sábado, 14 de dezembro de 2013

Resiliência e uma negra no aeroporto de Frankfurt

09/12/2013 - Sobre resiliência, o direito à felicidade e ser mulher negra no aeroporto de Frankfurt
- Viviana Santiago para o site Blogueiras Negras

Segundo a física, a resiliência é uma certa particularidade apresentada por alguns corpos, de após sofrerem uma deformação, voltar a sua forma original. 

Em linguagem figurada seria aquela habilidade de fazer do limão, uma limonada e quem trabalha no terceiro setor, sobretudo com os chamados grupos em situação de vulnerabilidade e risco social e/ou pessoal sabe que essa palavra faz parte do repertório de ensinamentos.

Falar de resiliência significa evocar aquela capacidade que nós todas, pessoas em alguma situação de vulnerabilidade, devemos possuir, ou ser apoiadas na construção: uma capacidade que nos possibilitaria transformar cada situação ruim vivida, numa situação positiva, a partir de nossa competência de re-significar e seguir em frente.

Há alguns meses, eu, Viviana, negra-mulher-nordestina-pedagoga e mãe fui à Áustria participar de uma reunião de trabalho: atuo na defesa de direitos de crianças e adolescentes, assim como de mulheres e famílias em situação de vulnerabilidade, dentre outros aspectos, defendo a ideia de promoção, proteção, defesa e garantia do direito a convivência familiar e comunitária para todos esses grupos; e nesse contexto fui convidada a ser stakeholder para um processo de elaboração de uma política global.

Meu voo para Áustria deveria fazer antes uma escala em Frankfurt [foto], vocês já imaginam a cena: avião lotado de brasileiras e brasileiros, mulheres e homens desembarcando naquela correria, muitos passageiros habitués, outras pessoas de primeira viagem chegando à Europa, e eu: com aquela sensação de, ainda sob o impacto de tantas vozes, tantas línguas, tantos rostos diferentes, sentir-me num espaço global – o aeroporto de Frankfurt é gigantesco - vendo todo mundo e pensando curiosamente como estaria sendo vista. (Não tardaria em descobrir…)

Na fila da imigração, havia dezenas e dezenas de brasileiras e brasileiros, também muitas mulheres e homens também de outros lugares do mundo, muitos e muitos orientais, mas por uma daquelas coincidências do destino: a única mulher negra ali era eu.

Chegando minha vez de apresentar o passaporte, um jovem me atendeu e extremamente rude, me pergunta num inglês - muito mal falado - para onde vou e o que vou fazer.

Explico que vou prestar uma consultoria sobre gênero, para uma ONG internacional – muito conhecida na Europa -, ele me faz uma pergunta que não consigo entender e peço que repita.

E ai começa o show de humilhações, grosseria e maus tratos: mostro todos os papéis, os convites, meu currículo e ele, sempre me olhando de cima a baixo, com especial atenção para meu cabelo, minha boca e minha bunda; ele rejeita tudo que eu falo, fazendo de conta que não entende, e em alemão, partilhando com o companheiro do guichê ao lado, comentários jocosos a meu respeito.

Somos todas mulheres! escuto  vozes em minha cabeça, daquelas pessoas que querem destituir as nossas lutas e diminuir a importância da abordagem das interseccionalidades com a afirmação de que somos todas iguais…, mas quando olho para o lado, vejo as outras mulheres caminhando livremente apresentando seus passaportes e seguindo em frente, enquanto somente eu: a negra, estou retida.

Somos todas mulheres! escuto mais uma vez, mas percebo que somente eu, mulher-negra, em meio a todas aquelas mulheres, estou tendo que justificar exaustivamente o que faz uma mulher negra indo para Áustria.

Somos todas mulheres! mas só sobre mim recai o estereótipo da mulata e da prostituta…

E eu fico pensando nessa experiência…

Pensando, entristeço e recordo que partilhei com as amigas e amigos e ouvindo de todas: puxa, que pesado! Vixi que perverso!

Mas em seguida, sempre a continuação: ainda bem que você é uma mulher resiliente! Seja resiliente, faça dessa situação uma limonada, aprenda com isso!

E continuam quando eu digo que em mais alguns meses estarei lá novamente: isso Vivi, seja resiliente! Você tem que aprender a lidar com isso!

Sem desmerecer nenhum pouco a importância de darmos a volta por cima, venho sinceramente dizer que eu não quero Ter que Ser Resiliente!

Eu não quero Ter que fazer uma limonada! Eu quero é ser feliz!

Porque felicidade e ser tratada dignamente é um direito.

Aceitar que devo ser resiliente, nesse e em muitos contextos é aceitar como natural que essa e outras violências vão acontecer e vão se repetir, é aceitar que elas estão determinadas, dadas e irrevogáveis.

Penso na minha experiência de ser menina, jovem, mulher e mãe negra…

Não é isso que escutamos quando naturalizam que nós aguentamos dor por isso não recebemos anestesia? Seja forte! Você consegue!

Quando naturalizam que nós somos fortes por isso trabalhamos sempre a mais.

Que nossa pele não queima, por isso ninguém nunca passa protetor solar ou dá um bonezinho para as crianças negras da educação infantil quando vão ao parquinhos.

Somos fortes, e se algo de ruim acontecer seremos resilientes.

Não quero mais ouvir as pessoas me mandando ser resilientes, quero sim, saber, quando as pessoas vão me dizer, (a mim e a todas as outras mulheres negras): vocês têm o direito de serem tratadas dignamente, espero que isso não aconteça mais.

Muitas vezes quando escuto o discurso do “be posisitve!” consigo perceber uma ausência de problematização: porque, ao mesmo tempo em que dizemos que as pessoas devem ser capazes de se recuperar de violências, por que também não defendemos o direito das mesmas a uma vida sem violência?

Sejamos resilientes, mas antes de tudo não sejamos mais violentadas.

Não sejamos mais tratadas como objetos.

Não admitamos nem nos conformemos com essas violências que se repetem. Mudemos esse repertório!

É isso que estou pensando agora.

E é isso que levarei comigo, quando for mais uma vez a mulher negra no aeroporto em Frankfurt.

Fonte:
http://blogueirasnegras.org/2013/12/09/resiliencia-direito-felicidade-mulher-negra-aeroporto-frankfurt/

Nota:
A inserção de algumas imagens adicionais, capturadas do Google Images, são de nossa responsabilidade, elas inexistem no texto original.

sexta-feira, 13 de dezembro de 2013

Mandela era fora-da-lei

11/12/2013 - Mandela era fora-da-lei quando a lei estava fora da ordem
- Marcelo Semer em seu blog - Portal Terra

Nelson Mandela vem sendo reverenciado pela direita, em grande medida em causa própria, porque não buscou revanche contra o opressor.

É saudado pela esquerda porque colocou a resistência acima da sua liberdade, negando-se a depor armas em troca da soltura, quando o sanguinário regime do apartheid ainda vigorava.

E porque jamais se intimidou em aliar-se a revolucionários de outros cantos.

Isso talvez justifique o mito com que sua figura vem embalada na hora da morte.

Mas ele foi além.

Mandela não foi apenas um ícone de lutas na juventude ou um governante magnânimo e sereno na maturidade.

Foi, sobretudo, um motor de resistência que venceu a injustiça.

Mandela era um fora-da-lei quando a lei é que estava fora da ordem.

O apartheid era lei.

Como eram as discriminações raciais no sul dos Estados Unidos.

Como foi, em grande parte, o arcabouço da barbárie na Alemanha de Hitler.

E a escravidão tão duradoura entre nós.

Governos e legisladores haviam escrito aquelas barbaridades – mas nem por isso deixavam de ser barbaridades.

Não se trata de dizer apenas que o legal nem sempre é legítimo e lamentar.

Mas entender que a barbárie é sempre ilegal, mesmo quando está prevista na lei.

E a resistência se frutifica justamente quando o legalismo encaixota a justiça e os juristas se escondem nos desvãos do positivismo para procurar as mais variadas formas de não dizer o direito.

O discurso da ordem costuma ser confundido com o discurso do direito – mas direito é bem mais do que disciplina e está muito além da obediência.

Não é legal tudo o que é feito por quem detém o poder de legislar.

Há princípios fincados nas Constituições que por si só impedem violações. E há tratados internacionais que obrigam nações a respeitar os valores mais elementares da humanidade.

O apartheid conseguiu a proeza de mesclar a segregação racial com uma sanguinária repressão.

Países que hoje saúdam a memória de Mandela, como os Estados Unidos, mantiveram por anos a fio a condenação, não da barbárie de que negros eram vítimas, mas de quem se opôs a ela.

Mandela foi inserido na lista de terroristas pelo governo inglês e se manteve assim nos Estados Unidos até o recente ano de 2005.

Mas nem isso foi capaz de impedir o motor da história e a vitória da resistência sobre uma ordem terrivelmente injusta.

É algo que a lição de Mandela deve ensinar, não apenas aos povos e a seus governos, mas também aos juristas: é a aplicação da justiça e não o fortalecimento da ordem pela ordem que esvazia a resistência.

Fonte:
http://terramagazine.terra.com.br/blogdomarcelosemer/blog/2013/12/11/mandela-era-fora-da-lei-quando-a-lei-estava-fora-da-ordem/

Nota:
A inserção das imagens, quase todas capturadas do Google Images, são de nossa responsabilidade, pois inexistem no texto original.

quinta-feira, 12 de dezembro de 2013

Contra o PT, show - para o PSDB, missa

11/12/13- Justiça faz show contra o PT e missa para o PSDB
- Eduardo Guimarães em seu blog da Cidadania

Quanto mais se olha para como a Justiça brasileira trata os cidadãos, mais se torna visível como usa critérios e procedimentos diversos para eles dependendo de fatores que, até ontem, restringiam-se a classe social e a situação econômica, mas que, agora, englobam viés político e, o que é pior, viés partidário.

Tal fato fica claro diante de notícia que, aparentemente – e só aparentemente –, soa auspiciosa.

Qual seja, a de que a Justiça Federal encaminhou ao STF o inquérito sobre o cartel envolvendo multinacionais e políticos do PSDB em licitações do Metrô e da CPTM em São Paulo.

Nota da 6ª Vara Criminal Federal de São Paulo sobre o envio do processo a Brasília parece pedir desculpas pela medida e, em tese, deveria significar que esse envio tem como objetivo afastar a investigação de pressões do Judiciário paulista, mas, pelo teor, a medida também pode ser interpretada como resguardo para as autoridades do governo paulista.

Abaixo, a nota.

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NOTA À IMPRENSA SOBRE INQUÉRITO NA 6ª VARA CRIMINAL

São Paulo, 10 de dezembro de 2013

A respeito das informações veiculadas na imprensa sobre o inquérito policial em que são investigados, entre outras práticas criminosas, supostos pagamentos de propina a funcionários públicos no âmbito de licitações relacionadas ao Metrô de São Paulo, cumpre esclarecer:

1 – O inquérito policial corre em segredo de Justiça, tanto pela existência de informações protegidas constitucional e legalmente, como para propiciar maior efetividade às investigações, sendo vedada a divulgação, pelos detentores de dever de sigilo, dos dados nele constantes;

2 – O inquérito policial foi remetido ao Supremo Tribunal Federal em razão de ter sido mencionada a eventual prática de infrações penais por autoridades detentoras de foro por prerrogativa de função perante aquela Corte;

3 – A remessa dos autos ao Supremo Tribunal Federal não implica reconhecimento pelo magistrado responsável pela supervisão do inquérito da existência de indícios concretos de práticas criminosas pelas autoridades referidas, fundamentando-se apenas no entendimento de que compete ao STF supervisionar eventuais medidas investigatórias relacionadas a tais autoridades.

6ª Vara Criminal Federal de São Paulo

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Um dia antes da divulgação dessa nota, um dos mais renomados juristas brasileiros, autor de obras obrigatórias nas faculdades de Direito de todo o país, afirmou, textualmente, que o Supremo Tribunal Federal tratou diferentemente políticos do PT e do PSDB e que, contra os petistas, promoveu “show”, mas contra o PSDB promoveu um tipo de missa.

Em recente entrevista ao programa de Web TV Contraponto – que será divulgada na íntegra por este Blog em breve –, o jurista Dalmo de Abreu Dallari [foto] fez essas e outras considerações preocupantes, chegando a chamar de “nazista” a teoria usada para condenar os réus do mensalão, a famigerada teoria do “domínio do fato”.

Para os que possam atribuir “esquerdismo” ou “petismo” a Dallari – o que, no mundo jurídico, seria considerado uma heresia –, uma sua antítese, o jurista Ives Gandra Martins [foto abaixo], numerário da Opus Dei e um de seus fundadores no Brasil, além de adversário histórico do PT, deu entrevista à Folha de São Paulo na qual afirmou que o ex-ministro José Dirceu foi condenado “sem provas”.

Ambos os juristas reconhecem, por exemplo, que houve tratamento diferenciado quanto a desmembramento dos respectivos mensalões de PT e PSDB.

Para o primeiro, o STF inovou processando réus sem foro privilegiado; para o segundo, remeteu à primeira instância o processo dos que não têm tal foro.

A ritualística da Justiça para casos que envolvam o PSDB, portanto, é legitimamente solene.

Ressalvas mil sobre os direitos dos acusados, sobretudo a um direito que foi sonegado aos réus durante o inquérito do mensalão petista: a presunção de inocência.

Na era do “domínio do fato”, a Justiça presumir inocência, como faz a 6ª Vara Criminal Federal de São Paulo, tornou-se um privilégio.

Que história é essa de ressalvar que não há indícios contra figuras carimbadas do PSDB? Se não houvesse indícios eles não estariam arrolados no inquérito remetido – e como investigados, sim.

Nomes do PSDB como os secretários do governo do Estado de São Paulo Aloysio Nunes [E] e José Aníbal [D] constam da denúncia da Siemens sobre corrupção nos negócios que fez com os governos Mário Covas, José Serra e Geraldo Alckmin.

A investigação da Justiça sobre a denúncia da empresa alemã, portanto, põe sob suspeita do mais alto ao mais baixo membro dessas gestões.

Ou não?

Pelo lado da mídia, não é diferente.

Na semana em que a revista Veja e sua horda de zumbis tentam tornar inquestionável acusações sem provas contra o ex-presidente Lula por parte de um ex-policial demitido do governo Dilma após sofrer grave acusação da Policia Federal de envolvimento com o crime organizado, vemos a mesma revista sugerir que a Justiça suíça e a multinacional alemã Siemens se aliaram ao PT para enxovalhar políticos tucanos.

Mas após o próprio Ministério Público Federal de São Paulo, através do procurador Rodrigo de Grandis [foto], ter engavetado sucessivos pedidos da Justiça suíça para que investigasse as mesmas autoridades que agora figuram na nota da 6ª Vara Criminal de Brasília, a conduta da Veja torna-se até natural.

Na entrevista que o jurista Dalmo Dallari deu a este que escreve na última segunda-feira, ele também disse que não é só no Brasil que acontece essa partidarização da Justiça.

Nos Estados Unidos – de onde é copiado nosso sistema judicial –, os partidos que se revezam no poder indicam juízes claramente identificados consigo, em uma disputa que chega a ser contabilizada publicamente.

Aqui no Brasil, continua-se a praticar o cinismo mais escancarado, segundo Dallari.

Fingimos que não há politização da Justiça e, sobretudo, do Supremo Tribunal Federal.

Chegamos ao cúmulo do cinismo de fazer o Legislativo sabatinar os candidatos à cúpula do Judiciário para como que lhes aferir uma impossível isenção.

Tudo isso e muito mais foi possível extrair da entrevista com o jurista Dalmo de Abreu Dallari.

São considerações assustadoras, pois obrigam a concluir que o modelo de “democracia” que vige no Brasil e até em potências como os Estados Unidos, entre outros, admite que pessoas sejam julgadas pela Justiça sob critérios políticos.

Quem não entender a gravidade dessa nova realidade estará semeando novos abusos no futuro.

Se essa distorção não for corrigida, não tardará e veremos a política travar uma luta sangrenta para aparelhar a Justiça, pois ao grupo político que ora está sendo prejudicado só restará entrar nesse jogo.

Fonte:
http://www.blogdacidadania.com.br/2013/12/justica-faz-show-contra-o-pt-e-missa-para-o-psdb/

Nota:
A inserção das imagens, quase todas capturadas do Google Images, são de nossa responsabilidade, pois inexistem no texto original.

quarta-feira, 11 de dezembro de 2013

O papel da OMC e o que querem os ativistas

Esclarecimento ao leitor: publicamos hoje dois textos de dois momentos distintos, mas ambos alusivos à OMC (Organização Mundial do Comércio - World Trade Organization, da sigla em inglês).

O primeiro se reporta ao dia de maio passado em que Roberto Azevedo, indicado pelo governo federal, foi eleito seu Diretor Geral.

O segundo, ao acordo vitorioso firmado no último dia 07/12 em Bali, Indonésia, entre as nações integrantes da organização, visando destravar as negociações voltadas para a liberalização do comércio mundial, iniciadas em Doha, no Catar, em 2001 e praticamente estagnadas desde então.

As eventuais críticas a esse acordo manifestadas nestes dois textos em nada se alinham com aquelas feitas pela grande mídia conservadora brasileira, objeto do texto que divulgamos ontem (Brasil, uma dupla vitória), cujo propósito ao criticá-lo, visa apenas desqualificar toda e qualquer iniciativa do governo petista, ainda mais aquelas que possam ser vistas como uma vitória, principalmente, como neste caso, quando o evento tem repercussão internacional. (Educom)

13/05/2013 - O papel da OMC - Maria Luisa Mendonça - Brasil de Fato

A escolha do diplomata brasileiro, Roberto Azevedo, para a Direção Geral da Organização Mundial do Comércio (OMC) foi comemorada por diversos setores políticos e midiáticos no Brasil.

Entretanto, é necessário retomarmos a posição dos movimentos sociais que denunciam os impactos causados por políticas identificadas com a chamada “liberalização” comercial.

Desde a sua criação em 1995, o principal papel da OMC tem sido expandir seu poder de regulamentação de políticas comerciais em cerca de 150 países.

Apesar de difundir a ideologia do livre comércio, a OMC possui uma complexa estrutura de normas utilizadas para estimular a formação de monopólios no acesso a mercados internacionais.

A abrangência dos acordos contidos na OMC vai além de temas relacionados ao comércio internacional, incluindo propriedade intelectual e privatização de setores de “serviços” que incluem direitos básicos como saúde e educação.

A política central da diplomacia brasileira na OMC tem sido estimular o lobby em favor de vantagens comerciais para o agronegócio.

Esta política é contrária à posição dos movimentos sociais rurais que defendem o lema “OMC fora da agricultura”.

Durante mais de uma década, as negociações no âmbito da OMC enfrentaram constantes “fracassos” já que, obviamente, os países centrais não fizeram e dificilmente farão concessões em relação à proteção de sua própria agricultura e indústria.

Mesmo assim, sucessivos governos no Brasil insistem em pedir a eliminação dos subsídios e a “abertura” dos mercados nos países “ricos”, ao mesmo tempo em que mantêm forte apoio estatal para o agronegócio.

Este duplo discurso esconde a inevitabilidade da criação de impasses neste tipo de negociação comercial, que só se resolveriam se os países centrais deixassem de proteger suas economias, o que só os repetidores das reclamações contra os malvados subsídios dos países ricos parecem acreditar.

A possibilidade mais provável é sempre de que os países periféricos se submetam às regras estabelecidas nestes espaços multilaterais.

A política externa brasileira em função do lobby do agronegócio se manteve ao longo dos anos, mesmo com os repetidos e previsíveis “fracassos” das negociações da OMC.

Tanto no período considerado neodesenvolvimentista, quanto naquele chamado de neoliberal, prevalece a defesa de uma política estatal de apoio ao modelo agroexportador, com base no argumento de que seria a forma possível de se garantir “equilíbrio” na balança comercial brasileira.

Como o papel do Diretor-Geral da OMC é principalmente defender as regras estabelecidas e tentar “destravar” as negociações, a escolha de Roberto Azevedo para o cargo pode levar o Brasil a fazer maiores concessões.

De qualquer forma, o avanço destes acordos terá sempre a função de facilitar a ampliação de monopólios privados, seja nos países centrais ou periféricos.

Fonte:
http://www.brasildefato.com.br/node/12892

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08/12/2013 - OMC: Ativistas dizem que acordo de Bali favorece grandes corporações
- Da Redação - Carta Maior

Ministros de 159 países fecharam modesto pacote que prevê desburocratização do comércio global e incentivo às trocas agrícolas.

Bali, Indonésia – A Organização Mundial do Comércio (OMC) conseguiu fechar neste sábado (7/12) o seu primeiro acordo global em quase 20 anos, ao obter apoio de ministros de 159 países para um modesto pacote que prevê desburocratização do comércio global, incentivo às trocas agrícolas e foco no desenvolvimento dos países pobres.

Foi uma vitória pessoal do diretor geral da organização, o brasileiro Roberto Azevêdo [foto], no cargo desde setembro de 2013.

Pela primeira vez na história, a OMC verdadeiramente entregou o que promete”, comemorou Azevêdo.

O encontro em Bali foi marcado pela disputa entre Estados Unidos e Índia.

Os norte-americanos queriam que os indianos pusessem limite em seu programa de compra de alimentos, que visa garantir renda e soberania alimentar a milhões de pequenos agricultores do país.

Diante da recusa da Índia, os ministros negociaram deixar a questão para mais tarde, permitindo a assinatura do acordo.

Na OMC, tudo tem de ser feito por consenso e a recusa de apenas uma delegação pode interromper o processo.

Críticas
Para ONG Focus on the South Global, com forte atuação no sudeste asiático, o acordo aprovado na OMC é ruim para trabalhadores e pequenos produtores rurais.

Segundo documento divulgado pela organização e apoiado por diversas entidades indonésias e indianas, “a proposta de facilitação do comércio vai beneficiar principalmente grandes corporações, e os compromissos de longo prazo para os países menos desenvolvidos foram diluídos em promessas vagas”.

A Focus on the South Global apontou ainda a incoerência dos países ricos, que cobram o fim de políticas públicas nos países menos desenvolvidos, ao mesmo tempo em que mantêm bilionários programas de subsídios para seus agricultores.

Os subsídios agrícolas nos países desenvolvidos continuam a devastar a nossa agricultura, e as táticas de pressão estão a minar a unidade dos países em desenvolvimento para que se chegue a acordo com soluções verdadeiramente justas”, afirma o manifesto.

Vigilância
Em sua análise sobre o acordo de Bali, o Trade Game, um observatório mantido pelas organizações italianas Confederazione Generale Italiana del Lavoro (Cgil), Arcs/Arci, Fairwatch e Legambiente, também denunciou a atuação das delegações dos EUA e da União Europeia.

Segundo o Trade Game, “EUA e UE [União Europeia] desempenharam um jogo perigoso em Bali: não assumiram qualquer compromisso vinculativo para um maior equilíbrio no comércio global, e quiseram impor medidas pesadas para os países emergentes”.

A partir de agora, as negociações sobre o acordo em Bali continuarão na sede da OMC, em Genebra.

Os sindicatos e a sociedade civil precisam continuar críticos e vigilantes”, disse manifesto divulgado pelo Trade Game.

Fonte:
http://www.cartamaior.com.br/?/Editoria/Economia/OMC-Ativistas-dizem-que-acordo-de-Bali-favorece-grandes-corporacoes/7/29752

Leia também:
- Brasil, uma dupla vitória - Arnóbio Rocha

Nota:
A inserção das imagens, quase todas capturadas do Google Images, são de nossa responsabilidade, pois inexistem nos textos originais.

terça-feira, 10 de dezembro de 2013

Brasil, uma dupla vitória

08/12/2013 - A dupla Vitória do Brasil na OMC, a dupla Derrota da Mídia
- Arnóbio Rocha - em seu blog Política, Economia e Cultura

Em maio de 2013 escrevi um texto (Vitória do Brasil na OMC [Organização Mundial do Comércio], Derrota da mídia local) em que apontava mais uma vez o ódio da mídia brasileira à política externa do Brasil.

Naquele momento o país tinha apresentado a candidatura do Embaixador Roberto Azevedo.

Dias antes os jornais chegaram a divulgar que ele perderia fácil a eleição pois a UE [União Europeia] apoiaria a  candidatura do mexicano ultraliberal Hermínio Blanco, formado em Chicago, a escola dos neoliberais.

No dia da votação a mídia excitada criticava o governo brasileiro, pois dava como certa a derrota.

Todos sabemos que Roberto Azevedo, venceu.

Assim dizia eu, sobre os embates contra a mídia naqueles dias:

Alertei ontem que a mídia brasileira não se conformaria com a vitória do Brasil na OMC, com a eleição do Embaixador Roberto Azevedo ao cargo mais importante do órgão, que somado ao cargo na FAO [Food and Agriculture Organization - Organização para a Alimentação e Agricultura, da ONU], mostra um novo caminho da diplomacia brasileira no mundo, reforçando uma virada nas relações mundiais, em particular com o advento da Crise 2.0, em que as velhas potências balançaram, abrindo espaço para novos atores como os BRICS."

"O Brasil em especial, tem aproveitando bem este novo momento”.

“Nem deu um dia e começaram a destilar seus ódios."

"Mas é preciso lembrar que um dia antes da eleição os jornalões brasileiros comemoraram a notícia da UE ter decidido pelo voto em Herminio Blanco, mexicano, lançado pelos EUA, afinal ele é um graduado mestre da escola de Chicago, bem em linha com os interesses de Washington, coincidindo com os da mídia tapuia."

"Aqui, [esses jornais] não conseguem entender, ou melhor, aceitar as mudanças mundiais e o protagonismo do Brasil, desde o início do Governo Lula”.

No dia seguinte da vitória vários artigos tratando como uma “quase derrota” ou insinuando que o Brasil havia “comprado o cargo”, mas a mídia permanecia no ataque de que a política externa dos governos do PT era um fracasso, pois não adiantavam as vitórias obtidas pela chancelaria brasileira pois “a tese é de que fazer comércio com outros países, que não os EUA ou a UE é isolamento."

Chegamos às raias do ridículo, uma tese insustentável, pois encerra duas graves mentiras, ou contradições:

Que o Brasil faz política externa “insular”, ora, meus ateus, como se faz política isolacionista e se vence na OMC e na FAO?

Mesmo importante, esta vitória não pode ser usada por Dilma ou pelo governo petista para legitimar a política insular do Brasil, então não se deve comemorar, ou melhor, devemos nos envergonhar de vencer.

Foi vitória maiúscula destes 10 anos de governo petista e derrota vexatória para a mídia estúpida nacional, esta é que é a verdade.

Então, como não se pode contestar, tratemos de relevar a importância, ou a menosprezar afirmando que outros objetivos não foram alcançados, como faz o repórter da Folha no final da matéria sobre a eleição, dizendo que ”O Maior objetivo do país na política externa continua inalcançado: a conquista da vaga permanente no Conselho de Segurança da ONU”.

Mas a questão não parou por aí, claro.

Roberto Azêvedo, continuou sendo alvo das maledicências de sempre e o auge foi o artigo de Demétrio Magnoli, [foto] que apostou tudo, que jamais sairia um acordo na OMC e escreveu antes do resultado final, um primor de burrice e estupidez, que agora será motivo de gozação eterna.

Segundo Magnoli, em sua coluna na Folha, a OMC seria reduzida à condição de “ente vestigial, um tribunal de contenciosos comerciais”.

E continua na onda negativa:

“O fracasso atinge em cheio o Brasil, evidenciando uma sequência de erros de política externa causados pela subordinação do interesse nacional ao imperativo da ideologia”, escreveu Magnoli, acrescentando que não faltaram alertas”. (Brasil247.com).

A Folha saiu no sábado pela manhã com estas pérolas, ainda segundo o Brasil247:

"Magnoli conclui sua análise trágica sobre o cenário que não se concretizou falando sobre 'o mito da Ilha-Brasil'".

Segundo ele, "o Império do Brasil, invocando as aventuras dos bandeirantes, “sustentou a ideia de que o território nacional constitui uma 'ilha' na América do Sul, delimitada por fronteiras naturais que estariam apoiadas no traçado das redes hidrográficas”. 

Hoje, finaliza o colunista, "a noção da Ilha-Continente ressurge na forma de uma muralha anacrônica que nos isola dos fluxos da globalização”.

Os “especialistas” da GloboNews, por mera coincidência são todos tucanos aposentados do Itamaraty e que vivem apenas para atacar a chancelaria brasileira.

Eles apostavam no fracasso da rodada de Bali e com um sorrisinho no canto da boca comemoravam o “fracasso da diplomacia brasileira”.

No fundo, todos eles, falam que a diplomacia abandonou a “política” e virou “ideologia”.

Concluo que na verdade estes analistas falam no espelho, aquilo que eles repetem: que é a “ideologia”, a neoliberal, que por acaso foi derrotada no mundo inteiro, mas que no Brasil parece zumbis, que continuam vivos no seio da grande mídia, mesmo que na vida real ela não mais tenha poder.

Se todos os desejos da mídia, sua ideologia neoliberal derrotada no mundo, aqui não dá trégua, então a saída é “torturar a realidade”, distorcer, mentir para achar alguma sobrevivência.

Que o governo ignore solenemente os “alertas” de tipos como Magnoli, Rubens Barbosa, [William] Waack [GloboNews-Painel] e tantos tolos de plantão.

Vamos em frente, parabéns ao embaixador Roberto Azevedo [foto] o Brasil está no caminho certo, por isto eles esperneiam tanto.

Fonte:
http://arnobiorocha.com.br/2013/12/08/a-dupla-vitoria-do-brasil-na-omc-a-dupla-derrota-da-midia/

Nota:
A inserção das imagens, quase todas capturadas do Google Images, são de nossa responsabilidade, pois inexistem no texto original.