, o Presidente Reagan e a primeira ministra Tatscher inauguraram uma campanha mundial de desmoralização do Estado, tido como ineficiente e da política como empecilho aos negócios das grandes corporações globalizadas e à lógica da acumulação capitalista. Com isso visava-se a chegar ao Estado mínimo, debilitar a sociedade civil e abrir amplo espaço às privatizações e ao domínio do mercado, até conseguir a passagem de uma sociedade com mercado para uma sociedade de puro mercado no qual tudo, mas tudo mesmo, da religião ao sexo, vira mercadoria. E conseguiram. O Brasil sob a hegemonia do PSDB se alinhou ao que se achava o marco mais moderno e eficaz da política mundial. Protagonizou vasta privatização de bens públicos que foram maléficos ao interesse geral.

Que isso foi uma desgraça mundial se comprova pelo fosso abissal que se estabeleceu entre os poucos que dominam os capitais e as finanças e a grandes maiorias da humanidade. Sacrifica-se um povo inteiro como a Grécia, sem qualquer consideração, no altar do mercado e da voracidade dos bancos. O mesmo poderá acontecer com Portugal, com a Espanha e com a Itália.

A crise econômico-financeira de 2008 instaurada no coração dos países centrais que inventaram esta perversidade social, foi consequência deste tipo de opção política. Foram os Estados que tanto combateram que os salvaram da completa falência, produzida por suas medidas montadas sobre a mentira e a ganância (greed is good), como não se cansa de acusar o prêmio Nobel de economia Paul Krugman. Para ele, estes corifeus das finanças especulativas deveriam estar todos na cadeia como criminosos. Mas continuam aí faceiros e rindo.

Então, se devemos criticar  a nossa classe política por ser corrupta e o Estado por ser ainda, em grande parte, refém da macro-economia neoliberal, devemos fazê-lo com critério e senso de medida. Caso contrário, levamos água ao moinho da direita. Esta se aproveita desta crítica, não para melhorar a sociedade em benefício do povo que grita na rua, mas para resgatar seu antigo poder político especialmente, aquele ligado ao poder de Estado a partir do qual garantia seu enriquecimento fácil. Especialmente a mídia privada e familiar, cujos nomes não precisam ser citados, está empenhada fevorosamente neste empreitada de volta ao  velho status quo.

Por isso, as demonstrações devem continuar na rua contra as tramóias da direita. Precisam estar atentas a esta infiltração que visa a mudar o rumo das manifestações. Elas invocam a segurança pública e a ordem a ser estabelecida. Quem sabe, até sonham com a volta do braço armado para limpar as  ruas.

Dai, repetimos, cabe reforçar o governo de Dilma, cobrar-lhe, sim,  reformas políticas profundas, evitar a histórica conciliação entre as forças em tensão e o oposição para juntas novamente esvaziar o clamor das ruas e manterem um status quo que prolonga  benefíciois compartilhados.

Inteligentemente sugeriu o analista politico Jeferson Miolo em Carta Maior (07/7/2013):”Há uma grave urgência política no ar. A disputa real que se trava nesse momento é pelo destino da sétima economia mundial e pelo direcionamento de suas fantásticas riquezas para a orgia financeira neoliberal. Os atores da direita estão bem posicionados institucionalmente e politicamente…A possibilidade de reversão das tendências está nas ruas, se soubermos canalizar sua enorme energia mobilizadora. Por que não instalar em todas as cidades do país aulas públicas, espaços de deliberação pública e de participação direta para construir com o povo propostas sobre a realidade nacional, o plebiscito, o sistema político, a taxação das grandes fortunas e do capital, a progressividade tributária, a pluralidade dos meios de comunicação, aborto, união homoafetiva, sustentabilidade social, ambiental e cultural, reforma urbana, reforma republicana do Estado e tantas outras demandas históricas do povo brasileiro, para assim apoiar e influir nas políticas do governo Dilma”?

Desta forma se enfrentarão as articulações da direita e se poderá com mais força reclamar reformas políticas de base que vão na direção de atender a infra-estrutura reclamada pelo povo nas ruas: melhor educação, melhores hospitais públicos, melhor transporte coletivo e menos violência na cidade e no campo.

Leonardo Boff não é filiado ao PT, é teólogo e escritor, da Comissão da Carta da Terra

http://leonardoboff.wordpress.com/2013/07/07/contra-as-tramoias-da-direita-sustentar-a-dilma-roussef/

domingo, 7 de julho de 2013

Aproveitar e mudar


Fato é que é necessário aproveitar a pressão das ruas para dirigir a política no interesse coletivo, diminuindo o poder fechado de "soluções" entre os poderes, sem nenhuma participação popular. No front político não será de se estranhar que se dissolva a precária base de sustentação do governo Dilma, que virou um saco de gatos ideológico e político. 

Por Amir Khair - Carta Maior
   
As manifestações de rua estão sendo aproveitadas para várias finalidades. Para a direita, o que interessa é desgastar o PT e o governo Dilma. Vislumbram a possibilidade de tirar o PT do poder e procuram o candidato que possa satisfazer suas vontades, com chances eleitorais.

A esquerda tem a possibilidade de tencionar os governos no sentido de avançar as políticas públicas na área social. Teme, no entanto, que a onda de repúdio à política e políticos acabe por gerar falsas soluções que acabem por interromper os avanços conquistados de mais distribuição de renda, e coloquem no governo um novo Collor.

Fato é que é necessário aproveitar a pressão das ruas para dirigir a política no interesse coletivo, diminuindo o poder fechado de "soluções" entre os poderes, sem nenhuma participação popular.

No front político não será de se estranhar que se dissolva a precária base de sustentação do governo Dilma, que virou um saco de gatos ideológico e político.

Há que buscar suporte político ao atender as pressões legítimas de soluções que reduzam despesas da maioria da população e que consigam ampliar e aprimorar os serviços nas áreas sensíveis como transporte e saúde e jogar força na estratégica área da educação, especialmente via aporte de recursos ao Fundo de Manutenção e Desenvolvimento da Educação Básica e de Valorização dos Profissionais da Educação (Fundeb), ampliando o percentual de 10% que o governo federal aporta a esse fundo. Uma possibilidade para novos recursos é regulamentar o Imposto sobre Grandes Fortunas, que o Congresso senta em cima das propostas para não atingir o bolso dos deputados e senadores.

Mas, há que tomar cuidado. Muitas vezes argumenta-se que faltam recursos para atender as demandas da população. Sim, faltam. Mas há que cobrar duramente das administrações, que usem os recursos passados pela população no interesse coletivo e de forma eficaz, ou seja, fazendo mais e melhor com os mesmos recursos seja ao terceirizar, seja ao fazer diretamente. Pouco se sabe sobre os custos reais dessas duas vias.

O interesse da chamada elite é pelo Estado mínimo e privado máximo. A palavra de ordem deles é redução das despesas de custeio para aumentar o resultado primário para pagar os juros do rentismo, que domina o País.

Há, no entanto, que ter clareza política nesse embate ideológico e defender intransigentemente o Estado, mas na sua função de velar pelo interesse coletivo e não o do capital ao direcionar recursos públicos.

A mais clara realidade sobre esse papel do Estado está no fato do descaso de prefeitos, governadores, vereadores, deputados, Ministério Público, Tribunal de Contas e a mídia praticamente ausentes nas suas funções de proteção aos interesses, por exemplo, dos que pagam as contas do transporte coletivo via tarifa e/u via subsídio pago às empresas operadoras.

O que se viu em decorrência da pressão das ruas foi um vergonhoso jogo de cena onde alguns governantes baixaram as tarifas por parcos centavos, afirmando que só se o governo federal reduzisse tributos é que poderiam baixar mais, ou ainda afirmações de pseudo economias que iriam fazer fundindo órgãos, como fez o governador de São Paulo, com uma "economia" de R$ 130 milhões neste ano, algo como 0,07% do orçamento do Estado.

A falta de compromisso com a população, especialmente a de menor renda, que depende do serviço público na educação, saúde, assistência social e segurança, pode ser vista na quantidade, qualidade e baixa eficiência da prestação dos serviços, tornando-os mais caros do que deveriam. O caro aqui se refere ao custo para ter o serviço, seja esse custo feito diretamente, seja feito através de empresa privada contratada para isso.

Há ausência praticamente total de auditoria de custos em tudo que o setor público contrata e de transparência no que executa diretamente. Falta vontade política para verificar o valor que está sendo pago ao prestador de serviço ao executor da obra. Em geral tudo que é entregue ao setor privado para fazer em lugar do setor público pode estar sendo pago com valor acima do que deveria caso o governo se dispusesse a olhar com mais cuidado tudo que contrata e, muitas vezes não o faz por falta de quadros e/ou de competência para isso.

A população que paga a conta tem todo direito de saber o porque do valor cobrado e o governo através dos seus três níveis (federal, estadual e municipal), poderes (Executivo, Legislativo, Judiciário e Ministério Público) e agências "reguladoras" de FHC, o dever de não jogar contas indevidas sobre os usuários e contribuintes.

Deve-se questionar as tarifas do transporte coletivo, da mesma forma, o pagamento às empresas do lixo e varrição de vias (uma das maiores despesas das prefeituras), as contas das concessionárias (água e esgoto, energia elétrica, telefonia e gás) que são uma verdadeira caixa preta funcionando como potentes bombas de sucção do ganho das pessoas.

Assim que continue a pressão das ruas. Se Dilma quiser buscar respostas via Congresso vai-se frustrar, pois lá tem sido mais um banco de negócios para satisfazer os interesses de cargos e ganhos pessoais dos "representantes" do povo. Felizmente ainda há exceções.

O que vale é participar e lutar para avançar e fazer os governos ampliarem o atendimento com melhor qualidade à área social. Sem pressão nada acontecerá. É aproveitar a força do movimento para mudanças que estão emperradas

.http://www.cartamaior.com.br/templates/materiaMostrar.cfm?materia_id=22308&editoria_id=4


sábado, 6 de julho de 2013

Florestas mapeadas para venda?

 Rede Democratica*


Uma notícia sutil, que num primeiro momento pode até parecer algo imprescindível e relevante para a biodiversidade aos poucos vai se revelando do que realmente trata: do mecanismo de Redução de Emissões por Desmatamento e Degradação Florestal em Países em Desenvolvimento, mais conhecido por REDD! Mecanismo de financeirização e mercantilização da natureza. A Economia Verde não teve tanta voz e vez na Rio+20, mas seus mecanismos seguem em desenvolvimento…

Nova ferramenta online da FAO disponibiliza dados sobre saúde das florestas

Plataforma GlobAllomeTree ajuda países a identificar mudança no estoque de carbono das florestas

Uma nova plataforma online lançada na sexta-feira (28) pela Organização das Nações Unidas para Alimentação e Agricultura (FAO) permite que cientistas e especialistas em mudanças climáticas calculem dados cruciais para criar estratégias de bioenergia, como o volume das florestas, a biomassa e o carbono florestal.

A plataforma GlobAllomeTree foi desenvolvida numa parceria da FAO com o centro de pesquisa francês CIRAD e pela Universidade de Tuscia, da Itália. O objetivo é fornecer informações para basear a tomada de decisões políticas sobre as mudanças climáticas.

“Esta é a primeira vez que os países têm acesso a uma extensa base de dados de modelos de árvores utilizada para avaliar os recursos florestais em todo o mundo. Isso lhes permite obter uma imagem clara sobre as capacidades de armazenamento de carbono das suas próprias florestas”, disse o diretor da FAO para florestas, Matieu Henry.

Na área florestal, a alometria refere-se às relações estatísticas entre as diversas características do tamanho da árvore. Equações alométricas podem ser usadas para avaliar muitos serviços florestais como a produção de madeira, mas também a redução dos efeitos das mudanças climáticas no setor florestal por exemplo.

A ferramenta permite aos usuários avaliar o volume do caule, a biomassa arbórea e os estoques de carbono a partir de características como o diâmetro do tronco, a altura e o peso específico da madeira de vários tipos de árvores de zonas ecológicas diferentes.

A partir de agora, a plataforma abrange 61 espécies de árvores em sete diferentes zonas ecológicas na Europa, 263 espécies de árvores em 16 zonas da América do Norte e 324 espécies em nove zonas ecológicas na África. As ferramentas de cálculo para o Sul e Sudeste da Ásia e para as Américas Central e do Sul serão enviadas para a plataforma em breve.

O site será particularmente útil para os países que participam do Programa Colaborativo das Nações Unidas para a Redução de Emissões por Desmatamento e Degradação Florestal em Países em Desenvolvimento. Eles serão capazes de avaliar com precisão estoques de carbono florestal e as mudanças nos estoques de carbono

.http://www.rededemocratica.org/index.php?option=com_k2&view=item&id=4725:florestas-mapeadas-para-venda?

* publicado no Site da Rede Democratica em 4/07/2013

Fontes: ONU e Blog do Centro de Estudos Ambientais

Leia também:http://brasileducom.blogspot.com.br/2013/06/agronegocio-e-ecomercado-ameacam-vida.html

O GOLPE DE ISRAEL-EUA NO EGITO



Laerte Braga


O presidente do Egito, eleito pelo voto popular, não foi deposto como consequência de movimento popular. Mursi estava tomando atitudes que contrariavam os interesses norte-americanos e israelenses e isso desagradou aos militares de seu país que, na maioria, veste por baixo da farda egípcia a farda de Israel.
“Manifestantes” pagos, militares e policiais à paisana, empregados de fábricas israelenses e norte-americanas, coagidos foram às ruas pedir a saída do presidente. No dia seguinte uma avalancha de egípcios ocupou a praça Tarik para defender o mandato de Mursi.
O Egito é fundamental para o jogo político de Israel e dos EUA no Oriente Médio e qualquer governo que contrarie ou desarranje esse xadrez é visto como inimigo. Neste momento, sem revolta popular, não existe a menor possibilidade de democracia naquele país.
O governo da Turquia, a comunidade islâmica e o povo egípcio já manifestaram apoio
Uma nota pública foi divulgada sobre o assunto e entre outras afirmações diz o seguinte:

“Nós não temos que ser um egípcio para falar sobre seus problemas. Nós somos seres humanos. Nós nos preocupamos com os nossos irmãos e irmãs muçulmanos e não muçulmanos de todo o mundo. Nós não apoiarMursi em todos os sentidos, nós não afirmamos que ele é perfeitamente impecável, mas ele não merece este comportamento feio, desonesto , com apoio externo para derruba-lo, contra a vontade do Povo Egipicio. Pois nossa comunidade sabe e ensina que quem  quer a democracia, tem que aprender a ser paciente até o momento da próxima eleição, e as manifestações não são para derrubada do poder, mas sim para declarar a vontade do povo em questões pontuais, as quais devem ser estudadas discutidas em um sistema democratico, sem a intervençao das forças armadas, sem mentiras , sem golpes.
Esta Nação é islamica, possuidora de conhecimentos fundamentais , a qual foi a primeira a declarar os Direitos Humanos , de acordo com
o Alcorao Sagrado. Não há Demoracia sem Direitos Respeitados, e Mursi e a comunidade Egipcia não está tendo. Ao contrarios disto, a comunidade nã islamica, atraveps da REde Jornalistica está divulgando ao Mundo Mentiras, para encubrir a Grande Farça , forjada .
Queremos declarar ao Mundo que NÃO CONCORDAMOS COM O QUE VEM SENDO DIVULGADO, POIS NÃO É A VERDADE!”

A nota afirma ainda que está sendo modificada a constituição antes das novas eleições, pois assim escolhem um dos seus membros. Critica o noticiário deturpado da mídia ocidental, e neste momento a Comunidade Islâmica começa a divulgar a nota para blogueiros e jornalistas independentes no sentido de esclarecer e encontrar a justiça, o que houve foi um golpe militar.

Uma série de passeatas tanto no Egito como na Turquia está sendo feita em favor de Mursi. O trabalho está sendo iniciado pela Comunidade sobrevivente do Marmara, que foi atacado por israelenses que levavam ajuda humanitária para a Palestina. Em consequência foi formado o IHH HUMANITARIAN RELIEF FOUNDATION para buscar socorrer as vítimas do terror israelense.

A situação no Egito é tensa é a imensa maioria da população exige a volta de Mursi ao poder e uma profunda reforma nas forças armadas, comprometidas com Israel e com os EUA. Na região, o Egito é uma potência militar e desequilibraria os interesses da ISRAEL-EUA TERRORISMO S-A, recobranco sua soberania.

A situação no país deve agravar-se nos próximos dias levando em conta a crueldade e a absoluta barbárie de militares e policiais subordinados a Israel e aos EUA.

Não há no Egito controlado pelos militares qualquer respeito à vontade popular ou aos direitos humanos.

A luta pela legalidade, a volta de Mursi ao poder, vai continuar.



sexta-feira, 5 de julho de 2013

Dublê da Globo é dublê de líder da Veja

Por Fernando Britto, do Tijolaço


O Blog ContextoLivre (leia O herói da Veja diz que bandido bom é bandido morto) publica e a gente foi conferir. E achou muito mais.

Maycon Freitas, o entrevistado das Páginas Amarelas da Veja desta semana, como “representante” dos manifestantes da onda de protestos que tomou as ruas, presta serviços como dublê a Rede Globo de Televisão.



A Veja, é claro, nem se importou que Maycon tenha quase o dobro da idade da maioria dos manifestantes, mas o transformou num grande ativista cibernético.

Apresentado como “a voz que emergiu das ruas”, Maycon é apresentado como líder de uma comunidade no Facebook , a União Contra a Corrupção, onde se publica ou republica coisas como essa imagem aí do lado, dizendo que os médicos cubanos (cadê?) são guerrilheiros disfarçados e que um golpe comunista está em marcha. É mentira, a página é mantida por Marcello Cristiano Reis, um advogado paulista.

Se tivesse ido olhar o perfil de Maycon no Facebook veria que, antes de virar “celebridade”, suas últimas postagens foram em janeiro, com pérolas do tipo:
“Mulher que diz que homem é tudo igual. É porque nunca soube fazer a diferença na vida de um.”, ou
“No carnaval as mina pira , em novembro as mina 'pari'". “No carnaval os mano come, em novembro os mano some.”

Antes, em 2012, a vida estava boa para Maycon, como você pode ver nas fotos do líder de massas em Cancún, no México, num turismo “padrão FIFA” de deixar a gente com inveja. 

Como está sofrendo o revoltado Maycon!



Ah, essa internet…

Ah, essa Veja…


PS. Até de um mistificador como o Maycon a gente respeita a privacidade. Todas as fotos são públicas no seu Facebook, não necessitam de compartilhamento.

quinta-feira, 4 de julho de 2013

Globo veta plebiscito



Por Fernando Brito, no blog Tijolaço: em 4/07/2013

São 20 horas e a mensagem de Dilma propondo o plebiscito já caiu das principais chamadas dos sites de notícias.

No lugar dela, a morte do projeto da “cura-gay”.

Espero um pouco mais, e vem o Jornal Nacional. Lá no fim, depois de uma imensa reportagem sobre a indústria em queda e a inflação em alta, vem a matéria sobre o plebiscito.

O vice-presidente Michel temer só falta pedir desculpas por ter levado a proposta de Dilma ao Congresso.

Os líderes da base “não tão aliada” querem que isso vire referendo para 2014.

Aecinho, pontificando, diz que Dilma mandou uma proposta que até ela sabe que não é possível viabilizar.

Os líderes acharam tudo complicado e só vão falar isso na semana que vem.

Depois, destaque na nota do TSE de que, se o Congresso não implementar, até o início de outubro, o resultado do plebiscito ”não haverá efeitos, no pleito eleitoral subsequente, o que pode ser fator de deslegitimação da chamada popular”.Claro, não houve menção ao final da nota, onde a Ministra Carmen Lúcia e os 27 presidentes de TREs dizem que “o sonho do povo brasileiro é a democracia plena e eficiente. O dever do juiz é garantir o caminho do eleitor para que o sonho venha a ser contado para virar a sua realidade. O juiz não se descuida do poeta. É a sua forma de atentar ao eleitor, única razão de ser da Justiça Eleitoral”.

Dois ex-ministros do TSE aparecem para dizer que “não haverá tempo”.

Resumo de tudo, nas palavras do líder do PT na Câmara, José Guimarães: “quando se quer, dá tempo; quando não se quer, não dá”.

Alguém acha que o Congresso quer reforma?

E assim, ficamos com a nossa triste ordem democrática, onde o povo votar e decidir qualquer coisa diferente do interesse de suas elites é inviável.

Leia também: http://www.redebrasilatual.com.br/politica/2013/07/dilma-afirma-que-e-necessario-teimar-para-garantir-transformacoes-sociais-4392.html

 É fundamental ler essa denúncia...
http://altamiroborges.blogspot.com.br/2013/07/duble-da-globo-e-o-lider-da-veja.html?spref=tw

 

Transição do ciclo econômico se acelera. E a restauração em marcha sabota plebiscito

por Saul Leblon - Carta Maior
   

Transição de ciclo econômico se acelera

Retomada norte-americana amplia o poder de coação dos capitais que migram da bolsa brasileira em 3ª feira marcada, ainda, por queda na produção industrial e dados ruins na balança comercial.

A transição de ciclo econômico se acelera: o Brasil terá que discutir as linhas de passagem para renovar a sua agenda de desenvolvimento.

Há escolhas a fazer e não são singelas.

O país dará liberdade aos fundos e rentistas internacionais para saquearem as suas reservas em revoadas para o exterior?

Oferecerá arrocho salarial e juro alto na tentativa de conte-los aqui?

Sacrificará investimentos em infraestrutura para entregar o superávit fiscal cheio', como pede a banca local e forânea?

Saberá pactuar prioridades sociais escalonadas em calendário crível e realista?

Se as respostas a essas e outras perguntas forem ordenadas pela lógica blindada do interesse financeiro, o resultado é sabido.

O Brasil pode virar um imenso Portugal.

Portanto, não é apenas a reforma política que requer amplo debate democrático.

A travessia para um novo ciclo de desenvolvimento só contemplará os anseios das ruas por mais democracia social, se vier ancorada em sincera e corajosa discussão progressista com a sociedade.

É o oposto do que uivam os centuriões do conservadorismo.

Para eles a rua já deu o que tinha que dar: o desgaste do governo do PT.

Todo o seu empenho agora é para descongestionar o ambiente político de qualquer contaminação associada a mecanismos de democracia direta.

A rejeição nervosa ao plebiscito reflete a ansiedade defensiva de quem sabe que o divisor entre economia e política é tênue; nas crises, desmancha-se no ar.

Deixar o governo sangrar até 2014, sob estrita vigilância dos ‘mercados' é o seu sonho de consumo eleitoral.

Daí o esforço preventivo de desqualificação de qualquer novidade política que possa empurrar a agenda do futuro econômico para o relento do debate em campo aberto.

Não interessa aos ventríloquos dos livres mercados serem acareados pelo discernimento social.

Cabe às forças progressistas abortar esse cinturão sanitário, fazendo da travessia econômica uma extensão da agenda da reforma política. A ver.


Restauração em marcha sabota plebiscito: 'as ruas já deram o que tinham que dar'

Dos partidos da oposição, o único que aceitou o convite da Presidenta Dilma para conversar sobre o Brasil e a reforma política foi o PSOL.

Demotucanos e assemelhados declinaram.

Os campos se definem em relação às ruas.

Caminha-se para um realinhamento da cena política brasileira.

Se a conversa Dilma/PSOL abrir espaços para um aggiornamento à esquerda da governabilidade, algo de inestimável importância terá acontecido nos dias correm.

Alegam PSDB, Demos e PPS não ter sobre o que conversar.

Faz sentido.

Dilma pretendia ouvi-los sobre a convocação de um plebiscito para estreitar a aderência do sistema político às ruas.

A proposta foi enviada ao Congresso nesta 3ª feira, cercada pela rejeição conservadora.

‘Ora direis ouvir as ruas’, replicam demotucanos em sua esférica coerência.

Ouvir as ruas é tudo o que o credo neoliberal entende que não deva ser feito nessa hora; em qualquer hora.

A escuta forte da sociedade soa como dissonância chavista aos ouvidos congestionados pela cera secular do interesse dominante.

A democracia para esse sistema auditivo é um ornamento.

Um adereço nos colóquios dos salões elegantes. Um caramelo, após o cafezinho.

Nos dias que correm, a democracia é a citação de rodapé da judicialização da política.

Sobretudo, a democracia destas siglas gêmeas deve lubrificar a obediência da sociedade aos livres mercados.

É o oposto do que pensa a tradição socialista: a democracia cresce justamente quando escapa aos limites liberais e se impõe como força normativa aos mercados.

Ganha relevância assim.

Quando assume o papel de contrapeso histórico aos apetites rapinosos do dinheiro grosso.

É democracia de fato ao romper a película liberal para se tornar, também, democracia social.

O extremo oposto conservador entende que ouvir as ruas é algo que só cabe em doses módicas.

Com o dinheiro a cerzir as amarras entre o presente e o futuro.

De quatro em quatro anos.

Nunca em ciclos curtos, ou de crise, quando o mais aconselhável são as elites – no limite, os quartéis - assumirem a tutela da vontade popular.

Consultas regulares à cidadania e tudo o mais que possa tornar volátil o mando e o comando devem ser execrados.

Volatilidade é uma prerrogativa dos capitais.

Irrepartível.

À política cabe a tarefa de calcificar o poder e embalsamar a sociedade.

Editoriais de O Globo, Estadão e Veja, ademais de centuriões da mesma extração, uivam a rejeição ao plebiscito e à Constituinte.

O que lhes interessava das ruas, as ruas já deram.

O Datafolha, no calor da Paulista, recompôs a chance de um 2º turno em 2014.

A narrativa tratou de ofuscar o ruído de longo curso, subjacente ao desabafo da hora: se candidato, Lula levaria de 1ª, com 46% dos votos.

A Folha entendeu; e tanto que escondeu o tropeço na primeira página. E pisoteou a informação nas entrelinhas internas.

É preciso desfrutar a ‘colheita’, crua, se necessário, para não desperdiçar a janela de oportunidade.

Interesses que operam no sentido de subtrair fatias de poder à democracia estão satisfeitos com o saldo.

Há mais de 30 anos tem sido hábeis em interditar o debate das grandes escolhas do desenvolvimento.

Para isso, escavaram fossos intransponíveis entre a soberania nacional e a supremacia das finanças desreguladas no circuito global.

Assim se assegurou a hegemonia do poder extra-ruas.

Por que abririam mão dele justamente agora, em pleno divisor de ciclo, quando linhas de passagem terão que ser erguidas em direção a um novo projeto de desenvolvimento?

O ‘não’ ao convite de Dilma encerra a solidez de uma coerência histórica.

A contrapartida cabe à esquerda.

A sorte do país e o destino de sua democracia dependem, em grande parte, do desdobramento concreto que o diálogo simbólico entre Dilma e o PSOL produzir na unificação da agenda progressista brasileira.Não apenas para articular a reforma política. Mas para democratizar o crucial debate sobre o passo seguinte da luta pelo desenvolvimento.

A ver.

Fonte: Carta Maior - Blog das Frases por Saul Leblon

Leia também: A indignação brasileira mira políticos, mas esquece o capital
http://blog-sem-juizo.blogspot.com.br/2013/07/indignacao-brasileira-mira-politicos.html

quarta-feira, 3 de julho de 2013

Governo brasileiro expressa repúdio ao constrangimento imposto ao presidente Evo Morales


Em nota, governo expressa repúdio ao constrangimento imposto ao presidente Evo Morales
Quarta-feira, 3 de julho de 2013 às 16:15

A presidenta Dilma Rousseff emitiu nota, nesta quarta-feira (3), em que expressou repúdio e indignação ao constrangimento imposto ao presidente da Bolívia, Evo Morales. Alguns países europeus impediram o sobrevoo do avião presidencial boliviano por seu espaço aéreo.

Segundo a nota, o constrangimento não atinge somente a Bolívia, mas a toda América Latina, comprometendo o diálogo entre os continentes e possíveis negociações entre eles. Dilma ainda afirma que encaminhará iniciativas em todas as instâncias multilaterais para que situações como essa nunca se repita.

Confira a íntegra

O governo brasileiro expressa sua indignação e repúdio ao constrangimento imposto ao presidente Evo Morales por alguns países europeus, que impediram o sobrevoo do avião presidencial boliviano por seu espaço aéreo, depois de haver autorizado seu trânsito.

O noticiado pretexto dessa atitude inaceitável – a suposta presença de Edward Snowden no avião do Presidente – além de fantasiosa, é grave desrespeito ao Direito e às práticas internacionais e às normas civilizadas de convivência entre as nações. Acarretou, o que é mais grave, risco de vida para o dirigente boliviano e seus colaboradores.

Causa surpresa e espanto que a postura de certos governos europeus tenha sido adotada ao mesmo momento em que alguns desses mesmos governos denunciavam a espionagem de seus funcionários por parte dos Estados Unidos, chegando a afirmar que essas ações comprometiam um futuro acordo comercial entre este país e a União Europeia.

O constrangimento ao presidente Morales atinge não só à Bolívia, mas a toda América Latina. Compromete o diálogo entre os dois continentes e possíveis negociações entre eles. Exige pronta explicação e correspondentes escusas por parte dos países envolvidos nesta provocação.

O governo brasileiro expressa sua mais ampla solidariedade ao presidente Evo Morales e encaminhará iniciativas em todas instâncias multilaterais, especialmente em nosso continente, para que situações como essa nunca mais se repitam.

Dilma Rousseff
Presidenta da República Federativa do Brasil



Leia também

A corvadia europeia contra o presidente Evo Morales


Os europeus, os campeões da defesa da democracia, do Estado de Direito e da liberdade, demonstraram que suas relações com a Casa Branca estão acima de tudo e que podem pisotear os direitos de um avião presidencial caso isso seja preciso para que o grande império não se incomode com eles. Um rumor infundado sobre a presença no avião presidencial boliviano do ex-espião estadunidense Edward Snowden, conduziu a um sério incidente diplomático aeronáutico entre Bolívia, França, Portugal e Espanha.

 Por Eduardo Febbro Carta Maior


Paris - Os europeus são incorrigíveis. Para não ficar mal com o império norteamericano são capazes de violar todos os princípios que defendem nos fóruns internacionais. O presidente boliviano Evo Morales foi o último a experimentar as consequências dessa política de palavras solidárias e gestos mesquinhos. Um rumor infundado sobre a presença no avião presidencial boliviano do ex-membro da Agência Nacional de Segurança (NSA) norteamericana, o estadunidense Edward Snowden, conduziu a um sério incidente diplomático aeronáutico entre Bolívia, França, Portugal e Espanha.

Voltando de Moscou, onde havia participado da segunda cúpula de países exportadores de gás, realizada na capital russa, Morales se viu forçado a aterrissar no aeroporto de Viena depois que França, Portugal e Espanha negaram permissão para que seu avião fizesse uma escala técnica ou sobrevoasse seus espaços aéreos. Os “amigos” do governo norteamericano avisaram os europeus que Morales trazia no avião Edward Snowden, o homem que revelou como Washington, por meio de vários sistemas sofisticados e ilegais, espionava as conversações telefônicas e as mensagens de internet da maioria do planeta, inclusive da ONU e da União Europeia.

O certo é que Edward Snowden não estava no avião de Evo Morales. No entanto, ante a negativa dos países citados em autorizar o sobrevoo do avião presidencial, Morales fez uma escala forçada na Áustria. As capitais europeias coordenaram muito bem suas ações conjuntas para cortar a rota de Evo Morales. Surpreende a eficácia e a rapidez com que atuaram, tão diferente das demoradas medidas que tomam quando se trata de perseguir mafiosos, traficantes de ouro, financistas corruptos ou ladrões do sistema financeiro internacional.

Segundo a informação da chancelaria boliviana, o avião havia obtido a permissão da Espanha para fazer uma escala técnica nas Ilhas Canárias. Essa autorização também foi cancelada e, finalmente, o avião teve que aterrissar no aeroporto de Viena. Segundo declarou em La Paz o chanceler boliviano David Choquehuanca, “colocou-se em risco a vida do presidente que estava em pleno voo”. “Quando faltava menos de uma hora para o avião ingressar no território francês nos comunicam que tinha sido cancelada a autorização de sobrevoo”. O ministro pediu uma explicação tanto da França quanto de Portugal, país que tomou a mesma decisão que a França.

“Queremos nos amedrontar. É uma discriminação contra o presidente”, disse Choquehuanca. Em complemento a esta informação, o portal de Wikileaks também acusou a Itália de não permitir a aterrisagem do avião presidencial boliviano. Em Paris, o conselheiro permanente dos serviços do primeiro-ministro Jean-Marc Ayrault disse que não tinha nenhuma informação sobre esse assunto. Por sua vez, a chancelaria francesa disse que não estava em condições de comentar ocaso. Bocas fechadas, mas atos concretos.

Ao que parece, todo esse enredo se armou em torno da presença de Snowden no aeroporto de Moscou. Alguém fez circular a informação de que Snowden estava no aeroporto da capital russa com a intenção de subir no avião de um dos países latino-americanos dispostos a lhe oferecer asilo político. Snowden é procurado por Washington depois de revelar a maneira pela qual o império filtrava as conversações no mundo. O chanceler boliviano qualificou como uma “injustiça” baseada em “suspeitas infundadas sobre o manejo de informação mal intencionada” o cancelamento das permissões de voo para o avião de Evo Morales. “Não sabemos quem inventou essa soberana mentira; querem prejudicar nosso país”, disse Choquehuanca. “Não podemos mentir à comunidade internacional e não podemos levar passageiros fantasmas”, advertiu o responsável pela diplomacia boliviana.

Em La Paz, as autoridades adiantaram que não receberam nenhum pedido de asilo por parte de Edward Snowden. Evo Morales havia evocado a possibilidade de conceder asilo a Snowden, mas só isso. O mesmo ocorreu com outra vítima da informação e da perseguição norteamericana, o fundador do Wikileaks, Julian Assange. O mundo ficou pequeno para Edward Snowden.

Assange está refugiado na embaixada do Equador em Londres e Snowden encontra-se há dez dias na zona de trânsito do aeroporto de Sheremétievo, em Moscou. Segundo Dmitri Peskov, o secretário de imprensa do presidente Vladimir Putin, o norteamericano havia solicitado asilo a Rússia, mas depois “renunciou a suas intenções e a sua solicitação”. Peskov esclareceu, porém, que o governo russo não entregaria o fugitivo para a administração norte-americana: “o próprio Snowden por sincera convicção ou qualquer outra causa se considera um defensor dos direitos humanos, um lutador pelos ideais da democracia e da liberdade pessoal. Isso é reconhecido pelos ativistas e organizações de direitos humanos da Rússia e também por seus colegas de outros países. Por isso é impossível a entrega de Snowden por parte de quem quer que seja a um país como os EUA, onde se aplica a pena de morte.

Quando se referiu ao caso de Snowden em Moscou, Evo Morales assinalou que “o império estadunidense conspira contra nós de forma permanente e quando alguém desmascara os espiões, devemos nos organizar e nos preparar melhor para rechaçar qualquer agressão política, militar ou cultural”. Os europeus, os campeões da defesa da democracia, do Estado de Direito e da liberdade, demonstraram que suas relações com a Casa Branca estão acima de tudo e que podem pisotear os direitos de um avião presidencial caso isso seja preciso para que o grande império não se incomode com eles.

Tradução: Marco Aurélio Weissheimer


   
http://www.cartamaior.com.br/templates/materiaMostrar.cfm?materia_id=22291
• A covardia europeia contra o presidente Evo Morales

Nota do Educom: Essa atitude européia não só é  subserviência aos EUA, mas também porque a Bolívia foi a maior responsável por uma das maiores conquistas desse século: aprovação da resolução da ONU que determina Água como Direito Humano, que  a União Européia tentou derrubar na Rio+20.  A França tem hoje 70% do mercado da água. Em outras palavras, essa Resolução da ONU contraria  os interesses europeus, principalmente da França.

Leia também:http://brasileducom.blogspot.com.br/2010/08/agora-agua-para-todos.html

http://brasileducom.blogspot.com.br/2012/07/a-luta-pelo-direito-agua-na-rio20.html

http://brasileducom.blogspot.com.br/2013/05/as-guerras-da-agua-de-um-livro-de-elsa.html

O Viver Arriscoso das Multidões

28/06/2013 - por Emiliano José - do site Bahia 247

Quem de cara tentou desqualificar o movimento foi o governador Alckmin com sua política truculenta e a nossa velha mídia, que chamou os jovens de vândalos e terroristas.

As conjunturas surpreendentes são ao que mais podem nos ensinar, se quisermos aprender, e às vezes demanda tempo até que se recolham todos os ensinamentos desses momentos-irrupção, que surgem como do nada, embora, como óbvio, nunca surgem do nada, senão de um acúmulo, mesmo que imperceptível para muitos, como as recentes manifestações que se espraiaram pelo País.

Compreender que tudo que existe merece perecer não é simples.

Escrever assim a quente, no calor dos acontecimentos, é sempre um risco enorme. Não me sinto, no entanto, no direito de esperar as coisas esfriarem para falar alguma coisa.

Correr riscos é da vida.

Viver é arriscoso, mas o que a gente quer da vida é coragem: me socorro, da cabeça, de Riobaldo Tatarana, protagonista de Guimarães Rosa.

Vamos em frente que atrás vem gente, e cada vez mais gente.

Todos nós, envolvidos com a militância política tradicional, à esquerda ou à direita, fomos tomados de surpresa com as movimentações recentes da nossa juventude, pela sua radicalidade, sua intensidade, persistência, massividade.

Houve, quem sabe ainda há, uma acentuada perplexidade, e a busca nos manuais de antanho nem sempre resolviam nossos problemas teórico-práticos.

Talvez apenas os teóricos da multidão, vanguardeados por Antonio Negri, não se sintam tão atordoados, e cito aqui o notável Giuseppe Cocco, de quem sou admirador e amigo recente, e que deu uma entrevista admirável sobre as mobilizações recenteswww.unisinos.br

Marco logo uma posição: creio ser extremamente saudável politicamente que multidões, especialmente nesse caso multidões juvenis, ganhem as ruas por objetivos políticos.

E que o façam, para além de quaisquer aparentes exageros – e há movimentos de massas que não experimentem exageros ou até infiltrações indesejáveis, como aqueles da extrema-direita brasileira? – que o façam em defesa do aprofundamento da democracia, da participação cada vez mais decisiva do povo nos destinos do País.


Quem de cara tentou desqualificar o movimento foi exatamente o governador Alckmin com sua política truculenta e a nossa velha mídia, que chamou os jovens de vândalos e terroristas, para logo depois, quando percebeu o alcance das manifestações, passar até a elogiá-las, só que aí em sua indisfarçável perspectiva golpista.

O PT seguramente também foi surpreendido e só nas últimas horas, no momento em que escrevo esse texto, como instituição, resolveu se envolver nos atos de rua, com a sua cara, sem medo de defender as bandeiras avançadas do movimento e as conquistas realizadas nesses últimos dez anos sob os governos Lula e Dilma.

Tenho dito que o grande desafio da sociedade brasileira está nas cidades, principalmente.

Lembro-me de fala recente de Márcio Pochmann (e que ele me desculpe pela eventual imprecisão) sobre as cidades-acampamento do século XX: acampamentos edificados para responder à industrialização, e depois os seus problemas se avolumaram numa proporção e velocidade extraordinárias. Tornaram-se aglomerações quase ingovernáveis e de qualidade de vida angustiante, às vezes insuportáveis, especialmente para os mais pobres.

Claro que podemos dizer, e o fazemos com propriedade, que nos últimos dez anos, sob os governos de Lula e Dilma, houve melhorias significativas na vida do nosso povo, que milhões foram retirados da miséria extrema, que outros tantos milhões melhoraram sua condição de vida, e aqui não cabe balanço mais completo.

Essa elevação da qualidade de vida, e ainda há uma longa caminhada pela frente, implicou a conquista de mais cidadania, mais consciência política.

Parte dos que emergiram parecem dizer queremos mais e mais, e as condições difíceis das grandes cidades, especialmente a precariedade da mobilidade, leva a juventude a se exasperar, a não aceitar passar tanto tempo espremida num transporte coletivo torturante, passar longo tempo à espera de que chegue ao destino, e ainda pagando passagens caras.

É, na visão de Cocco, (foto) a luta dos trabalhadores imateriais, que tem como fábrica a metrópole e lutam pela qualidade de vida da qual dependerá a inserção deles em um trabalho que não é mais um emprego, mas uma "empregabilidade".

Poderíamos acrescentar, nessa análise dos problemas de nossas grandes e médias cidades, o fato estrutural de o Brasil, dos anos 50 em diante, ter optado pela prioridade ao transporte individual.

Que cidade há de suportar os custos de tantos automóveis jogados todo mês sobre as ruas cada vez mais precárias de nossas maltratadas aglomerações urbanas?

Como falar em cidades sustentáveis com esse "modo de produção automobilístico"?

Tratar desse modelo, enfrentar as contradições dele decorrentes, vai se tornando algo incontornável, e de algum modo as ruas estão dizendo isso.

Frotas de ônibus precárias, metrôs precários, e alguns que nunca terminam e nem se expandem, cidades inteiramente travadas pelos carros, os trabalhadores jogados para periferias distantes, e os jovens, de que falamos aqui, sem condições mínimas de locomoção.

Estavam ou não postas as condições para a movimentação que estamos assistindo nos últimos dias?

E aqui falamos das condições materiais, objetivas, nem sequer tratarmos das outras, de uma sociedade em rede, articulada na internet, sob a influência de um movimento que é mundial, que tem se repetido em tantos países.

Essa parcela do nosso povo que assaltou as ruas, especialmente a juventude, quer participar da vida política, e a estrutura política do Parlamento brasileiro, que dá mostras de falência há muito tempo, permanece irredutivelmente ancorada no financiamento privado.


Isso tem limitado a participação dos jovens, das mulheres, de lideranças sindicais e comunitárias, dos índios, dos negros, dos trabalhadores rurais, e torna o Parlamento – aqui falamos da Câmara Federal, do Senado, das assembleias legislativas, das Câmaras de Vereadores – uma casta elitista, distante das maiorias, cada vez mais afastado do povo, voltado a conciliábulos dominantes, sem maiores preocupações com os humores e a sorte das maiorias.

E quando digo isso, o faço em defesa da política e dos partidos, e sem desprezar o esforço em favor da reforma política feito pelo PT, que está com uma campanha nas ruas para tanto.

Creio que as ruas deviam expressar essa demanda, mas só elas é que podem dizer se a querem. O PT tentará viabilizar um projeto de iniciativa popular.

Sem canais efetivos de participação política, as multidões ganham as ruas, e expressam também insatisfação com os mecanismos de representação.

Pode nos preocupar, claro, o surgimento de clamores contra partidos, normalmente uma bandeira da direita e até da extrema-direita. Mas, isso não pode nos levar, de modo nenhum, a não compreender esse sentimento – tem a ver com o modo de fazer política no Brasil, com o desprezo que as elites políticas, ou ao menos a maioria delas, devotam aos anseios populares, e com o fato de que no Parlamento brasileiro poucos se perguntam por que lideranças populares não têm condições de se eleger – não tiveram ontem, não tem hoje.

E não custa lembrar que multidões, no resto do mundo, tem manifestado a mesma reação diante das formas tradicionais do fazer político, evidenciando não uma crise da política, mas a emergência de multidões que pretendem imprimir outro rumo à política.

As ruas estão, a seu modo, e um modo novo, particular, o da emergência das multidões, ressignificando a política, dando recados fortes e revelando a gravidade da crise de representação em que estamos imersos, e que o Parlamento brasileiro tem uma enorme dificuldade para compreender, até por seus compromissos, por seus interesses de classe. Não está entendendo o momento.

O financiamento privado é um câncer que corrói a política, que faz esquecer a essencialidade da política para a convivência dos povos, que não podem ainda prescindir dela para a vida em sociedade.

Ocupar as ruas é uma maneira de dizer que se pretende participar da vida política.

A reforma política, insista-se, é fundamental para fortalecer a democracia em seu sentido substantivo, e ela deve acontecer, esperamos, com intensa participação popular, inclusive da nossa juventude e dos chamados trabalhadores imateriais a que se refere Cocco.

Ao falar nesse Parlamento elitista, peço licença para lembrar o Marx de o 18 Brumário:

O regime parlamentar deixa tudo à decisão das maiorias, como então as grandes maiorias fora do parlamento não hão de querer decidir?

Quando se toca música nas altas esferas do estado, que se pode esperar dos que estão embaixo senão que dancem?

A par de tudo isso, sem dúvida, os partidos foram surpreendidos por essas mobilizações da juventude porque elas fugiram dos moldes tradicionais. 

Ocorreram pelos caminhos da rede, do acúmulo da articulação das lutas pela internet, que vão se tornando o canal de organização e mobilização das multidões, e estas, em geral, não se guiam por lideranças específicas, senão pela lógica que o movimento delas mesmas vai impondo.

Talvez, correndo todos os riscos, caiba recorrer a dois teóricos da Multidão, Michael Hardt e Antonio Negri, no livro Multidão: Guerra e democracia na era do Império, à página 426:

Na multidão, contudo, nunca existe qualquer obrigação em princípio em relação ao poder. Pelo contrário, na multidão o direito de desobediência e o direito à diferença são fundamentais.

A constituição da multidão baseia-se na constante possibilidade legítima de desobediência e o direito à diferença são fundamentais. (...)


A obrigação só surge para a multidão no processo decisório, em consequência de sua vontade política ativa, e a obrigação dura enquanto durar essa vontade política.

A criação da multidão, sua inovação em redes e sua capacidade de tomada de decisão em comum tornam hoje a democracia possível pela primeira vez.

Creio que esses movimentos recentes estão mais vinculados à lógica da multidão que qualquer outra coisa.

Quem quiser influir, tem que entender essa lógica e a cada momento decidir junto com ela.

Não me iludo de achar que não existam esforços da direita brasileira ali dentro. Na rede há de tudo.

Acho acertada a decisão do PT de participar dessas lutas.

As muitas bandeiras giram em torno da democracia, da participação, da melhoria dos serviços públicos, e servem à oxigenação da política.

E mais: essa sociedade consumista não pode agradar à juventude, e creio que as bandeiras se estenderão, se tornarão ainda mais amplas, e quem mais sabe, mais políticas e mais acertadamente estruturais.

A juventude, a militância toda do PT, se souberem entender a lógica das multidões, as lutas articuladas em rede, e creio que saberão, poderão contribuir para que não haja qualquer tipo de manipulação à direita, e o Movimento Passe Livre chegou a repudiar quaisquer tentativas autoritárias à direita, inclusive criticando atitudes antipartidárias.

As manifestações não nasceram anti-PT, nem anti-Dilma, embora, por variados caminhos, os atinja também.

Mas, se o governo e o PT souberem ouvir o clamor da multidão podem se afinar com ela, nem que parcialmente.

A resposta do governo Dilma, da presidenta em particular, foi muito positiva, especialmente a ideia do plebiscito e da Constituinte exclusiva para a reforma política, antiga proposta do PT, que não acreditava, como não acredita, na possibilidade de o Congresso se modificar por dentro, nas condições da composição de hoje.

Parece, no entanto, que as tradicionais elites políticas brasileiras recusam a proposta da Constituinte exclusiva, embora, parece, não tenham condições de evitar o plebiscito. A presidenta deu respostas também à questão da mobilidade urbana, do transporte coletivo, pontos fundamentais postos pelas ruas.

Dou uma última palavra a respeito de nossa mídia conservadora, do escândalo que ela protagonizou nos últimos dias.


Primeiro, quase de modo uníssono, clamou contra os terroristas, vândalos, anarquistas, e celebrou, cobrou que a Polícia interviesse. Alckmin obedeceu, e o pau comeu. 

Mas, aí, ela sentiu também o impacto das ruas, sua grandiosidade, e mudou o discurso.

É um paradoxo ver a Rede Globo, depois da primeira fase, a da celebração da repressão, elogiar o movimento, defender a democracia direta, atacar Dilma e o PT, defender o Ministério Público, esculhambar a política, vergonhoso. Embora, é claro, não valha apenas para a Rede Globo, atinge quase toda a velha mídia.

Curioso, revelador da natureza do movimento, é que a Rede Globo, até o momento em que escrevo esse texto, não pôde nem cobrir diretamente as manifestações, até porque os participantes sabiam com quem estavam lidando, e poderiam ser tentados à violência, que chegou a ocorrer em alguns  
casos contra veículos da velha mídia.

A Rede Globo cobriu os atos utilizando-se de precárias imagens de celulares.

Pudéssemos aconselhar, e só poderíamos no momento das assembleias da multidão, e diríamos que a Rede Globo e toda a mídia deviam cobrir tranquilamente os protestos até para que se desnudassem de modo claro desde o primeiro momento.

O que a Rede Globo e a Veja e a Folha e o Estadão não podem é dar lições de democracia a ninguém, e muito menos tentar dirigir a pauta da multidão contra o governo Dilma e contra a política.

A multidão, se o fizer, o fará legitimamente, e haverá no meio dela quem discorde e se manifeste.

Não a mídia, que esteve sempre ao lado do autoritarismo, que implantou a ditadura lado a lado com os militares, que foi conivente com estes, sempre.


E as ruas disseram isso.

Disseram que a mídia vive também, e já de algum tempo, uma grave crise de representação.

Ninguém acredita mais que ela cubra acontecimentos.

Ela sempre toma posição a priori, e sempre contra os interesses da população, especialmente dos mais pobres. 

Esperemos que no decorrer dessa movimentação, que ainda prossegue, todos tiremos lições.

Seguramente, o governo Dilma já está demonstrando que está tirando.

Há de se melhorar os serviços públicos.
Há de se dar prioridade ao transporte coletivo.
Há de se mudar a estrutura das cidades.
Há de se ampliar ainda mais o direito à educação, sobretudo sua qualidade. Há de se encontrar meios para o financiamento mais adequado da saúde.
Há de se ampliar o acesso à cultura para os nossos jovens pobres.
Há de se assegurar o acesso à internet para todos.
Há de se mudar nossa polícia, tirando-lhe sua natureza essencialmente repressiva, e acabar com a matança de jovens negros e pobres nas periferias.
Há de se lutar contra com esse pensamento punitivo que pede mais e mais cadeia.

E há que se reforçar a natureza laica do Estado, insurgindo-se, todos nós, contra essa agenda do medievo trevoso que tenta se impor com Estatuto do Nascituro;
- com essa proposta absurda, estúpida de Cura Gay;
- com essa ideia da redução da maioridade penal.

E todos devemos nos por a favor dos direitos das mulheres e do movimento LGBT, que não podem se submeter a nenhuma religião.
- Os corpos das mulheres não podem estar sujeitos a intervenções que elas não desejem.
- A Inquisição ficou no passado, e é de triste memória.
- As religiões tem todo o direito de existir e se manifestar, nunca de tentar atingir os alicerces do Estado laico.

Que as ruas continuem a nos animar para aprofundar a democracia, e esta não pode ser mero adereço eleitoral, mas algo que implique necessariamente a participação popular – que se ouça de fato a voz das multidões, uma voz que não se restringe ao Brasil.

Estamos apenas sendo, agora, parte do mundo, cujas multidões irrompem por todos os lados, e temos que saber lidar com isso – e fazê-lo com mais e mais democracia.

Não há remendos possíveis. As multidões, com sua febre democrática, vieram pra ficar.

Fonte:
http://www.brasil247.com/pt/247/bahia247/106957/O-viver-arriscoso-das-multid%C3%B5es.htm

terça-feira, 2 de julho de 2013

Entrevista com Giuseppe Cocco

25/06/2013 - Mobilização reflete nova composição técnica do trabalho imaterial das metrópoles
- entrevista especial com Giuseppe Cocco
- Instituto Humanitas Unisinos

Foto: Marcelo Say - Epa
Não estamos diante da “falência da política. Ao contrário, trata-se da persistência da política! Diante de tudo que os partidos de esquerda fazem para fornecer munições ao velho discurso antidemocrático e moralista da elite, esses movimentos mostram que a política está viva, apesar dos Felicianos, dos Aldos, da tecnocracia neodesenvolvimentista e da corrupção”, avalia o cientista político.

Confira a entrevista.

Na tentativa de compreender as razões que levaram milhares de cidadãos brasileiros às ruas, o sociólogo Giuseppe Cocco, que estuda o conceito de multidão abordado pelo italiano Antônio Negri, elenca algumas possibilidades.

Na avaliação dele, o ciclo de “revoluções 2.0”, com base na internet, “começa a ter uma duração consistente (de mais de 3 anos) e entrou no imaginário, na linguagem de gerações de jovens que não formam mais suas opiniões na imprensa, mas diretamente nas redes sociais”.

Outro aspecto importante é o fato de jovens brasileiros só terem conhecido “o Brasil de Lula”.

E dispara: “No Brasil, o PT e seu governo (e sua coalizão) pensavam estar blindados pelos recentes sucessos eleitorais (a eleição de Haddad, a reeleição quase plebiscitária do Paes, no Rio), por estar num ciclo econômico positivo e por ter achado que o sagrado graal do ‘novo modelo’ econômico seria, na realidade, reeditar o velho nacional-desenvolvimentismo, rebatizado de neodesenvolvimentismo”.

De acordo com Cocco, havia e há no Brasil “um sem número de movimentos de protesto e resistência, em particular por causa dos efeitos dos megaeventos, e hoje esses movimentos se juntaram, confluindo com a multidão da nova composição do trabalho metropolitano”.

Na entrevista a seguir, concedida à IHU On-Line por e-mail, ele assinala que os protestos ganharam força a partir do Movimento Passe Livre [http://www.ihu.unisinos.br/noticias/521290-movimento-passe-livre-vai-para-a-periferia] porque “a questão dos transportes e, mais em geral, do serviços é estratégica para o trabalho metropolitano”.

E esclarece: “Os operários fordistas lutavam por salários e horários. Os trabalhadores imateriais têm como fábrica a metrópole e lutam pela qualidade de vida da qual dependerá a inserção deles em um trabalho que não é mais um emprego, mas uma ‘empregabilidade’. Os operários fordistas lutavam para reduzir a parte do horário que ia embutida como lucro nos carros que produziam; os trabalhadores imateriais nas metrópoles desviam os slogans publicitários de uma montadora (‘Vem Pra Rua’) para ressignificar os agenciamentos produtivos que se desenham na circulação”.


Foto: amaivos.uol.com.br
Giuseppe Cocco (foto) é graduado em Ciência Política pela Université de Paris VIII e pela Università degli Studi di Padova.
É mestre em Ciência, Tecnologia e Sociedade pelo Conservatoire National des Arts et Métiers e em História Social pela Université de Paris I (Panthéon-Sorbonne).
É doutor em História Social pela Université de Paris I (Panthéon-Sorbonne).
Atualmente é professor titular da Universidade Federal do Rio de Janeiro – UFRJ e editor das revistas Global Brasil, Lugar Comum e Multitudes. Coordena a coleção A Política no Império (Civilização Brasileira).

Confira a entrevista.

IHU On-Line – Manifestações sociais massivas descontentes com a política e a economia iniciaram no Oriente, na Espanha, em Wall Street. E agora chegam ao Brasil. Por quê? O que estas manifestações sociais representam?

Giuseppe Cocco – Podemos logo começar dizendo que o que caracteriza essas manifestações é que elas não representam exatamente nada ao passo que, por um tempo mais ou menos longo, elas expressam e constituem tudo.

O primeiro elemento é este: elas têm uma dinâmica intempestiva, fogem a qualquer modelo de organização política (não apenas os velhos partidos ou os sindicatos, mas também o terceiro setor, as ONGs) e afirmam uma democracia radical articulada entre as redes e as ruas: autoconvocação e debates nas redes sociais, participação massiva às manifestações de rua, capacidade e determinação de enfrentar a repressão e até capacidade de construção e autogestão de espaços urbanos como foram a Praça Tahrir, as acampadas espanholas e as tentativas do Occupy Wall Street e, enfim, a Praça Taksim em Istambul, na Turquia.

Para cada uma dessas ondas e dessas que chamamos de “primaveras”  houve um estopim específico, mas todas dispõem de uma mesma base social (por mais diferenciadas que sejam as trajetórias socioeconômicas dos diferentes países) e dos mesmos processos de subjetivação.

No caso do Brasil, todo mundo sabe que o estopim foram os protestos contra o aumento do preço das passagens nos transportes públicos. Como foi o caso de outras marchas, a manifestação em São Paulo foi violentamente reprimida pela Polícia Militar. Só que dessa vez a faísca não se apagou numa “marcha da liberdade” e incendiou São Paulo e todo o país. Mas saber que o estopim foi esse não nos permite avançar na análise.

Por que agora? É difícil responder e talvez a característica própria desse tipo de movimento é que ninguém sabe propor razões “objetivas” indiscutíveis. Contudo, podemos avançar três explicações: a primeira explicação tem a forma de um segundo “estopim” e é a quase coincidência do episódio da repressão da marcha pelo passe livre em São Paulo com a renovação das primaveras árabes e do 15M espanhol nas lutas duríssimas da multidão turca na Praça Taksim, em Istambul (não por acaso, na segunda manifestação carioca, que já reunia 10 mil pessoas, um dos gritos era: “acabou a mordomia, o Rio vai virar uma Turquia”);

uma segunda explicação está no fato que esse ciclo de “revoluções 2.0” começa a ter uma duração consistente (de mais de 3 anos) e entrou no imaginário, na linguagem de gerações de jovens que não formam mais suas opiniões na imprensa, mas diretamente nas redes sociais; a terceira explicação é mais consistente e a mais importante e diz respeito ao que são essas “novas gerações” no Brasil de hoje, ou seja, essas gerações de jovens que só conheceram o Brasil de Lula. O que é incrível e até irônico é que o próprio PT não tenha previsto isso e ainda hoje seja incapaz de enxergar esse dado importantíssimo.

IHU On-Line – Quais as aproximações e diferenças entre as manifestações brasileiras e as que vêm ocorrendo em outros países?

Giuseppe Cocco – As aproximações são mais importantes do que as diferenças, que apenas enfatizam a qualidade específica de cada evento.

Num primeiro nível, há em comum a articulação entre as redes e as ruas como processo de autoconvocação das marchas e manifestações que ninguém consegue representar, sequer as organizações que se encontraram no cerne da primeira chamada: a tentativa de “empoderar” os rapazes do Movimento pelo Passe Livre em São Paulo (“oficializados” pela presença no Roda Viva e a negociação com prefeitura e estado) mostrou que eles não controlam nem dirigem um movimento que se autorreproduz de maneira rizomática (as manifestações aconteciam ao mesmo tempo sem respeitar qualquer tipo de “trégua”).

Num segundo nível, há em comum o esgotamento da representação política. No Brasil, esse fenômeno foi totalmente subavaliado pela “esquerda” e, sobretudo, pelo PT porque não o entenderam (e não o entendem).

Inicialmente pensaram que fosse um problema das autocracias do Norte da África (Tunísia e Egito); depois que fosse a incapacidade dos socialistas espanhóis (PSOE) de responder de maneira soberana às injunções das agências internacionais de notação ou do Banco Central Europeu.

Depois pensaram que o 15M espanhol não consegue encontrar uma nova dinâmica eleitoral ao passo que o partido de Beppe Grillo mostrou na Itália um fenômeno eleitoral totalmente novo e desgovernado.

Em seguida, pensaram que o Egito e a Tunísia foram normalizados eleitoralmente pelo islamismo conservador e aí aparece o levante turco contra o governo islâmico moderado.

No Brasil, o PT e seu governo (e sua coalizão) pensavam estar blindados pelos recentes sucessos eleitorais (a eleição de Haddad, a reeleição quase plebiscitária do Paes, no Rio), por estar num ciclo econômico positivo e por ter achado que o sagrado graal do “novo modelo” econômico seria, na realidade, reeditar o velho nacional-desenvolvimentismo, rebatizado de neodesenvolvimentismo.

O que a esquerda como um todo, e o PT no Brasil não entenderam, é que a crise da representação é geral (mesmo que ela tenha sintomas e manifestações diferenciadas), e que os levantes da multidão no Egito, na Tunísia, na Espanha, na Turquia e agora no Brasil são a expressão, entre outras coisas, de uma recusa radical dessa maneira autorreferencial de pensar por parte dos governos e dos partidos políticos.

Num terceiro nível há a principal proximidade entre todos esses movimentos: a base social dessa produção de subjetividade é o novo tipo de trabalho que caracteriza o capitalismo cognitivo.

As redes que protestam e se constituem nas ruas de Madri, Lisboa, Roma, Atenas, Istambul, Nova York e agora de todas as cidades brasileiras são formadas pelo trabalho imaterial: estudantes, universitários, jovens precários, imigrantes, pobres, índios, ou seja a composição heterogênea do trabalho metropolitano.

Não por acaso, por um lado, uma de suas formas principais de luta foi a “acampada” ou o “occupy” e, por outro, os levantes turco e brasileiro tiveram como estopim a defesa das formas de vida da multidão do trabalho metropolitano: a defesa do parque contra a especulação imobiliária (a construção de um shopping) em Istambul, e a luta contra o aumento do custo dos transportes, no caso do Brasil.

Diante dessas aproximações, as diferenças são bem menores, embora elas existam (e sejam até óbvias).

Podemos apreender essas diferenças do ponto de vista das condições objetivas da cada país e do ponto de vista de como cada um desses movimentos foi transformando (ou não) a fase destituinte em momento constituinte. Assim, o 15M espanhol se apresenta como a experiência que mais conseguiu durar apesar de não ter revertido as políticas econômicas. As revoluções árabes foram normalizadas pelas vitórias eleitorais conservadoras, mas os levantes se tornam endêmicos.

Na Turquia e ainda mais no Brasil, não sabemos – literalmente – o que vai acontecer. É no plano das condições objetivas que encontramos a maior diferença: na Espanha e, em geral, no mediterrâneo as revoluções são marcadas pelos processos de “desclassificação” das classe médias.

No Brasil é exatamente o contrário: tudo isso acontece no âmbito e no momento da emergência da “nova classe média”.

Só que essa nova composição de classe é, na realidade, a nova composição do trabalho metropolitano, lutando pelos parques ou pelos transportes públicos: ascendendo socialmente, os pobres brasileiros se tornam o que as classes médias europeias se tornam, descendo: a nova composição técnica do trabalho imaterial das metrópoles.

IHU On-Line – Além do aumento do preço das passagens, quais são os outros motivos que desencadearam as manifestações?

Giuseppe Cocco – Podemos elencar duas respostas. A primeira é a seguinte: se pensarmos bem, essa pergunta encontra sua resposta numa sua simples reformulação: “por que nas cidades e metrópoles brasileiras não há mais lutas e mais levantes pelo sem número de motivos que a justificariam?"

No Brasil, não faltam razões! Uma vez que “pegou” é só escolher, a lista é infinita.

Vou trazer apenas um exemplo, contando uma anedota: um dia fui assistir a um Fórum da UPP Social (que hoje não existe mais) em duas favelinhas da Zona Norte, bem precárias. Toda a parafernália dos governos estadual e municipal estava mobilizada, com seus carros de função, para dar sentido à pacificação. Os poucos moradores que falaram colocaram dois problemas essenciais: primeiro, disseram, vivemos no meio do esgoto; segundo, os policiais agem de maneira violenta e arbitrária.

As dezenas de secretários e outros servidores presentes não conseguiram dizer nada sobre como seria resolvido esse problema básico do saneamento. Saindo da favelinha, passei por uma centena de adolescentes que ficava sem fazer nada na entrada e, no caminho de volta ao Centro do Rio, a 5 minutos de carro, passei na frente de uma obra gigantesca, faraônica: o Maracanã!

A pergunta de cima encontra uma resposta bem igual a que colocava Keynes em 1919: “nem sempre as pessoas aceitam morrer em silêncio”.

Havia no Rio de Janeiro e no Brasil (e continua havendo) um sem número de movimentos de protesto e resistência, em particular por causa dos efeitos dos megaeventos, e hoje esses movimentos se juntaram, confluindo com a multidão da nova composição do trabalho metropolitano.

No Rio, os manifestantes sempre se juntam para dirigir invectivas pesadas ao governador Sergio Cabral e ao prefeito Eduardo Paes.

Chegamos assim à segunda resposta: o movimento foi mesmo pelos 0,20 centavos! 

Só que esse “pouco” é na realidade “muito”. Por quê?
Porque a questão dos transportes e, mais em geral, dos serviços é estratégica para o trabalho metropolitano. Os operários fordistas lutavam por salários e horários. Os trabalhadores imateriais têm como fábrica a metrópole e lutam pela qualidade de vida da qual dependerá a inserção deles em um trabalho que não é mais um emprego, mas uma “empregabilidade”.

Os operários fordistas lutavam para reduzir a parte do horário que ia embutida como lucro nos carros que produziam; os trabalhadores imateriais nas metrópoles desviam os slogans publicitários de uma montadora (“Vem Pra Rua”) para ressignificar os agenciamentos produtivos que se desenham na circulação.

Os operários fordistas lutavam contra o trabalho. Os trabalhadores imateriais lutam no terreno da produção de subjetividade. É na circulação que a subjetividade se produz e produz valor e renda.

IHU On-Line – Os manifestantes deixam claro que são apartidários, não querem violência e não têm lideranças. Como interpreta esse discurso? Como pensar um novo modelo político a partir dessas características?

Giuseppe Cocco – Com certeza, uma das dimensões constitutivas da Revolução 2.0 é a crise da representação e essa é uma questão central.

Precisamos lembrar que a antecipação da revolução 2.0 como crítica radical da representação é sul-americana.

O “Que se vayan todos” argentino antecipou em 10 anos o “No nos representan” espanhol.

Só que as dimensões dessa crise são processadas pelo discurso oficial – ou seja, partidário – de maneira invertida. E essa inversão não é por acaso.

Aliás, os últimos desdobramentos do movimento (as agressões contra os partidos de esquerda nas manifestações do dia 20 de junho) nos mostram muito bem como funciona essa inversão.

Os partidos (sobretudo aqueles que estão no governo) dizem que esses movimentos são limitados porque recusam os partidos, não são “orgânicos”, porque têm uma “ideologia” que os recusa e, portanto, são potencialmente antidemocráticos. Obviamente, isso é correto. Só que, a afirmação correta esconde duas belas falsificações.

A primeira também é óbvia: os “grupos” que rezam por uma crítica fundamentalista da representação têm pouca consistência social e nenhuma capacidade de determinar, sequer influenciar, movimentos desse tamanho.

A segunda falsificação é uma consequência dessa primeira: os partidos atribuem a crise da representação a um processo e a uma crítica que viria de fora, quando na realidade os maiores e únicos responsáveis dessa crise são eles!

E a responsabilidade está na indiferenciação da clivagem direita/esquerda, ou seja, no fato de os governos mudarem e continuarem fazendo as mesmas coisas, inclusive com a reciclagem das mesmas figuras políticas.

Assim, o PSOE espanhol atribuiu ao 15M sua derrota eleitoral, quando na realidade o 15M é apenas a consequência do fato que os socialistas espanhóis faziam a mesma política econômica da direita.

É exatamente o que acabou acontecendo no Brasil de Lula e, sobretudo, de Dilma. O movimento que nasceu com a luta contra o aumento recusa as dimensões autoritárias e arrogantes das coalizões e desses consensos que reúnem direita e esquerda na reprodução dos interesses de sempre.

É o Haddad que devia representar o novo e se apresenta junto ao Alckmin para juntos dizerem a mesma coisa: que a redução da tarifa terá um custo (sic!).

É a coalizão conservadora que governa o estado e a prefeitura do Rio, e onde o PT planeja e executa remoções de pobres, desrespeitando a própria LOM.

São as alianças espúrias com os ruralistas de um ministro de esquerda.

É a condução autoritária das megaobras e dos megaeventos.

É a entrega da Comissão de Direitos Humanos da Câmara a um fundamentalista que, exatamente no dia seguinte da grande manifestação da segunda-feira, fez votar o projeto de Lei que define a homossexualidade como uma doença.

A esquerda e a incapacidade
A extrema esquerda ou a esquerda radical erram quando pensam que estão “salvas” dessa situação.

Os partidos de esquerda são incapazes de entender que esse movimento se forma na recusa – confusa, flutuante, ambígua e até perigosa – do partido, da organização separada, da bandeira. Isso porque a recusa é geral, não faz distinções e funciona como rejeição de qualquer plataforma ideológica preparada e determinada por lógicas de aparelhos separados: nisso há uma percepção de que um dos problemas da política é a construção de aparelhos que tendem – antes de tudo – a reproduzir a si mesmos.

A agressão de um grupo organizado ao bloco de bandeiras do PSTU, do PSOL e do PCB na marcha da quinta feira, 20 de junho, quebrou as ilusões de que a crise seria somente do PT e assustou todo o mundo.

Contudo, nesse episódio lamentável encontramos, mais uma vez, o funcionamento perverso da lógica da representação. Os grupos agressores eram claramente organizados e tinham esses objetivos tão claramente quanto o processo de organização indica as manipulações mais podres. Todas as análises e denúncias que imediatamente foram produzidas identificaram esses grupos (que claramente agiam a mando de algum desenho de provocar essa situação) com a manifestação em geral.

Sem partidos
Na realidade, o apoio genérico dos jovens à palavra de ordem “sem partidos! não tem nenhuma significação linear e ainda menos “fascista”. 

Paradoxalmente, a recusa dos partidos, inclusive dos “radicais” e de suas bandeiras, é a recusa – claro, confusa e contraditória – da homologação de direita e esquerda e uma demanda para uma “verdadeira esquerda”.

Essa demanda não é idealista e não pode ser travada com linguagens e símbolos obsoletos (as bandeiras vermelhas, por exemplo).

Para reerguer as bandeiras vermelhas, é preciso deixá-las em casa por um bom momento! A bandeira vermelha precisa abandonar sua dimensão ideal e transcendente (ou seja, vazia) e voltar a ser interna (imanente) às linguagens das lutas como eles são.

Nesse terreno é possível e necessário construir outra representação e, sobretudo, reforçar a democracia.

IHU On-Line – O senhor publicou recentemente no Twitter que “as lutas da multidão em São Paulo e no Rio são o melhor resultado dos governos Lula. Tão bom que ninguém no PT foi capaz de antecipar”. Pode nos explicar essa ideia? Trata-se da falência da política?

Giuseppe Cocco – Começando do final: não estamos diante da “falência da política". Ao contrário, trata-se da persistência da política!

Diante de tudo que os partidos de esquerda fazem para fornecer munições ao velho discurso antidemocrático e moralista da elite, esses movimentos mostram que a política está viva, apesar dos Felicianos, dos Aldos, da tecnocracia neodesenvolvimentista e da corrupção!

Ser contra o moralismo da direita não significa achar “graça” nos comportamentos imorais da esquerda no poder. Trata-se apenas de não cair nas armadilhas da direita, mas num esforço de conjunção ética dos fins e dos meios.

Esse movimento, qualquer seja seu desfecho, é o movimento da multidão do trabalho metropolitano, o mais puro produto dos 10 anos de governo do PT.

Vamos aprofundar e esclarecer essa afirmação em dois momentos.

Num primeiro momento, essa afirmação é uma valoração positiva dos governos Lula e Dilma. Uma avaliação positiva não porque tenham sido de “esquerda” ou socialistas, mas porque eles se deixaram atravessar – sem querer – por uma série de linhas de mudança: políticas de acesso, cotas de cor, políticas sociais, criação de empregos, valorização do salário mínimo, expansão do crédito.

A esquerda radical julgava essas políticas exatamente como agora – ironicamente nesse caso até o PT – julgam a questão das “bandeiras”: idealmente.

Lula está implementando outro modelo, outra sociedade, socialista?” se perguntava e criticava. Ora, ninguém implementa modelo alternativo, mesmo quando se está no governo. Apenas pode ter a sensibilidade de apreender as dinâmicas reais que, na sociedade, poderão amplificar-se e produzir algo novo.

Os governos Lula e Dilma associaram o governo da interdependência na globalização com a produção, tímida e real, de uma nova geração de direitos e de inclusão produtiva. Estatisticamente, isso se traduziu na mobilidade ascendente dos níveis de rendimento de mais de 50 milhões de brasileiros e pela entrada de novas gerações nas escolas técnicas e universidades.

Lula não quis saber de bandeiras e até declarou que ele “nunca tinha sido socialista”. Ficou dentro da sociedade indo atrás das linguagens, dos símbolos e das políticas que entendia.

Na virada da década de 2010, esse processo se consolidou em dois fenômenos maiores: o primeiro é eleitoral e tem o nome de “lulismo”, ou seja, a capacidade que Lula tem de ganhar e, sobretudo, fazer ganhar eleições majoritárias: começando pela presidente Dilma e chegando ao prefeito Haddad;

o segundo é o regime discursivo da emergência de uma “nova classe média”, com base nos trabalhos do economista Marcelo Neri.

Com a crise do capitalismo global (2007-2008) e a chegada de Dilma ao poder, o discurso da “nova classe média” foi além das preocupações do marketing eleitoral, para tornar-se a base social de uma virada que vê, no papel do Estado junto das grandes empresas, o alfa e o ômega de um novo modelo desenvolvimentista (neodesenvolvimentista).

Economia
Sociologicamente, o objetivo do neodesenvolvimentismo é transformar os pobres em “classe média”, e para isso é preciso economicamente de um Brasil Maior, capaz de se reindustrializar.

O governo Dilma chegou a baixar os juros e multiplicou os subsídios às indústrias produtoras de bens de consumo duráveis, em particular de carros, e à construção civil.

O que o movimento afirmou e certificou foi a dimensão ilusória desse suposto modelo (isso não significa que o modelo não será implementado; significa apenas que ele perdeu a patina de consenso que o legitimava e deverá apresentar-se como cada vez mais autoritário).

No plano macroeconômico, a inflexão tecnocrática não deu muito certo, pois a tentativa de mexer nos juros resultou na volta da inflação dos preços (que está na base da revolta). A inflação dos juros e aquelas dos preços se reapresentaram como as duas faces de um impasse renovado que só uma mobilização produtiva (da qual não há sinal) pode resolver .

Nova classe média não existe
No plano sociológico, a “nova classe média” não existe, porque o que se constitui é uma nova composição social cujas características técnicas são de trabalhar diretamente nas redes de circulação e serviços da metrópole.

A figura econômica (a “média” da faixa de renda) esconde o conteúdo sociológico de uma inclusão produtiva que não passa mais pela prévia implementação na relação salarial.

Esse trabalho dos incluídos enquanto excluídos é um trabalho de tipo diferente: ele é precarizado (do ponto de vista da relação de emprego); imaterial (do ponto de vista que depende da recomposição subjetiva e comunicativa do trabalho manual e intelectual) e terciário (do ponto de vista da cadeia produtiva, aquela dos serviços).

A qualidade da inserção produtiva desse trabalho depende diretamente dos direitos prévios aos quais têm acesso e que, ao mesmo tempo, ele produz, como, por exemplo, poder circular pela metrópole.

É exatamente essa composição técnica e social do trabalho metropolitano o que constitui a outra face da “nova classe média” oriunda do período Lula.

Ao mesmo tempo em que ela foi a base eleitoral das sucessivas derrotas do neoliberalismo, ela é também hoje, na sua recomposição política, a oposição ao neodesenvolvimentismo.

Para ela, a questão da mobilidade urbana tem a mesma dimensão que tinha o salário para os operários ao mesmo tempo em que o segmento estratégico é aquele dos serviços.

As cidades e metrópoles brasileiras – e não a reindustrialização – constituem o maior gargalo, ao mesmo tempo social, político e econômico.

A ideologia e a coalizão de interesses que estão com a presidente Dilma não mostraram, até agora, a menor capacidade de enxergar esse dado.

Mais do que isso, essa nova composição do trabalho imaterial e metropolitano produz, a partir de formas de vida, outras formas de vida.

Por isso, o movimento do passe livre, como aquele de Istambul que defendia um parque, foi juntando todos os focos de resistência que existem nas metrópoles, até se espalhar – como está fazendo nesse momento, dramaticamente e assustadoramente – pelas periferias onde nunca teve manifestação de massa nenhuma.

O que esse “levante” da multidão do trabalho imaterial nos mostra é que o “legado” destes últimos dez anos de governo está em disputa, e que o mais interessante é ficar por dentro dessas alternativas, em vez de querer colocar uma ou outra bandeira.

A política e os movimentos estão dentro e contra. Por exemplo, pensemos a questão dos megaeventos, das copas e olimpíadas.

Muitos dos focos de resistência nas metrópoles são movimentos que criticam os gastos com obras, estádios, favelas que resistem contra as remoções etc. 

Ao mesmo tempo, a possibilidade de o movimento ter acontecido sem uma repressão brutal, por enquanto, se deve também à Confederation Cup. Mais uma vez, o conflito é dentro e contra.

IHU On-Line – O que é possível vislumbrar para o cenário político a partir das manifestações?

Giuseppe Cocco – Creio que o evento é tão potente e imprevisto que ninguém saberá responder a essa pergunta. Sobretudo neste momento: a cada dia e talvez a cada hora mudam alguns dados fundamentais.

O que podemos dizer é que o cenário eleitoral de 2014 até 2018 estava desenhado e as variáveis vislumbradas eram aquelas macroeconômicas. O movimento se convidou para essa discussão. Só que não há ninguém que possa sentar nessa eventual mesa dizendo que o representa.

A terra tremeu e continua tremendo, só que a fumaça levantada não nos deixa ainda ver quais prédios cairão e quais ficarão em pé. Nesse cenário, podemos fazer duas conjeturas.

Numa primeira, a presidente Dilma pode abrir pela esquerda, por exemplo, com uma reforma ministerial que colocaria pessoas qualificadas e altamente progressistas em ministérios-chave como a Justiça, Cidade e Transportes, MinC e Educação, convocando a sociedade a se constituir – em todos os níveis possíveis – em assembleias participativas para discutir as urgências metropolitanas.

Na segunda (que me parece ser aquela anunciada pelo pronunciamento do dia 21 de junho), ela se limita a reconhecer a existência de outra composição social no movimento e a construção de um grande pacto sobre os serviços públicos, mas não anuncia nada de novo a não ser algumas bandeiras de longo prazo (a destinação de 100% dos royalties do petróleo para a educação) e enfatiza a questão da ordem: repressão dos “violentos” e respeito pelos megaeventos (ou seja, mais repressão).

E isso depois dos fatos bem sombrios da quinta-feira (aparição desses grupos pagos para agredir os partidos e, no Rio, repressão generalizada da manifestação perseguindo a centenas de milhares de participantes durante toda a dispersão).

O cenário que vislumbro é pessimista: parece-me que boa parte dos militantes de esquerda está caindo na armadilha das “bandeiras”, e que isso acabará por realmente entregar o movimento à direita e, por cima, haverá repressão, eventualmente também das opiniões.

Nesse cenário muito provável, para salvar a si mesmos e evitar uma renovação geral, as burocracias e outros fisiologismos encastelados nos diferentes governos e coalizões, estão destruindo as possibilidades de uma grande renovação da esquerda e levando todo o mundo de roldão no buraco que será o resultado eleitoral de 2014.

Foto: Natália Scholz
Mas quero muito estar errado.
Se for verdade que estou errado, serão as lutas da multidão que o dirão e o cenário que elas têm de enfrentar é muito, muito complexo.

Fonte:
http://www.ihu.unisinos.br/entrevistas/521331-mobilizacao-reflete-nova-composicao-
tecnica-do-trabalho-imaterial-das-metropoles-entrevista-especial-com-giuseppe-cocco


Leia também:http://www.brasileducom.blogspot.com.br/2013/06/alipio-freire-fortalecer-presidente.html

http://www.brasileducom.blogspot.com.br/2013/06/o-extase-da-conexao-nas-ruas.html