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terça-feira, 17 de dezembro de 2013

Nas escolas, o beabá dos direitos humanos

10/12/13 - ONU: “Necessitamos que a educação nas escolas ensine direitos humanos”
- Danilo Mekari - Portal Aprendiz

“Necessitamos que a educação nas escolas ensine direitos humanos e respeito mútuo e inspire as e os jovens a serem líderes a favor da igualdade.” 

É o que defende Nadine Gasman [foto acima], representante da ONU Mulheres no Brasil, sobre o papel do ensino na erradicação da violência contra mulheres e meninas.

Na data em que se encerra a campanha “16 Dias de Ativismo”, que envolveu mais de 130 países em ações simultâneas em prol de maior comprometimento social para prevenir, punir e erradicar a violência de gênero, Nadine falou ao Portal Aprendiz sobre os desafios que o Brasil enfrenta para reverter a questão.

Uma mulher morta a cada duas horas.

Em comparação a outros países, o Mapa da Violência 2012 apresenta o Brasil na sétima posição em um ranking que mede a ocorrência de assassinatos de mulheres em 84 nações. Só na última década, mais de 43 mil brasileiras foram vítimas de homicídio, o equivalente a uma mulher morta a cada duas horas, em sua maioria no ambiente doméstico.

É preciso reconhecer que a violência contra as mulheres e meninas é uma expressão de um fenômeno social e cultural de exercício de poder e subordinação entre homens e mulheres, que implica em violações de múltiplos direitos humanos e que não é natural, aceitável ou tolerável em nenhuma cultura, classe social ou religião.

No Brasil, segundo pesquisa realizada pelo DataSenado, aproximadamente uma em cada cinco mulheres já foi vítima de violência doméstica ou familiar provocada por um homem.

Os percentuais mais elevados foram registrados entre as mulheres que possuem menor nível de escolaridade, entre as que recebem até dois salários mínimos e entre aquelas que têm idade de 40 a 49 anos.

No entanto, a própria pesquisa demonstra que a violência está presente em todas as classes sociais”, afirma Nadine.

De acordo com ela, o fim da violência contra as mulheres será uma realidade “à medida que mais pessoas a considerarem inaceitável e passível de ser evitada, e à medida que mais agressores receberem a punição devida”.

Abertura oficial da campanha "16 Dias de Ativismo" em Novo Hamburgo (RS)

Leia mais:
Campanha 16 Dias de Ativismo pede fim de violência contra mulheres

Portal Aprendiz – Qual a importância da Campanha 16 Dias de Ativismo no contexto brasileiro de combate à violência contra a mulher? Quais ações ocorreram durante esse período?

Nadine Gasman – A campanha é uma forma chamar a atenção da comunidade internacional para que se conscientize e se esforce para combater a violência contra as mulheres fortalecendo o marco dos direitos humanos.

Diversas ações foram realizadas por diferentes pessoas, grupos sociais, instituições públicas e privadas.

(Veja aqui um mapa interativo com as ações que ocorreram no dia 25/11).

Entre as atividades da campanha estavam marchas com o objetivo que denunciar os altos índices de violência praticados contra a mulher no Brasil.

Aprendiz – Como realizar um trabalho educativo com crianças e adolescentes, a longo prazo, que vise eliminar a violência de gênero? E, para além disso, como levar essa educação para a sociedade como um todo?

Gasman - Para citar a Secretária Geral Adjunta das Nações Unidas e Diretora Executiva da ONU Mulheres, Phumzile Mlambo-Ngcuka, [foto] “necessitamos que a educação nas escolas ensine direitos humanos e respeito mútuo, e inspire as e os jovens a serem líderes a favor da igualdade."

"Necessitamos oportunidades econômicas equitativas e acesso à justiça para as mulheres.

Necessitamos escutar a opinião delas.

Necessitamos mais mulheres na política, na polícia e nas forças de manutenção da paz”.

Temos que envolver os Ministérios da Educação para garantir que os direitos humanos, a educação sexual, a igualdade de gênero e a resolução não violenta de conflitos sejam temas centrais nos currículos em todos os níveis da educação.

Os professores e professoras também precisam receber formação para ensinar sobre esses temas.

Aprendiz –  Qual a avaliação da ONU Mulheres acerca dos sete anos de implementação da Lei Maria da Penha? Quais os principais desafios a serem superados?

Gasman – A Lei Maria da Penha é citada entre as três melhores legislações do mundo com relação ao enfrentamento à violência contra as mulheres no relatório “O Progresso das Mulheres no Mundo 2008/2009″, junto com a lei da Violência Doméstica na Mongólia (2004) e a lei de Proteção contra a Violência na Espanha (2004).

É realmente uma lei especial, porque 98% da população a conhece e sabe que a violência contra as mulheres é um crime passível de punição.

A Lei Maria da Penha é essencial, pois deu às mulheres a certeza de que podem falar e denunciar.

As mulheres que sofrem violência já não se sentem obrigadas a se calar e aguentar tudo sozinhas.

Elas sabem que existe proteção legal para elas, e estão se sentindo encorajadas a denunciar.

Então, o que vem aumentando é a visibilidade, a possibilidade de tornar pública a violência doméstica e buscar uma solução.

A lei é muito popular, todo mundo sabe que ela existe, e tem sido muito útil na proteção da vida e da integridade das mulheres vítimas de violência.

Porém, o sistema de justiça precisa acompanhá-la.

O sistema de justiça brasileiro reconhece de forma irregular a gravidade da violência doméstica e
familiar.

Apenas um terço dos casos que chega aos tribunais resulta em condenação, e a impunidade ainda é um problema crítico.

O Brasil tem uma rede de atendimento que tem que ser fortalecida para garantir que as mulheres que são agredidas tenham acesso a serviços integrais de qualidade.

A prioridade do governo através do programa “Mulher, viver sem violência” tem potencial de garantir esse acesso.

Fonte:
http://portal.aprendiz.uol.com.br/2013/12/10/onu-necessitamos-que-a-educacao-nas-escolas-ensine-direitos-humanos/

Nota:
A inserção das imagens, quase todas capturadas do Google Images, são de nossa responsabilidade, pois inexistem no texto original.

sábado, 17 de agosto de 2013

Governo Dilma: avanços comprovados

09/08/2013 - AVANÇOS COMPROVADOS - José  Dirceu
- no Portal Brasil 247

O discurso derrotista adotado pela oposição de que nada tem sido feito pela Educação no país é facilmente desmontado pelos próprios números do Pnud

Apesar do empenho permanente de alguns setores conservadores, em especial da grande mídia, para, dia após dia, negar os grandes avanços socioeconômicos obtidos nos últimos dez anos, sob os governos do PT, a realidade se impõe: novo estudo trazido pelo Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento (Pnud), divulgado na semana passada, mostrou progressos significativos no IDHM (Índice de Desenvolvimento Humano Municipal) brasileiro nos últimos anos, em todas as áreas pesquisadas.

O índice, que é composto por três variáveis —longevidade, educação e renda— e faz parte do Atlas do Desenvolvimento Humano 2013, cresceu 47,5% nos últimos 20 anos, com melhoras mais expressivas entre 2000 e 2010.

O índice geral —medido por uma escala que vai de zero a um, sendo que quanto mais próximo de um, melhor o desenvolvimento do local— saltou de 0,493 ("muito baixo") em 1991 para 0,612 ("médio") em 2000 e para 0,727 ("alto") em 2010.

Em todo o período, 85% dos municípios do Brasil saíram da faixa de "muito baixo desenvolvimento humano".

O componente da longevidade, relacionado à expectativa de vida da população, foi o que apresentou melhor avaliação, passando de 0,662 em 1991 para 0,727 em 2000 e 0,816 na edição atual.

Um dos fatores que contribuiu para essa melhoria foi a queda nas taxas de mortalidade infantil, especialmente nos Estados das regiões Norte e Nordeste.

De acordo com os pesquisadores, 73% dos municípios avançaram acima do crescimento da média nacional, mas se notou que 11% de municípios possuem índice superior à média do país.

A renda mensal per capita aumentou 14,2% no período, o que corresponde a um ganho de R$ 346,31 em 20 anos. Segundo dados apresentadas pelo Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea), que também participou da elaboração do atlas, o rendimento domiciliar per capita cresceu 63% acima da inflação na média dos 5.565 municípios brasileiros, entre 2000 e 2010.

Isso significa que, no período governado pelo PT, 80% dos municípios brasileiros assistiram à redução da desigualdade de renda entre seus habitantes.

O levantamento mostrou ainda que a distância que separava os mais ricos dos mais pobres encurtou quase um terço em dez anos. De acordo com o Ipea, o rendimento médio dos 10% mais ricos cresceu 60%, na média de todos os municípios, entre 2000 e 2010. Em contrapartida, a renda dos 20% mais pobres de cada município cresceu quase quatro vezes mais rápido: 217% no período.

A distância entre os indicadores das cidades com maior e menor Índice de Desenvolvimento Humano Municipal também diminuiu. A diferença entre a renda mensal per capita da cidade com maior e com menor IDHM (São Caetano do Sul, SP e Marajá do Sena, MA, respectivamente) chega a quase 21 vezes.

Embora a desigualdade ainda seja gritante, o fosso entre os municípios com melhor e pior desempenho nesse quesito já foi mais largo. Os dados do último Atlas do Desenvolvimento Humano no Brasil, referentes ao ano 2000, revelam que, há uma década, o abismo entre os dois extremos do ranking era de 28 vezes.

Em relação à Educação, ainda que tenha sido o subíndice com desempenho mais fraco na composição do IDHM, alcançando 0,637 — enquanto longevidade chegou a 0,816 e renda a 0,739 — foi também o que apresentou maior avanço no período avaliado. Em 1991, a Educação tinha um IDHM 0,279, o que representa um salto de 128% se comparado à pontuação de 2010.

O discurso derrotista adotado pela oposição de que nada tem sido feito pela Educação no país é facilmente desmontado pelos próprios números do Pnud, que refletem melhorias em todas as etapas da Educação no Brasil. Entre 2000 e 2010, a população com 18 anos ou mais que concluiu o ensino fundamental passou de 39,8% para 54,9%.

O ingresso de crianças de 5 a 6 anos na escola aumentou de 71,5% para 91,1%. Já o índice referente às crianças de 11 e 13 anos matriculadas nos anos finais do ensino fundamental subiu de 59,1% para 84,9%. E a população de 15 a 17 anos com o ensino fundamental completo avançou de 39,7% para 57,2%.

Além de programas de atenção à Educação básica, como o de alfabetização na idade certa, as políticas públicas para conter a evasão no ensino médio, a instituição do piso salarial nacional dos professores, a expansão das escolas técnicas federais e da criação do Programa Nacional de Acesso ao Ensino Técnico (Pronatec), os governos de Lula e Dilma foram os que mais fizeram para a ampliação e democratização do acesso ao ensino superior no Brasil.

O Reuni, o ProUni, os institutos técnicos federais, a Universidade Aberta do Brasil e o Fies são as iniciativas que estão possibilitando a milhares de jovens que concluem o ensino médio a possibilidade de ingressar em uma instituição de ensino superior no país.

Por tudo isso, é incoerente dizer que nada vem sendo feito.

O que se pode, sim, afirmar é que é preciso fazer ainda mais para combinar a expansão do acesso com a melhoria da qualidade do ensino, valorizar e oferecer melhores salários aos professores de todo o país, informatizar as escolas, atualizar os currículos e revisar os conteúdos pedagógicos tanto do ensino urbano quanto do rural, atendendo às suas especificidades, e diminuir as disparidades de acesso à Educação entre as regiões do país.

Os números apresentados pelo estudo, aparentemente frios em sua objetividade, revelam conquistas importantes no desenvolvimento humano das nossas cidades e é preciso afirmá-las, antes para que não se permitam retrocessos, e depois para que se possa seguir adiante, incluindo com mais qualidade milhões de brasileiros marcados por décadas de exclusão.

É possível vencer os muitos desafios que ainda temos no combate às desigualdades, na Saúde, na Educação, no Saneamento, na Infraestrutura, na Inovação e na Tecnologia, se continuarmos neste rumo certo para a construção de um Brasil melhor e mais justo.

Fonte:
http://www.brasil247.com/pt/247/brasil/111172/Avan%C3%A7os-comprovados.htm

Leia tambem:http://www.brasileducom.blogspot.com.br/2013/08/agenda-social-consolida-lideranca-de.html

http://altamiroborges.blogspot.com.br/2013/08/sinais-favoraveis-no-cenario-politico.html?spref=tw

quarta-feira, 7 de agosto de 2013

Veja a aula de jornalismo do Sakamoto

Leonardo Sakamoto 06/08/2013


Sakamoto, tudo bem?

Gosto muito do seu blog, apesar de nem sempre concordar com você. Adoro a área de direitos humanos e sempre quis fazer jornalismo para cobrir problemas sociais. Sei que é besta, mas mudar o mundo, sabe? Sei que há boas faculdades em São Paulo e meus pais têm como pagar o curso.

Mas estou em dúvida. Como você é professor de jornalismo, gostaria que me convencesse a fazer esse curso.

Abraços!

Cara, tudo bem?

Se não se importa, vou publicar no blog a resposta que te mandei, ok?

Hipoteticamente, vamos fazer de conta que exista uma faculdade de jornalismo que cobre R$ 1750,00 por mês dos alunos. É claro que nenhuma instituição em sã consciência extorquiria isso a menos que oferecesse aulas holográficas em 3D, free cupcakes nos intervalos e contasse com a presença de lêmures amestrados de Madagascar para carregar a mochila dos estudantes.

Mas façamos de conta que ela exista. Por mais profundos e interessantes que os debates possam ser nessa instituição, por mais amplo o conhecimento à disposição por lá, se você tem um terço desse dinheiro e ainda não precisa trabalhar para viver, arriscaria uma heresia para quem é professor de jornalismo: não entre na faculdade, vá viajar.

Compre um tablet, pode ser o mais vagabundo ou um usado, e baixe nele uma lista de livros que posso te indicar. Um terço serão de grandes reportagens – para inspirar. Um terço de livros sobre política, economia, cultura, sociedade – para alimentar. Um terço de livros de literatura – para viver.

Então, sozinho ou com mais alguém, vá conhecer o Brasil que nunca te mostraram porque acharam “desnecessário” ou fora de pauta. Descubra o país para além do Leblon e dos Jardins, mas também de Santa Tereza e da Vila Madalena. Sente-se para conversar com pessoas tão diferentes de você quanto possível e ouça a história de vida delas como se ouvisse a sua própria. Trabalhe como voluntária em organizações sociais na Amazônia, no Cerrado, no Pantanal, não para comprar créditos no céu, mas, simplesmente, para entender as coisas.

Por uma pequena fração dessa mensalidade, você vai conseguir viver sem luxo e com alguns apertos. É claro que terá que fazer um bico de trabalho aqui, outro ali, para completar o orçamento. Mas ganhar o pão com o próprio suor ajuda a se conceber como trabalhador – coisa que nós, jornalistas, esquecemos o tempo inteiro.

Jogue futebol em campos de várzea, nade em rios, dance loucamente em festas, de raves ao carimbó. Coma muito – por mim, é claro. Se você não tiver medo de entrar nas periferias das grandes cidades ou em pequenos povoados distantes de tudo, eles não terão medo de você. Faça amigos. Participe de protestos e manifestações por solidariedade. Ame alguém loucamente.

Daí atravesse a fronteira entre Corumbá e Puerto Suárez e adentre sua América do Sul com o peito e a mente abertos, deixando o olhar arrogante para trás. Perceba o quão somos parecidos em nossas lutas, frustrações e sonhos e se pergunte o porquê de todos os seus amigos terem ido para a Disney e não para a Bolívia ou a Colômbia. Passe frio em Ushuaia e calor em Cartagena, suba montanhas no Equador, desça ao mar na Venezuela. Vá dormir acampada com quem não tem nada e veja se eles são os baderneiros dos quais sempre ouviu falar.

Peça para visitar redações de jornais, discuta à vontade em coletivos culturais. Faça um diário de viagem e escreva tudo o que se passou por fora e por dentro. E mande notícias para seus amigos e família, com textos, fotos, vídeos, gravando, trocando impressões, usando redes sociais.

Dois anos depois, na volta, venha conversar.

Tenho plena convicção de que a atividade jornalística não deve ser monopólio de quem é diplomado, podendo ser realizada por quem não passou por uma cadeira de faculdade. Um professor de jornalismo falando isso pode ser um pouco chocante, eu sei.

Conheci, andando por esse Brasil, muita gente que nunca viu um diploma, mas que é mais jornalista com um microfone de uma rádio comunitária na mão, fazendo um pequeno jornal mural ou com um pequeno blog de notícias ou, mais recentemente, com celulares no meio de conflitos, transmitindo imagens, do que alguns que passaram quatro anos nos bancos de universidades e hoje refestelam-se atrás de cartões de visita, bloquinhos timbrados, um nome conhecido – seja de redação grande ou pequena, mainstream ou alternativa.

Refletir sobre sua profissão, dentro de uma ética específica, sabendo o que significa o papel de intermediar a informação na sociedade e ter a consciência dos direitos e deveres atrelados à liberdade de expressão são desafios que não serão aprendidos necessariamente na academia. Ou mesmo em uma redação. Mas na vivência diária, conhecendo o outro, o diferente.

Isso se chama bagagem de vida. E, por mais que seja crucial para um bom jornalismo, é o que mais falta na profissão. Seja por falta de oportunidade, seja por falta de vontade.

Não me entenda mal, por favor. Não estou desprezando a escola de jornalismo como local de estudo, pesquisa e reflexão da profissão e de seu ethos. Técnicas podem ser passadas no dia-a-dia de uma redação e em cursos de treinamento de jornalistas das empresas de comunicação. É a parte fácil da formação. Mas há outras coisas que o mercado não entende ou permite (pois passa pela subversão de seus próprios princípios) que precisam de um local para florescer. E a academia poderia suprir esse papel.

Fazer jornalismo não é só passar adiante informação. É estar preparado para analisá-la e entendê-la, coletando discursos diferentes e contraditórios e organizando-os de forma a fazer sentido. Sem se deixar levar pela aparência ou sendo usado por terceiros. E isso se aprende, principalmente, com outros exemplos feitos por quem veio antes de nós, seus erros e acertos.

O problema é que falta muito para que tenhamos escolas de jornalismo que sejam um espaço real de debate e contestação e não de reprodução de modelos de formas e narrativas que já não cabem nesse admirável mundo novo. Escolas que entendam como pode ser horrível estudar para ser tijolo de muro ou engrenagem de máquina. A educação deveria libertar mas, nesse caso, aprisiona. Por outro lado, a consciência de si e do outro como iguais é arrebatadora. E isso, como eu disse, não se aprende na carteira de uma faculdade.

Se você tem estrutura para tanto, fuja do hospital para se tratar. Adorei ter feito faculdade. E faria novamente. Isso ampliou muito minha visão de mundo e me deu amigos para uma vida. Mas sei que aprendi mais nos corredores, inclusive com os mestres, do que nas salas de aula. Considere, portanto, que o mundo é um grande corredor de faculdade.

Ter um diploma em jornalismo não significa exercer a profissão com mais ou menos ética – considerando que a maioria de nós, que fazemos grandes besteiras, frequentamos faculdades. Ao mesmo tempo, o exercício do jornalismo pode causar danos mais amplos, profundos e duradouros do que a queda de uma ponte ou um erro médico. A incompetência, preguiça ou má fé de nós, jornalistas, pode acabar com vidas de um dia para noite, ajudar a derrubar governos, detonar guerras, justificar genocídios. E a capivara de crimes cometidos por nós, jornalistas, seria melhor conhecida se, até pouco tempo atrás, não fossemos os próprios responsáveis por fazer a informação chegar à mesma sociedade que nos condenaria. Afinal, éramos os iluminados que fizeram a ponte entre a notícia e você. Até pouco tempo atrás.

Há uma série de perguntas que não estão atreladas a um diploma ou um emprego em uma grande empresa de comunicação: De que forma nós podemos garantir que a sociedade receba a melhor informação possível para tomar suas decisões? Como garantir que sejamos responsabilizados por danos causados a terceiros erroneamente? Como é possível nos perceber como trabalhadores e não como patrões? Como fazer com que nós, jornalistas, possamos entender que não somos observadores independentes da realidade? Como contar a história deste novo tempo?

Se depois que ver o mundo ainda quiser fazer faculdade de jornalismo, para organizar as ideias e ir além, serei feliz em discutir opções contigo. Mas, até lá, talvez você irá preferir outro caminho. Até porque estará muito à frente de tantas pessoas que ficam tão preocupadas em explicar o céu e a terra de olho no retrovisor do seu carro importado que não percebem que estão prestes a serem ultrapassadas por quem vem por trás, de bicicleta.

Espero não ter te convencido de nada.

Grande abraço e boa sorte!

http://blogdosakamoto.blogosfera.uol.com.br/2013/08/06/uma-leitora-pede-para-convence-la-a-fazer-jornalismo/


sexta-feira, 24 de maio de 2013

Professor vagabundo que faz greve deveria ser demitido


 Por Leonardo Sakamoto, no seu Blog


“Vagabundo que faz greve deveria ser demitido.” Algumas poucas vezes me dou ao direito de atualizar e republicar certos textos deste blog. Hoje é o caso. Pois, ouvi no trem, uma senhora reclamando destemperadamente com uma amiga dos professores da rede municipal em São Paulo, que estão em greve que começou no dia 03. Os professores pedem 17% de recomposição inflacionária dos últimos três anos. A prefeitura oferece 10,19% agora e mais 13,43% em 2014. Os sindicatos dizer que esses valores são relativos a outros acordos firmados em outros anos para incorporação de abonos. Mas, mais do que o salário de fome que ganham os professores, o que me interessa neste texto é a forma com a qual os vemos.

Quando escrevi pela primeira vez sobre isso vivíamos a greves dos mestres das universidades federais. E, é claro, essa frase nunca vem sozinha: passeata que atrapalha o trânsito? Cacete neles! Protesto em praça pública? Cacete neles! Onde já se viu? Essas pessoas têm que saber seu lugar.

Sindicatos não são perfeitos, longe disso. Assim como ocorre em outras instituições, possuem atores que resolvem voltar-se para os próprios umbigos e tornar a busca pelo poder e sua manutenção de privilégio mais importante que os objetivos para os quais foram eleitos. Ou seja, tá cheio de sindicalista pelego ou picareta, da mesma forma que empresário corrupto e sonegador. Contudo, graças à organização e pressão dos trabalhadores, importantes conquistas foram obtidas para civilizar minimamente as regras do jogo – não trabalhar até a exaustão, descansar de forma remunerada, ter salários (menos in)justos, garantir proteção contra a exploração infantil. Direitos estes que, mesmo incompletos, são chamados por alguns empregadores de “gargalos do crescimento”.

É esquizofrênico reclamar que não há no Brasil quantidade suficiente de força de trabalho devidamente preparada para fazer frente às necessidades de inovação e produtividade e, ao mesmo tempo, chutar feito caixa de giz vazia as reivindicações de professores por melhores condições e remuneração. Como acham que o processo de formação ocorre? Por osmose? Cissipartição? Geração espontânea a partir dos argumentos fedidos desse povo?

Incrível como muitos colegas, ao tratarem sobre a greve dos professores, chamam sempre as mesmas fontes de informação que dizem, sempre, as mesmas coisas: é hora de apertar os cintos, os grevistas só pensam neles, a economia não aguenta, bando de vagabundos, já para a senzala, enfim. Não existe imparcialidade jornalística. Qualquer estudante de jornalismo aprende isso nas primeiras aulas. Quando você escolhe um entrevistado e não outro está fazendo uma opção, racional ou não, por isso a importância de ouvir a maior diversidade de fontes possível sobre determinado tema. Fazer uma análise ou uma crítica tomando partido não é o problema, desde que não se engane o leitor, fazendo-o acreditar que aquilo é a única intepretação possível da realidade.

Infelizmente, muitos veículos ou jornalistas que se dizem imparciais, optam sistematicamente por determinadas fontes, sabendo como será a análise de determinado fato. Parece até que procuram o especialista para que legitime um ponto de vista. Ou têm preguiça de ir além e fugir da agenda da redação, refrescando suas matérias com análises diferentes. Ou alguém acha que é aleatório escolherem sistematicamente o professor José Pastore para analisar direitos trabalhistas?

Apoio os professores. Apoio os metalúrgicos de fábricas de automóveis. Apoio os controladores de vôo. Apoio os cobradores e motoristas de ônibus. Apoio os bancários. Apoio os garis. Apoio os residentes médicos. Apoio o santo direito de se conscientizarem, reconhecerem-se nos problemas, dizer não e entrar em greve até que a sociedade pressione e os patrões escutem. Mesmo que a manifestação deles torne minha vida um absurdo.

Por fim, estou farto daquele papinho do self-made man cansativo de que os professores e os alunos podem conseguir vencer, com esforço individual, apesar de toda adversidade, “ser alguém na vida”. Aí surgem as histórias do tipo “Joãozinho comia biscoitos de esterco com insetos e vendia ossos de zebu para sobreviver. Mas não ficou esperando o Estado, nem seus professores lhe ajudarem e, por conta, própria, lutou, lutou, lutou (às vezes, contando com a ajuda de um mecenas da iniciativa privada), andando 73,5 quilômetros todos os dias para pegar o ônibus da escola e usando folhas de bananeira como caderno. Hoje é presidente de uma multinacional”. Passando uma mensagem “se não consegue ser como Joãozinho e vencer por conta própria sem depender de uma escola de qualidade e de um bom professor, você é um verme nojento que merece nosso desprezo”. Afe. Daí para tornar as instituições públicas de ensino e a figura do próprio professor cada vez mais acessórias é um passo.

Educação é a saída, mas qual educação? Aquela defendida pelo pessoal do “Amigos do Joãozinho”? Educar por educar, passar dados e técnicas, sem conscientizar o futuro trabalhador e cidadão do papel que ele pode vir a desempenhar na sociedade, é o mesmo que mostrar a uma engrenagem o seu lugar na máquina e ponto final. Uma das principais funções da escola deveria ser produzir pessoas pensantes e contestadoras que podem colocar em risco a própria estrutura política e econômica montada para que tudo funcione do jeito em que está. Educar pode significar libertar ou enquadrar. Que tipo de educação estamos oferecendo? Que tipo de educação queremos ter? Para essa tarefa, professores bem formados e remunerados são fundamentais.

Em algumas sociedades, pessoas assim, que protestam, discutem, debatem, discordam, mudam são úteis para fazer um país crescer. Por aqui, são vistas com desconfiança e chamadas de mal-educadas e vagabundas. Ironia? Não, Brasil.

http://blogdosakamoto.blogosfera.uol.com.br/2013/05/23/professor-vagabundo-que-faz-greve-deveria-ser-demitido/



sábado, 4 de maio de 2013

Aécio e sua louca cavalgada

02/05/2013 - A louca cavalgada de Aécio
- Paulo Nogueira (*) - Diário do Centro do Mundo

Ao repetir chavões arquiconservadores como o da democracia em “risco”, ele vai se tornando um Serra com topete.

FHC está por trás das tolices ditas por Aécio?

Não acredito que FHC esteja, de fato, orientando Aécio na caminhada deste rumo às eleições de 2014.

FHC é vaidoso, está desatualizado, sofre ao se ver, tão cedo, relegado a uma nota de rodapé na história dos presidentes brasileiros.

Ele seguiu a receita de Thatcher e hoje se vê no que ela deu nos países em que não houve uma drástica mudança de rota.

Bem, FHC tem muitos defeitos – mas bobo, definitivamente, não é.

Não é possível que ele esteja por trás das tolices em série proferidas por Aécio.

Num espaço de poucos dias Aécio conseguiu se pronunciar contra a reeleição – foi FHC quem a trouxe de volta, sabemos todos a que preço – , levantou alarme sobre a inflação e agora repete a ladainha dos dias de Lacerda segundo a qual a democracia está em “perigo”.

Não faltariam bons argumentos para Aécio criticar Dilma e o PT.

Exemplo: um levantamento divulgado esta semana mostrou que o Brasil, entre 40 países, ficou em penúltimo em educação.

(A Finlândia está no topo, para confirmar a admirável supremacia da sociedade escandinava.)

Aécio poderia falar nisso.

Dez anos de PT e é isso que temos a mostrar ao mundo em educação?

Poderia também citar outro estudo segundo o qual o Brasil é o quarto país mais desigual da América Latina.

Se você é quarto na Europa, é uma coisa desagradável, mas dá para engolir. Mas ser quarto numa região já em si tão desigual como a América Latina é vexatório.

Haveria, sim, muita coisa relevante a falar.

Mas para isso Aécio teria que ler. Ou melhor, que ler as coisas certas.

Aécio parece estar repetindo coisas que são faladas por Jabor, escritas por Merval, repetidas por Reinaldo Azevedo – enfim, todos aqueles  clichês arquiconservadores por trás dos quais se esconde apenas o desejo de manter privilégios indefensáveis.

E repete o mesmo erro incrível de Serra nestes anos todos: deixou o PT sozinho para falar do tema mais importante não apenas do Brasil mas do mundo contemporâneo: justiça social.

Rapidamente, se transforma num Serra com topete.

Não pelo que tem feito, que sem dúvida poderia e deveria ser mais, mas pelas besteiras que os adversários vão cometendo em série, Dilma tende a ter em 2014 uma das vitórias mais fáceis da história das eleições presidenciais.

Se for para o segundo turno, vai ser uma surpresa.

(*) O jornalista Paulo Nogueira, baseado em Londres, é fundador e diretor editorial do site de notícias e análises Diário do Centro do Mundo.

Fonte:
- http://www.diariodocentrodomundo.com.br/fhc-esta-orientando-mesmo-aecio/

Não deixe de ler:
- FHC, Aécio e o jogo político de 2014 - Maurício Caleiro

Nota:
A inserção de imagens adicionais, capturadas do Google Images, são de nossa responsabilidade, elas inexistem no texto original.

sábado, 11 de agosto de 2012

Instituições federais de educação em greve: o que está em disputa..



André Lázaro*  
         A greve de professores das instituições federais de educação levanta o debate necessário sobre o que está em disputa neste momento na educação brasileira. Após seis anos sem qualquer paralisação por motivos salariais, a maioria das Universidades e boa parte dos Institutos Federais, além do Colégio Pedro II, estão em greve. Trata-se do esgotamento de um modelo antigo ou da crise de um novo modelo que mal se iniciou?
         A educação tem merecido atenção crescente no debate público. A crítica feroz aos resultados atuais dos estudantes da educação básica, no entanto, nem sempre se recorda dos baixíssimos investimentos e péssimo acompanhamento da qualidade que orientaram a política da educação superior nos anos de 1990. Hoje ainda colhemos frutos desses equívocos: baixa qualidade da formação de professores, disputas de mercado entre as instituições privadas com redução de custos por meio da demissão de profissionais qualificados, instituições públicas que ignoram o compromisso com a educação básica.
         Os investimentos públicos no ensino superior nos anos de 1990, sua expansão e interiorização, foram frutos dos esforços das universidades estaduais. A política que vigorou até o início dos anos 2.000 apostava no fortalecimento da iniciativa privada em educação, deixando as instituições federais à mingua. A partir do início da década passada o Governo Federal passou a investir na visão sistêmica da educação e tomou diversas iniciativas para fortalecer a educação superior, inclusive em sua articulação com a educação básica. Em destaque, a reestruturação das universidades federais pelo Reuni (Programa de Apoio a Planos de Reestruturação e Expansão das Universidades Federais), que significou mais recursos de investimento e de custeio e contratação de professores e técnicos, tanto para suprir as deficiências herdadas da década anterior quanto para sustentar a expansão em curso. Do mesmo modo, a rede de educação profissional e tecnológica, negligenciada na década de 1990, recebeu novos recursos de investimento e de custeio e contratação de pessoal. Em parceria com diversas instituições de educação superior, a Universidade Aberta do Brasil foi ampliada e a educação a distância chega a municípios bastante afastados das cidades universitárias. São iniciativas de grande porte que demandam sustentação de longo prazo e políticas de Estado para lhes darem o tempo de maturação necessário. Construir é mais demorado do que desmontar...
         Por outro lado, o Sinaes (Sistema Nacional de Avaliação da Educação Superior) ganhou consistência e consequência: mesmo instituições federais foram advertidas quando seus resultados estavam aquém do necessário. E, pela primeira vez na história do país, foram fechadas vagas em cursos de baixo rendimento, tanto em pedagogia quanto em medicina e direito.
         Hoje os estudantes no nível superior, pouco mais de 6,3 milhões, estão distribuídos entre instituições privadas, com 74,2% das matrículas, e instituições públicas, com 25,8%. As instituições públicas, no entanto, têm papel a cumprir: foram as que iniciaram ações afirmativas para inclusão da diversidade, são elas que seguem abrindo campi no interior do país, são elas que oferecem a maioria dos cursos de pós-graduação, que desenvolvem pesquisas e extensão universitárias.
         A atual expansão da educação superior recoloca questões que já estavam à mesa, mas agora se tornam urgentes visto o papel estratégico que as Instituições passam a ter no modelo que se pretende fortalecer no país. A carreira que está em debate na greve precisa ser reformulada em valores e em estrutura. É preciso valorizar adequadamente a dedicação exclusiva, oferecer as adequadas condições para as pessoas que dedicam a vida a produzir conhecimento novo (pesquisa), formar as novas gerações (ensino) e a disseminar o conhecimento pela sociedade (extensão), além de levar esse conhecimento ao setor produtivo, numa via de mão dupla (inovação tecnológica). Isso não se faz sem professor ou sem os técnicos.
         Portanto, a greve em curso deve ser lida no contexto do crescimento e da expansão, diferente de como se dava nos anos de 1990, quando havia um contexto de agonia e esfacelamento da rede federal frente ao fortalecimento do setor privado.
         Após a década de 90, repleta de greves e impasses, as negociações caminhavam para consolidar um rumo e etapas a serem cumpridas. No entanto, mudanças de governo e o trágico falecimento do secretário do planejamento que conduzia as negociações, Duvanier Ferreira (cuja morte por negligência motivou a lei recente que criminaliza a exigência de cheque caução nos hospitais) trouxeram consequências inesperadas. Parece que se perdeu o rumo da prosa e o horizonte da carreira.
         Vivemos um novo momento e a greve expressa exatamente essa tensão entre o novo e o velho. A greve atual, por mais forte que seja e mais ampla que possa se tornar, representa a necessidade de superar definitivamente tanto um desenho de carreira inadequado quanto um padrão de negociação burocratizado. A dedicação que se espera das Instituições Federais de educação superior não pode estar sujeita a variações anuais. A educação é investimento de longo prazo, inclusive – e talvez principalmente – para professores e pesquisadores que necessitam de tempo e condições para desenvolver o trabalho de ensino, pesquisa e extensão.
         O país ainda está construindo as soluções que foram negadas na década de 90. Como todo percurso histórico, o atual tem suas tensões e contradições, mas tem também uma direção: dotar o Brasil de um parque de instituições capaz de produzir inteligência e inovação, ser inclusivo de sua diversidade étnico-racial, social e cultural e se distribuir por todo o território, visando à superação das históricas desigualdades regionais.
         Este texto é uma contribuição do autor ao projeto Grupo Estratégico de Análise da Educação Superior (GEA-ES), realizado pela FLACSO-Brasil com apoio da Fundação Ford.
      *   - André Lázaroé  Professor da Faculdade de Comunicação Social da UERJ e Coordenador Executivo do GEA-ES (Grupo Estratégico de Análise da Educação Superior no Brasil) da Flacso-Brasil. Foi Diretor no MEC de 2004 a 2006 e Secretário de 2006 a 2010.

quinta-feira, 7 de junho de 2012

Considere estes países


04/06/2012 - Escrito por Otaviano Helene
- original publicado no site Correio da Cidadania

O país A tem um sistema de ensino bastante orientado pelos e para testes aplicados periodicamente aos estudantes. Como o desempenho dos estudantes nesses testes é considerado fundamental, professores são premiados ou punidos em função dos resultados obtidos por seus alunos. Escolas podem ser entregues à eficiência da administração privada com o objetivo de melhorar o desempenho dos estudantes. Com a mesma finalidade, aulas de Artes, História e atividades físicas são reduzidas em favor das disciplinas incluídas nos testes. Esse país A aplica, entre investimentos públicos e privados, 7,4% do seu PIB em educação. E, ainda, as dificuldades econômicas desse país têm sido atribuídas aos professores, que preparam mal suas crianças e seus jovens. Por causa disso e considerando os resultados dos alunos, professores ineficientes devem ser descartados rapidamente e normas e leis que dificultam ou impedem isso devem ser (e têm sido) eliminadas.

No país B não há testes padronizados aplicados às crianças. Segundo um pesquisador acadêmico desse país, caso os professores fossem avaliados a partir de teste aplicados a seus alunos, eles simplesmente abandonariam a profissão “e não retornariam até que as autoridades abandonassem essa idéia maluca”. As escolas do país B são administradas apenas pelo setor público e professores e professoras são estáveis, sendo muito difícil removê-los de suas funções. Nesse país, os professores têm liberdade do que e de como ensinar, desde que os currículos nacionais sejam respeitados. Esse país aplica, no total, 7,0% do PIB em educação e sua renda per capita é cerca de 20% inferior à renda per capita do país A.

Como se saem os estudantes desses dois países quando submetidos aos testes padronizados do Programa Internacional de Avaliação de Estudantes (PISA), (1), aplicados a estudantes de 15 anos de idade? Será que os estudantes do país A, mais rico e que tem suas escolas e professores orientados para os testes, se saem melhor? Não. Os estudantes do país B se saem melhor, até mesmo, muito melhor. Paradoxal?

Não. De fato, há aspectos fundamentais que explicam esse aparente paradoxo. Os países A e B são, respectivamente, os EUA e Finlândia (2) e os resultados obtidos no PISA aplicado em 2009 aparecem, resumidamente, na tabela 1. Os testes aplicados são em leitura, matemática e ciências e em cada um desses quesitos o desempenho dos estudantes é classificado em níveis de um a seis. Os valores que aparecem na tabela correspondem a médias simples dos resultados naquelas três áreas avaliadas. Todos os resultados mostram um desempenho significativamente melhor dos estudantes finlandeses. E além da média finlandesa ser significativamente superior à média estadunidense, aquele país tem um percentual muito menor de estudantes com desempenho muito baixo (abaixo do nível 1) e um percentual significativamente maior de estudantes classificados no nível mais alto (nível 6). E, mais ainda, e possivelmente refletindo a menor desigualdade de renda, a dispersão relativa das notas recebidas pelos estudantes finlandeses, de 16%, é menor do que a dispersão das notas dos estadunidenses, de 19%.

Tabela 1 – Resultados do PISA 2009 (médias simples dos resultados em leitura, matemática e ciências).

                     Porcentagem dos estudantes
                     Abaixo do nível 1      Nível 6      Média      Dispersão das notas (%)
Finlândia                 1,0                    3,3           544                    16
EUA                         4,3                    1,6           496                    19
 


O que pode explicar as diferenças entre os dois países?
Certamente, o modelo educacional dos dois países faz a grande diferença. Entretanto, tentou-se procurar explicações para a diferença de desempenho entre os dois países em várias causas, evitando culpar o estilo empresarial de administração escolar e baseado em avalições permanentes de estudantes e em premiações e punições aos professores com base no desempenho dos seus alunos e das escolas onde trabalham. Um dos argumentos foi baseado na maior homogeneidade étnica populacional da Finlândia, um argumento de viés racista. Entretanto, esse argumento não sobreviveu, uma vez que, entre os 65 países ou regiões participantes do PISA, havia países homogêneos e heterogêneos nos dois extremos da classificação. Ou seja, o desempenho não está correlacionado com a homogeneidade da população. Outro argumento baseou-se no tamanho relativo das duas populações, 314 milhões nos EUA e 5,4 milhões na Finlândia. Entretanto, esse argumento também não prosperou. Primeiro, porque, como no caso da heterogeneidade da população, há países populosos e não populosos distribuídos entre os de melhor e pior desempenho: não há uma correlação entre o tamanho do país e o desempenho de seus estudantes. Além disso, nos EUA, como em muitos países mais populosos, a educação é administrada autonomamente pelos estados e muitos deles têm populações bastante pequenas, menores do que a finlandesa.

As explicações estão em outros lugares. Uma delas é quanto às condições de trabalho dos professores. Embora em ambos os países os salários iniciais na carreira sejam aproximadamente os mesmo, após 15 anos de experiência, os professores finlandeses são mais bem pagos, existindo, portanto, alguma motivação de caráter econômico para se dedicar à profissão. Outro fator, ainda, é que na Finlândia há uma distribuição de renda bem mais homogênea que nos EUA e, portanto, rendas aproximadamente equivalentes nos dois países podem significar reconhecimentos sociais muito diferentes.

Outro aspecto diz respeito às condições (educativas e acadêmicas) de trabalho dos professores. Na Finlândia, idéias que incluem a cultura dos testes, dos vouchers (que permitem mercantilizar o acesso às escolas), do pagamento de professores por mérito medido pelo desempenho dos estudantes em testes padronizados e da competição e avaliação dos professores a partir do desempenho de seus alunos são totalmente rejeitadas. Provas são usadas apenas para informar aos professores o andamento do trabalho, jamais para classificar, punir ou recompensar alunos, escolas ou professores. Como a profissão é respeitada e há boas e agradáveis condições de trabalho, as instituições de formação de professores são bastante procuradas e formam excelentes profissionais.

Avaliações comparativas por meio de testes, prêmios e punições não fazem parte do panorama educacional finlandês. A responsabilidade e a liberdade de adaptar o ensino aos seus estudantes são práticas usuais das escolas, dos diretores e dos professores.


Investimentos públicos versus privados
E quanto ao financiamento? Afinal os EUA aplicam um percentual maior do seu PIB em educação, 7,4%, contra 7,0% na Finlândia. Há aqui outro paradoxo? Não. O financiamento da educação na Finlândia é quase totalmente público, com apenas 0,2% do PIB correspondendo a gastos privados. Nos EUA, os gastos privados chegam a 2,0% do PIB. Portanto, o gasto público anual por estudante em comparação com a renda per capita é mais alto na Finlândia do que nos EUA, como mostra a tabela 2. Aparentemente, a relevância dos investimentos por estudante parece estar relacionada não apenas ao valor total, mas, especialmente, à origem, pública ou privada da fonte.

(Vale a pena observar aqui que esse mesmo efeito da maior eficiência dos gastos públicos em relação aos privados existe também na área de saúde. Enquanto os EUA gastam em saúde, por pessoa, mais do que 15% de sua renda per capita, contra uma média da ordem de 9% a 10% nos países europeus mais avançados, os seus indicadores de saúde são piores. De fato, a mortalidade infantil nos EUA é mais do que 50% superior à dos países europeus mais avançados e a expectativa de vida é entre um e dois anos menor. Mais um paradoxo? Não. Novamente, a grande diferença é possivelmente devida ao fato de que mais do que a metade dos gastos nos EUA são privados, contra cerca da quinta parte nos outros países considerados. Parece, portanto, que, como em educação, os gastos privados em saúde são muito menos eficientes do que os gastos públicos no que diz respeito a se alcançarem os objetivos básicos que se esperaria.)

Tabela 2 – Investimentos públicos e privados em educação e investimentos públicos por estudante como percentual da renda per capita. (Fonte: UIS, Unesco Institute for Statistics)
                                                                                                                                              Finl   EUA
Investimentos públicos (% do PIB) ......................................................... 6,8   5,4
Investimentos privados (% do PIB) em instituições educacionais ................... 0,2   2,0
Investimentos públicos por estudante como porcentagem da renda/capita .... 29,6  21,7


Com quem devemos aprender?
A comparação entre os dois países, EUA e Finlândia, mostra que caminho tomar. Premiação e punição de professores e escolas baseadas no desempenho dos estudantes em testes padronizados, feitos à exaustão, não são boa idéia, até mesmo para se conseguir bom desempenho em testes padronizados! Professores muito bem formados, respeitados e com liberdade de trabalho são condições fundamentais para o bom funcionamento de um sistema educacional. Escolas administradas pelo setor público, por mais altissonante que possa parecer o discurso em favor de uma administração empresarial e eficiente, são melhores quando todas as demais condições são equivalentes. Respeito às necessidades dos estudantes, tanto individuais como coletivas, é outro caminho para se construir um bom sistema educacional. E, também, uma melhor distribuição de renda pode tanto contribuir para a qualidade de vida dos professores como para o desempenho dos estudantes.

Além dos fatores considerados, vários outros problemas afetam o sistema estadunidense de educação. Entre esses problemas estão: o fundamentalismo religioso, que interfere nos currículos das escolas; as limitações de recursos materiais e institucionais que impeçam que as desigualdades entrem nas escolas e afetem seu funcionamento; a existência de grandes contingentes populacionais marginalizados, em especial no que diz respeito a crianças vivendo em situação de pobreza; ensino superior pago, mesmo quando público, constituindo-se uma barreira a mais no caminho dos estudantes; tratamento negativamente diferenciado para crianças e jovens provenientes de famílias de imigrantes. Muitos desses fatores têm origem em princípios religiosos, políticos e ideológicos e como e com que intensidade cada um deles afeta negativamente o desenvolvimento educacional das crianças e jovens naquele país tem sido motivo de estudos acadêmicos.


Embora a comparação até aqui tenha sido apenas entre Finlândia e EUA, as conclusões se repetem quando examinamos outros países.

Por exemplo, entre quatro países latino-americanos similares em vários aspectos e cujas rendas per capita estão na faixa entre 9 e 12 mil dólares anuais (pelo critério PPC), Cuba, Venezuela, Brasil e Colômbia, os dois primeiros, menos afetados por políticas de avaliação quantitativa e por práticas liberais do tipo vauchers, mostram indicadores educacionais quantitativos e qualitativos melhores ou muito melhores do que os dois últimos.

Outros quatro países também similares quanto à renda per capita (próximas a 15 mil dólares) e demais características, Argentina, Uruguai, Chile e México, os dois primeiros, menos liberalizados e menos voltados a uma educação de resultados (nos testes), apresentam melhores desempenhos.

Cabe, assim, uma pergunta impertinente. Por que, apesar das evidências, imitamos, especialmente no estado de São Paulo, políticas e práticas educacionais e sociais que já se mostraram tão perniciosas em muitos países? Por que não aprendemos com aqueles que melhor acertam?

Notas:
(1) O PISA, Programme for International Student Assessment, é um teste padronizado, aplicado a cada três anos a estudantes de dezenas de países e que inclui avaliações de leitura, matemática e ciências.

(2) Parte das informações e das análises deste texto são baseadas no artigo Schools We Can Envy (Escolas que nós podemos invejar), escrito por Diane Ravitch e publicado no New York Review of Books em 8 de março de 2012. A autora ocupou cargos relativamente altos na Secretaria (equivalente ao nosso Ministério) de Educação dos EUA.
 
http://www.correiocidadania.com.br/index.php?option=com_content&view=article&id=7224:submanchete040612&catid=72:imagens-rolantes

terça-feira, 8 de maio de 2012

Sustentabilidade e Educação

06/05/2012 - Leonardo Boff - em seu blog

A sustentabilidade, um dos temas centrais da Rio+20, não acontece mecanicamente.


Resulta de um processo de educação pela qual o ser humano redefine o feixe de relações que entretém com o Universo, com a Terra, com a natureza, com a sociedade e consigo mesmo dentro dos critérios de equilíbrio ecológico, de respeito e amor à Terra e à comunidade de vida, de solidariedade para com as gerações futuras e da construção de uma democracia sócio-ecológica sem fim.

Estou convencido de que somente uma processo generalizado de educação pode criar novas mentes e novos corações, como pedia a Carta da Terra, capazes de fazer a revolução paradigmática exigida pelo risco global sob o qual vivemos. Como repetia com freqüência Paulo Freire: ”a educação não muda o mundo mas muda as pessoas que vão mudar o mundo”. Agora todas as pessoas são urgidas a mudar. Não temos outra alternativa: ou mudamos ou conheceremos a escuridão.

Não cabe aqui abordar a educação em seus múltiplos aspectos tão bem formulados em 1996 pela UNESCO: aprender a conhecer, a fazer, a ser e a viver juntos; eu acrescentaria: aprender a cuidar da Mãe Terra e de todos os seres.

Mas este tipo de educação é ainda insuficiente. A situação mudada do mundo exige que tudo seja ecologizado, isto é, cada saber deve prestar a sua colaboração a fim de proteger a Terra, salvar a vida humana e o nosso projeto planetário. Portanto, o momento ecológico deve atravessar todos os saberes.

A 20 de dezembro de 2002 a ONU aprovou uma resolução proclamando os anos de 2005-2014 a Década da educação para o desenvolvimento sustentável. Neste documento se definem 15 perspectivas estratégicas em vista de uma educação para sustentabilidade.

Referiremos algumas:
Perspectivas socioculturais que incluem: direitos humanos, paz e segurança; igualdade entre os sexos; diversidade cultural e compreensão intercultural; saúde; AIDS; governança global.


Perspectivas ambientais que comportam: recursos naturais (água, energia, agricultura e biodiversidade); mudanças climáticas; desenvolvimento rural; urbanização sustentável; prevenção e mitigação de catástrofes.


Perspectivas econômicas que visam: a redução da pobreza e da miséria; a responsabilidade e a prestação de contas das empresas.

Como se depreende, o momento ecológico está presente em todas as disciplinas: caso contrário não se alcança uma sustentabilidade generalizada. Depois que irrompeu o paradigma ecológico, nos conscientizamos do fato de que todos somos ecodependentes.

Participamos de uma comunidade de interesses com os demais seres vivos que conosco compartem a biosfera.


O interesse comum básico é manter as condições para a continuidade da vida e da própria Terra, tida como Gaia [1]. É o propósito intencionado pela sustentabilidade.
 A partir de agora a educação deve impreterivelmente incluir as quatro grandes tendências da ecologia: a ambiental, a social, a mental e a integral ou profunda (aquela que discute nosso lugar na natureza). Mais e mais se impõem entre os educadores esta perspectiva: educar para o bem viver que é a arte de viver em harmonia com a natureza e propor-se repartir equitativamente com os demais seres humanos os recursos da cultura e do desenvolvimento sustentável.

Precisamos estar conscientes de que não se trata apenas de introduzir corretivos ao sistema que criou a atual crise ecológica mas de educar para sua transformação. Isto implica superar a visão reducionista e mecanicista ainda imperante e assumir a cultura da complexidade. Ela nos permite ver as interrelações do mundo vivo e as ecodependências do ser humano.

Tal verificação exige tratar as questões ambientais de forma global e integrada. Deste tipo de educação se deriva a dimensão ética de responsabilidade e de cuidado pelo futuro comum da Terra e da humanidade. Faz descobrir o ser humano como o cuidador de nossa Casa Comum e o guardião de todos seres. Queremos que a democracia sem fim (Boaventura de Souza Santos) assuma as características socioecológicas pois só assim será adequada à era ecozóica e responderá às demandas do novo paradigma.


Ser humano, Terra e natureza se pertencem mutuamente. Por isso é possível forjar um caminho de convivência pacífica. É o desafio da educação no atual momento.


[1] Nota do blog: A Hipótese Gaia, também conhecida como a Teoria ou Princípio Gaia, concebido pelo cientista norte-americano James Lovelock sugere que todos os organismos vivos e os componentes inorgânicos presentes na Terra estão intimamente integrados com a finalidade de conservar um singular, autorregulável e complexo sistema que assegura-lhes as condições para viver neste planeta.